Castells, McLuhan e Lévy e o futuro das empresas

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Vivemos no mundo do curto prazo.

Todos falam em inovar, sair da caixa, de se reinventar, na tal “sociedade do conhecimento”, que não tem tempo para parar. Assim, somos consumidores de tecnologias e de metodologias empacotadas.

Porém, é importante saber que a metodologia é uma linguiça de frango. Antes dela, precisou-se criar o ovo (a filosofia) e a galinha (a teoria), que, empacotadas, amassadas, comprimidas nos permitem ter nossas boas e conhecidas metodologias de plantão.

  1. Se a teoria diz que estamos na sociedade do conhecimento (que implica em uma visão filosófica da relação do ser humano com o conhecimento) precisamos de gestão de conhecimento;
  2. Se a teoria diz que estamos na sociedade das redes (que implica em uma visão filosófica da relação do ser humano com as tecnologias das redes) precisamos de redes sociais corporativas;
  3. Se a teoria diz que estamos na sociedade da inovação e da mudança (que implica em uma visão filosófica da relação do ser humano com as mudanças) precisamos de gestão de inovação.

Tudo é encadeado e se algo não dá muito certo precisamos rever o ovo, a galinha e depois a linguiça de frango.

Questões filosóficas estão no topo da escala humana, pois definem as relações dos seres humanos, sua potência e a onipotência.

Determinadas visões filosóficas condicionam a maneira de como vemos as coisas, como as forças se organizam (teoria) e como devemos nos alinhar a elas (metodologia).

Lendo um texto do Castells, por exemplo, “A Sociedade em Rede: do Conhecimento à Política” temos uma análise da sociedade de hoje.

Porém, há um ponto importante a ser diagnosticado.

Castells aponta o seguinte:

“Nós sabemos que a tecnologia não determina a sociedade: é a sociedade. A sociedade é que dá forma à tecnologia de acordo com as necessidades, valores e interesses das pessoas que utilizam as tecnologias“.

Mais adiante ele diz:

“Contudo, a tecnologia é condição necessária, mas não suficiente para a emergência de uma nova forma de organização social baseada em redes, ou seja, na difusão de redes em todos os aspectos da atividade na base das redes de comunicação digital”.

Não podemos dizer que Castells não coloque algum peso na força autônoma da tecnologia.

Podemos dizer, entretanto, que é um pensador que acredita que a tecnologia tem uma taxa baixa de força autônoma e que é a sociedade que dá forma a ela – segundo o texto coletado.

Já, por exemplo, McLuhan, seguido de Lévy e Latour, não veem a tecnologia como algo tão neutro.

São pensadores que consideram que a taxa de autonomia ou de condicionamento, ou de influência de dada sociedade é maior do que nossa vã filosofia imagina.

McLuhan, talvez o mais conhecido defensor dessa ideia, ao afirmar que “o meio é a mensagem” sugere que a taxa de condicionamento que dada tecnologia impõe à sociedade  é bem acima do que imagina Castells.

Basta ver TV, independente o canal, que ela está fazendo a sua cabeça.

Ou seja, um acredita que a tecnologia tem uma baixa influência e outro que tem uma alta influência.

Perguntarão os mais céticos: o que importa para o mundo essa discussão?

Muito.

Na linha de Castells, podemos pensar que as organizações podem fazer e usar a tecnologia de qualquer maneira, pois elas terão o poder de influenciá-la, de moldá-la, de fazer todo o ajuste necessário, pois, citando de novo Castells:  a sociedade é que dá forma à tecnologia de acordo com as necessidades, valores e interesses das pessoas que utilizam as tecnologias.

Ou seja, podemos incorporar nas atuais organizações as ferramentas colaborativas da internet, pois o ambiente saberá utilizá-la, moldá-la e adaptá-la ao seu modo.

A tecnologia seria neutra a espera de ser moldada pelo ambiente.

Isso nos leva a aceitar as metodologias que estão hoje em voga de projetos de redes sociais corporativas, adaptando a tecnologia à atual gestão.

Por outro lado, se a afirmação de McLuhan e outros estiver mais próxima da realidade, as tecnologias não podem ser moldadas pelo uso, pois elas têm um poder autônomo que está acima de quem a utiliza.

