Por que tenho que pagar pelo meu jornal?

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Luís XVI deve ter se sentido assim. De um lado, os ventos da modernidade a soprar inclemente; do outro, o povo clamando por sensatez. No centro da questão, o dinheiro – sempre ele – a fazer a roda do tempo girar mais uma vez.

Estou pregando a Revolução? Nem é preciso, amigos. Fato é que, à luz dos acontecimentos dos últimos anos, os jornais impressos observam em pânico, da sacada de um Versalhes digital, o perigo se aproximar. E se movimentam na penumbra, em passos minuciosamente estudados, cuidando para não disparar um novo “se não tem pão, sirvam brioches”. É feia a coisa.

De um lado, uma questão ancestral, que nos remete à era moderna do jornalismo: antes da web, não havia opção se eu quisesse consumir informação confiável. Era preciso pagar para ter acesso à apuração bem feita, ao texto claro e inteligente. Pagávamos sem pensar, e ao longo das últimas cinco décadas virou fato do dia-a-dia do cidadão do mundo inteiro comprar um jornal. Vai-se à banca de manhã cedo ou o exemplar é depositado na porta de casa, antes do café da manhã. Em troca, dinheiro, e ponto final.

Do outro lado, as versões online dos jornais surgiram com a web, começando a rivalizar com as de papel. Tentativas foram feitas para se cobrar pelo conteúdo, mas o público chiou. Vieram os blogs e os jornais foram obrigados, com o tempo, a entendê-los e até a contá-los como ferramenta de trabalho. A notícia, agora, circulava em bilhões de minúsculos pedaços, em uma realidade virtual em que o controle da informação começava a escorrer por entre os dedos.

No momento em que as grandes empresas começavam a pensar, ainda aturdidas, em um novo modelo de negócios em que a notícia ao menos pudesse encontrar nas grifes jornalísticas ? e em tudo o que isso significa ? uma base sólida que justificasse ser trocada por dinheiro, veio a Crise. E tudo começou a ruir.

Graves questões vêm à tona. Se não estamos mais no alvorecer do ciberespaço, mas no fim da infância da web, e neste cenário encontro, sim, informação confiável espalhada pelos mil cantos da Rede, por que tenho que pagar pelo meu jornal? Afinal ? e aí ressurge a principal questão, vinda do início da era do jornal pago ? é a junção notícia/publicidade que mantém um jornal vivo e um produto nas prateleiras, não é? Foi desta troca que surgiu o modelo de negócios de sucesso que sobrevive até hoje.

Mas, pare e pense: se um produto quer ser visto, por que *eu* devo pagar por um veículo que ?transporta? este anúncio e tantos outros? Se o produto quer visibilidade, ora bolas, que o jornal me seja oferecido de graça! O anunciante paga o espaço ao jornal ? aí sem faz sentido ? mas ele me chega gratuitamente.

Ao longo de muito tempo, havia um conformismo (bastante incômodo) que justificava que se pagasse por um impresso: por mais que fizesse sentido a troca jornal/anunciante, não havia jeito para que se tivesse acesso à notícia de qualidade, era preciso pagar. Se não havia saída, era no próprio bolso que tínhamos que mexer, mesmo.

Em 2009, estas e outras questões não apenas vêm à tona, mas começam a incomodar seriamente ? a todos, a bem da verdade, e não apenas a jornais e anunciantes:

  • Já é possível um leitor confiar no que lê na internet, diariamente?
  • Teria chegado o momento de reproduzir gratuitamente na Rede tudo o que se paga para ler no jornal, e desistir de recriar na web o modelo do impresso?
  • No impresso, será que as empresas jornalísticas sobreviveriam sem as assinaturas, seria possível bancar a qualidade da notícia apenas com os valores dos anúncios?
  • Este novo modelo daria certo com empresas jornalísticas de médio e pequeno porte?
  • E, ponto mais preocupante, como sobreviveria o jornalista neste cenário?

Tantas questões, quanta incerteza. Por mais que saibamos que momentos de mudança pedem criatividade e jogo de cintura, será que ainda há tempo para negociar com quem que clama por novos paradigmas (o leitor), ou só resta, mesmo, um fim trágico para o jornal impresso e pago? [Webinsider]

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A próxima edição de meu curso Webwriting & Arquitetura da Informação começa em 7 de abril no Rio. Para quem deseja ficar por dentro dos segredos da redação online e da distribuição da informação na mídia digital, é uma boa dica! As inscrições podem ser feitas pelo e-mail extensao@facha.edu.br e outras informações podem ser obtidas pelo telefone 21 21023200 (ramal 4).

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Espero você em twitter.com/brunorodrigues.

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Bruno Rodrigues (bruno-rodrigues@uol.com.br) é autor do livro 'Webwriting' e de 'Cartilha de Redação Web', padrão brasileiro de redação online'.

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10 respostas

  1. Acrescentando.

    Pra mim oq vai acontecer é q os profissionais vão usar a qualificação e a verba q têm pra fornecer a informação crua, vão fornecer as últimas notícias de graça e o histórico das patérias sendo cobradas.

    E com sorte o povo vai evoluir e a net vai virar um meio pra troca e debate de idéias, usando a informação crua dos jornais como base e fonte.

  2. Belo artigo.

    Nesse assunto, me preocupa mais o jornaleiro do q as empresas jornalísticas em si.

