Norberto Bobbio e a sociedade em que vivemos

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Em um mundo globalizado, onde o bloco socialista sumiu do mapa após a queda do Muro de Berlim e a guerra fria foi substituída pela economia quente, ainda é possível falar em conceitos como esquerda e direita? E, num mundo em que conflitos étnicos e religiosos são lugares–comuns, justiça e liberdade serão apenas palavras vazias?

Estas perguntas podem parecer anacrônicas ou disparatadas, mas as eleições para presidente estão chegando, e se você quer fazer valer o seu voto, talvez seja útil entender (ou pelo menos tentar entender) como funciona a sociedade em que vivemos antes de escolher seu candidato.

É por isso que a publicação simultânea em terra brasilis não de um, mas dois livros de Norberto Bobbio, é mais do que bem–vinda neste momento. Um dos mais respeitados pensadores políticos contemporâneos e autor de A Era dos Direitos (Ed. Campus, 1992) e do indispensável Dicionário de Política (Ed. UnB, 1995), Bobbio volta à cena com uma reedição e um livro inédito que dão o que pensar.

O mais recente, Diálogo em Torno da República (Ed. Campus) foi escrito a partir de conversas entre Bobbio e o pensador político Maurizio Viroli. Autor de Repubblicanesimo, Viroli leciona na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, e se dedica principalmente à história do pensamento político. Em nove diálogos, que tratam de temas como qualidades e defeitos da república, liberdade, direitos e deveres do cidadão, Viroli, um defensor apaixonado da república, e Bobbio, cientista político que, embora de difícil classificação (e talvez seja essa a sua maior virtude) nunca escondeu sua predileção pela esquerda, acabam concordando em quase tudo em seus diálogos, apesar da aparente disparidade entre suas tendências políticas.

Analisando problemas políticos italianos, como o fascismo e o atual governo de extrema direita de Silvio Berlusconi, Bobbio e seu interlocutor questionam valores morais e éticos da sociedade de seu país, mas que podem ser aplicados a boa parte das nações ocidentais. Um exemplo: “Na mentalidade dos italianos (…) aquele que pune de acordo com a lei, o juiz inflexível ou o político íntegro, não são figuras que suscitem sincera admiração. O herói é, ao contrário, o astuto que escapa à lei, ou o poderoso que se coloca acima dela.” (página 66.) Substitua–se italianos por brasileiros e a frase não perde em significado.

O segundo livro, Direita e Esquerda, foi lançado na Itália em 1994, às vésperas do pleito presidencial de lá. Não é por acaso que esta segunda edição (atualizada em 1999), seja publicada no Brasil no ano da eleição para presidente de nosso país. Neste livro, Bobbio parte basicamente de duas questões, formuladas por ele próprio da seguinte maneira: “Direita e esquerda ainda existem? E, se existem ainda, como se pode dizer que perderam completamente o significado?” O livro foi escrito para oferecer respostas a essas perguntas e também para tentar explicar qual seria o significado político desses dois termos no mundo de hoje.

Segundo Bobbio, parece haver um consenso (tanto na mídia quanto na opinião pública) de que Direita e Esquerda teriam perdido a validade como termos para definição de facções ou tipos de pensamento político, devido a queda do Muro de Berlim e o conseqüente colapso do regime comunista soviético. Ele pede licença para discordar, arrolando uma série de motivos pelos quais esquerda e direita, conceitos utilizados pela primeira vez na política durante a Revolução Francesa, ainda são mais do que significativos nos dias de hoje, partindo desde o mais óbvio (o fato de que as pessoas ainda definem facções no espectro político segundo o critério de divisão entre esquerda e direita) até uma análise mais cuidadosa segundo a qual esquerda e direita subsistem devido às maneiras bem diferentes de encarar questões como liberdade e igualdade entre os homens.

Embora fácil de ler e sem excesso de jargão, Direita e Esquerda não é um livro simples. Quem se sentir intimidado pelo texto caudaloso de Bobbio pode começar a leitura de trás para diante, a partir dos apêndices, igualmente suculentos porém mais mastigados. O primeiro é uma crítica que Bobbio escreveu em 1993 para a revista italiana Reset sobre o livro de Francis Fukuyama, O Fim da História e o Último Homem.

Fukuyama, que foi duramente criticado pela visão simplista da esquerda nesse livro (que afirma que a história conforme concebida pela visão de mundo comunista havia chegado ao fim após o fracasso da experiência soviética), toma uma marretada elegante de Bobbio com justa razão, explicando que um dos problemas do livro reside em uma definição distorcida de esquerda da parte de Fukuyama. A argumentação de Bobbio neste artigo serve como um bom primeiro passo para iniciar a leitura de Direita e Esquerda.

O segundo apêndice apresenta uma crítica escrita por Perry Anderson, editor da revista britânica New Left Review, à primeira edição do livro italiano. Anderson aponta possíveis falhas no ensaio de Bobbio, entre as quais a observação de que alguns dos países mais fortes econômica e politicamente no mundo, como Estados Unidos e Japão, não se pautam pelos critérios de esquerda e direita.

O último texto do livro contém a réplica de Bobbio, reconhecendo pequenas inconsistências (que não prejudicam o corpo da obra) e explicando, como faz ao longo das 145 páginas do texto principal, que sua argumentação não é original, mas está embasada no pensamento de outros autores contemporâneos

De qualquer maneira, apesar de possíveis falhas de argumentação, a dupla publicação de Bobbio no Brasil às vésperas de uma nova eleição para presidente é providencial. Porque faz pensar, coisa de que andamos bastante precisados. [Webinsider]

Fábio Fernandes é jornalista, tradutor e escritor. Na PUC-SP, é responsável pelo grupo de pesquisa Observatório do Futuro, que estuda narrativas de ficção científica e a forma como elas interpretam e são interpretadas pelo campo do real.

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7 respostas

  1. Eu gostaria de saber, a sua interpretação sobre este conceito do ciêntista político Italiano Norberto Bobbio que dizO DIREITO DO CIDADÃO É A CONVERSÃO UNIVERSAL, EM DIREITO POSITIVO, DOS DIREITOS DO ser humanoPor favor me mande resposta urgente até segunda-feira, desde já te agradeço.

  2. Eu gostaria de saber, a sua interpretação sobre este conceito do ciêntista político Italiano Norberto Bobbio que dizO DIREITO DO CIDADÃO É A CONVERSÃO UNIVERSAL, EM DIREITO POSITIVO, DOS DIREITOS DO HOMEM Por favor me mande resposta urgente até segunda-feira, desde já te agradeço.

  3. Eu gostaria de saber, a sua interpretação sobre este conceito do ciêntista político Italiano Norberto Bobbio que dizO DIREITO DO CIDADÃO É A CONVERSÃO UNIVERSAL, EM DIREITO POSITIVO, DOS DIREITOS DO HOMEM Por favor me mande resposta urgente até segunda-feira, desde já te agradeço.

  4. > Participei do curso de formação de educadores e, só então fiquei conhecendo o autor do livro pela palestrante Luzmar D. de Camargo mestre filosofia. E confesso que adorei pois o livro condiz com a realidade do atual momento que nosso país está vivendo na crise política atual que se encontra. Quero parabenizar.

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