Vigiar e Punir, de Foucault, se estende às redes sociais

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Na última semana, estive conversando com o @gustavoloureiro, coordenador do MBA de Marketing Digital do Instituto Infnet, onde sou professor, sobre a realidade das redes sociais e as referências a algumas teorias propostas, inicialmente, por Jeremy Bentham e Foucault.

Após a leitura de seu texto sobre o Panoptismo, me veio uma lembrança, aparentemente, sem conexão com o propósito: o filme Jogos Mortais (Paris Filmes, 2004).

Para alinhar as informações, primeiro, é preciso definir o conceito de unidade panóptica, sua aplicação e evolução. Em 1785, Bentham propôs um desenho para centros penitenciários, onde um vigilante poderia observar os prisioneiros sem que estes soubessem ou tivessem certeza da vigilância, deixando os internos em constante estado de alerta e controle.

Muitos anos depois, em 1975, Michael Foucault publicou uma das obras que mais influenciou a formatação de políticas sociais na nossa sociedade: o livro Vigiar e Punir. Nele, o filósofo contempla suas impressões sobre o estado de vigilância e consequente punição, mediante alguns critérios de classificação de delitos. Indo além, ele propõe que essa lógica seja estendida para outras instituições sociais, como as escolas e até mesmo a ambientes de trabalho.

Sem dúvida, os mecanismos de coerção social e vigilância existem há muito tempo e, com o passar dos anos, vêm sendo aprimorados por meio das tecnologias. Vejamos o caso de situações políticas mais recentes, como na China, onde a liberdade de acesso e compartilhamento de conteúdo é extremamente normatizado.

Obviamente, trata-se de uma situação extremada e até mesmo violenta, muito embora ilustre a questão do cerceamento e delineamento de comportamentos de forma precisa. Os chineses são vigiados, controlados, manipulados e punidos por atos considerados impróprios, mesmo que sejam somente verbais.

Pensando no roteiro do filme, temos o personagem Jigsaw como aquele que estaria na torre da unidade panóptica vigiando, controlando, manipulando e punindo. Para ele, o que é feito na vida tem um preço. O que é falado tem um preço. E nem sempre o preço a se pagar é barato. Há quem tenha perdido uma perna por pura falta de atenção, lembram?

Ao longo das sequências do filme, é possível perceber que Jigsaw promove a mesma linha lógica de castigo por faltas cometidas, mas de formas diferentes. Os personagens, em algum momento antes do confinamento, interagem com o esse “juiz” e, a partir disso, tem sua experiência no jogo confirmada e iniciada. Para cada um deles, era pensada uma forma de participação, importância no contexto do evento e possível “sucesso”.

É interessante que, ao pensarmos em nossa vida real, a situação não é diferente ou tão fictícia. Para muitos, o drama é o mesmo. Pensemos em um candidato a uma vaga de emprego, cujo composto de competência seja da seguinte forma: a pessoa possui excelente formação acadêmica e currículo exemplar, ou seja, o pilar do conhecimento está sólido.

Aprofundando-se, é possuidora de resultados interessantes – sabe executar diversas tarefas e manipular ferramentas, o que caracterizaria o pilar habilidade de forma positiva e consistente.

No entanto, ao fazer uma busca pelo candidato nas redes sociais para que seja possível conhecer mais sobre sua personalidade, encontram-se mensagens e interações que indicam preguiça, falta de interesse por trabalho ou até mesmo repulsa por lidar com outras pessoas em ambiente corporativo.

No Orkut, por exemplo, é muito simples encontrar comunidades do tipo “Eu odeio meu chefe.” ou “Detesto segunda, primeiro dia de trabalho”. Nesse ponto, uma grave falha, pois o pilar de atitude fica comprometido e o candidato não mais é considerado para a vaga.

Percebam a lógica panóptica em um, aparentemente, simples ato de recrutamento.

Em resumo, todos nós temos um pouco de Jigsaw, sendo um headhunter ou apenas consumidor. É importante salientar a necessidade do devido entendimento sobre a complexidade de nossa existência na web social. Para todo discurso, encenação, ação e acontecimento há um espectador, há uma plateia que, por vezes, parece não existir, mas está ali e é extremamente observadora.

A exemplificação acima vale para produtos e serviços, pois a construção de marca pessoal tem as mesmas bases que as corporativas. Sem dúvida, a correta manutenção dos pontos de contato com prospects e consumidores é um fator crítico. É necessário que tenhamos conhecimento, cuidado e coerência para uma saudável existência em tempos digitais, onde a imagem é mais frágil e de fácil distorção.

Toda rede social, em sua essência, tem um pouco de Foucault e seus Jigsaw.

“Do you wanna play a game?” [Webinsider]

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Vitor Lima (vitor@clartestudio.com.br) é publicitário, mestrando em adm. de empresas, sócio e diretor de planejamento da Clarté. No Twitter é @vitormlima.

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9 respostas

  1. Excelente texto.

    Um ótimo de exemplo do pensamento Focault, é o caso da menina que ao expressar seu pensamento em apenas 140 caracteres, tomou proporções astronômicas, virando assunto de jornais e revistas.

    Por mais que você tome as atitudes sozinho, sempre tem alguém “vigiando” o que você faz.

    O engraçado é que existem muitas pessoas que tem o mesmo pensamento, mas “tiram” o corpo fora julgando desnecessariamente.

    Hipocrisia pouca é bobagem.

    abs

  2. Excelente texto comparativo entre a teoria de Focault e as redes sociais.

    Mas, o foco foi puramente corporativo. Não se enxerga mais o ser humano de forma holística, mas apenas como mão de obra das corporações.

    Soa meio hipócrita dizer que todos amam a segunda-feira. Mas, em nome do corporativismo, temos que ser obrigados a nem dizer que não gostamos da segunda-feira.

    Ou seja, todos sabem que ninguém gosta das segundas, mas não podemos deixar isso transparecer.

    Eu chamo isso de hipocrisia corporativista, Devemos parecer normais e perfeitos, em uma sociedade que visa apenas os vencedores.

  3. Olás;

    Essa visão da sociedade do controle vai mais longe do que aparenta e, a cada dia, tende a dominar mais a realidade tanto cotidiana offline quanto a cotidiana online (ambas tornando-se uma só a cada dia).

    Mais do que uma observação ou apontamento da realidade, entendo o texto acima como uma crítica a essa situação.

    Não apenas com Michel Foucault, mas também com outros autores como Giorgio Agamben, podemos pensar a sociedade de controle contemporânea com outros olhos. De fato, olhos preocupados quando se trata da questão do público e privado, liberdade de expressão, etc. A esse respeito vale a pena propor discussões sobre, por exemplo, a Lei Azeredo. Para quem tem interesse nessa discussão no contexto brasileiro, pode começar por aqui: http://www.petitiononline.com/veto2008/petition.html

    Abraços a todos!

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