    Já existe jornais q são distribuídos gratuitamente e financiados pela publicação. Há alguns anos a Band tava fazendo parceria com um internacional q tava chegando, naum sei q fim levou pq eu naum vivo na Ilha da Fantasia (mais conhecida como São Paulo). Mais visível é outro q eu já vi até em supermercado.

    Acredito q vai chegar a hora q a cobrança vai virar um empecilho. Com o avanço da tecnologia dos celulares, o povo vai poder acessar o Google News de qqr lugar, e ter acesso a uma vasta gama de opções de fontes, além da interface se adaptar ao interesse de cada usuário.

    Um velho idoso acostumado a ler o jornal na privada ou no café da manhã pode até naum gostar (mas mesmo ele, basta ensinar a aumentar o tamanho da font q ele vai passar a adorar a novidade…..), mas como explicar a falta de interatividade e a monotonia à nova geração?

    Distribuído de graça, além da informação ser democratizada, abandona-se o modelo de negócios onde o conteúdo fica travado esperando o pagamento e abre-se oportunidade pro conteúdo ser oferecido e estimulado, espalhando por todos os lados.

    E de volta ao jornaleiro, como ele fica? Como vai ser o pagamento, se ele naum vende nada? Como concorrer com mercados e farmácias? Acredito q o jeito vai ser diversificar e vender outros produtos.

    Se bem q além da notícia, ainda existe outros conteúdos q podem continuar sendo vendidos. Mangás por exemplo, q tem muito mais valor e tem propriedade autoral, esses pra conseguir de graça só via pirataria mesmo. Ou animes vendidos junto de revistas de 6 páginas.

  3. *Guilherme*, pois é, eu não gosto dessa história de que a base de democracia é a imprensa e que para ela existir temos que abrir a carteira… Às vésperas da segunda década do século XXI, será que ainda não notaram que o Jornalismo é muito maior que a imprensa, muito mais influente e poderoso que uma pliha de papel pela qual temos de gastar dinheiro?

  4. Viva a revolução…

    quem gosta de papel que compre o seu jornal… leio notícias em vários jornais e nào pago por isso, na verdade, acho que os jornais e revistas é que tem que me pagar para eu le-los. Eles que se virem em prender a minha atenção, que me tragam notícias interessantes e de uma forma cada vez mais interativa.

    porque ficar limitado a ler uma notícia em um pedaço de papel se eu posso ler a notícia e mandar pau ou elogiar imediatamente? Pagar por informação? por favor qual o objetivo da internet? alguem se arrisca?

    Viva o socialismo digital, ninguem é de ninguem, vivaaaaa….

  5. *Julio*, pois é, os leitores provocam a seleção natural dos veículos; só sobrevivem os bons.

    *Rene*, se escrevi o texto é porque vejo, sim, problema em pagar por um jornal, ué 😉 E por isso explicito os motivos. Se os jornais vão precisar arriar as calças para a publicidade, isso só reforça a minha ideia: é um problema *deles*, não dos leitores. Como eu disse para o Julio, só sobreviverão os que conseguirem encontrar um novo modelo de negócio – uma busca que está acontecendo desde o ano passado. Sobre consumismo, triunfo da publicidade e massificação de conteudo, é papo para chope… 🙂 E quanto a pagar pelo trabalho dos outros, no caso dos jornalistas, quem precisa se preocupar com isso – mais uma vez, vamos lá – são os veículos, não os leitores. Não necessariamente precisamos ser fatores dentro desta equação…

    *Taís*, você lembrou de um ponto ótimo, que só reafirma o que eu levantei: se não pagamos pela tevê aberta há décadas, por que pagamos pelos jornais que lemos?

  6. Bacana esse ponto que você tocou, também acho que é hora de questionar a veracidade das informações online. Você só esqueceu que jornalismo não é só jornal diário. Tem televisão e rádio também. E não pagamos por eles (claro, pagamos a televisão e a conta de luz, mas aí então temos que ver que a internet tbm não é de graça). Publicidade sempre vai existir, e sempre vai incomodar. O negócio é ir lidando com tudo isso, de forma criativa. Se esse modelo já não funciona mais, vamos reinventar!

  7. bruno, qual o problema em se pagar por um jornal? eu pago com muito bom gosto, porque gosto da linha do meu jornal, prezo o trabalho editorial deles e quero que sobrevivam. o mesmo vale pras revistas que assino e compro na banca.

    se eu nao pagar vao ter que arriar as calças pra publicidade de vez e lá se vai a qualidade ou a isencao ou a coragem editorial.

    o que voce prega, a meu ver, reforça ainda mais o consumismo, o triunfo da publicidade e propaganda e a massificacao acachapante do conteudo (vide TV, por exemplo)

    de novo: pagam pelo teu trabalho. pagam pelo meu. qual o pecado em se pagar por conteudo?

  8. Os jornais gratuitos estão aí para provar essa sua tese, de que eu não preciso pagar por um jornal cheio de publicidade (edições de fim de semana dos jornalões são ABSURDAS com aquele monte de anúncios imobiliários), já que ela pode sustentar a publicação. Mas enquanto isso não vira realidade por completo, continuo a separar parte do orçamento para consumir a imprensa melhor apurada, mas que nem por isso deixa de ser tendenciosa.

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