Ou seja, têm o poder de moldar a sociedade com muito mais intensidade do que prevê nossos modelos atuais, pois a tecnologia deixa de ser vista como ponta e passa a  indutora de mudança.

  • Na linha filosófica de Castells, é a organização que vai moldar a Internet e as redes sociais a seu bel prazer;
  • Na linha filosófica de Mcluhan são as redes sociais que irão moldar as organizações;
  • Uma diferença gigantesca de estratégia. Estamos todos muito mais para Castells do que para Mcluhan, Lévy e etc.

Isso nos leva para caminhos completamente diferentes, quando pensamos em usar essas filosofias em uma metodologia.

  1. Na primeira, a sociedade irá determinar a sociedade futura, independente da tecnologia.
  2. Na outra é a tecnologia que vai influenciar fortemente os limites da sociedade futura.

Nas tentativas práticas que vivenciei, pois acreditavam no conceito da tecnologia neutra, acreditei ser possível implantar colaboração, via redes sociais digitais, nos modelos das organizações atuais.

Não obtive sucesso em várias delas.

Percebi que a internet moldava um tipo de utilização, criava um tipo de cultura, que é incompatível com o modelo de gestão atual.

Uma mantém um tipo de controle de processos e troca informacional que a outra não aceita. Querer uma na outra é como se quiséssemos criar uma nova língua entre o alemão e o francês – vai ser algo tão demorado, incerto, difícil e caro, que é melhor optar por uma ou outra. É melhor, assim, optar por aquela que os jovens – que definem o futuro – se sentem mais confortáveis.

Portanto, acabei me rendendo a visão de McLuhan e outros de que sim, a tecnologia, ainda mais as cognitivas e em particular as que descontrolam o ambiente de informação e trocas, têm o poder de criar uma nova cultura com seu uso continuado.

  • Concluí que se as organizações atuais são filhas do papel impresso e das mídias eletrônicas – com seu controle imposto pela lógica daqueles meios, verticais e pouco participativos;
  • Estamos criando – e precisamos aderir agora – a cultura digital que é do ambiente da internet colaborativa e participativa, que formará um outro modelo de gestão, baseado no modelo do controle digital.

São DNAs incompatíveis, pois os que usam a nova tecnologia cognitiva desintermediadora já passam a ser outros seres humanos ao utilizá-la.

Esse impasse filosófico desce para os detalhes mais micros das nossas estratégias e definem dois caminhos a serem seguidos pelas organizações, consultorias, empresas de tecnologia, projetos internos em todas as áreas:

  1. O mais óbvio – basta implantar a tecnologia e moldá-la e vamos em frente.
  2. O mais complexo – só vamos em frente se nos moldarmos a nova cultura que ela traz.

Digo: não há nada mais prático do que encarar esse debate de frente, escolher conscientemente um caminho e ver qual das duas visões mais se aproxima da dita realidade, que vai levar as organizações a geração de valor.

Se algo estiver errado, deve-se voltar para a filosofia, refazer a teoria e, só então, voltar a ter uma metodologia, nessa ordem.

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3 respostas

  1. O texto é fantástico. Incrível. Só acho que as duas visões não são excludentes. Acredito, por exemplo, que o surgimento das redes sociais não veio do nada e alterou os hábitos das pessoas, e sim, é o reflexo das necessidades sociais dessa nova geração (vide o conceito de aldeia global que Mcluhan discutiu ainda na década de 60). No entanto, as possibilidades que essas redes trouxeram, modificaram sim o comportamento das pessoas.

    De qualquer forma. Muito bom

  2. …bem, usando a uva como metáfora, a sua produção formatou (e ainda continua a formatar) toda a cultura de Valdobbiadene – lugar onde é produzido um dos melhores proseccos do mundo. De uma forma ou de outra, a maioria das pessoas da cidade é impactada pela produção da uva. No caso, a uva (tecnologia) determina, há mais de 200 anos, os rumos da população da cidade (sociedade). Claro, ao longo desse tempo, os modos de fabricação do vinho foram sendo aperfeiçoados, mas a cultura local sempre se desenvolveu a reboque da produção da uva. Diferente do que pensa Castells, a linha filosófica de Mcluhan nos faz pensar que as tecnologias formatam as sociedades onde são empregadas. Em Valdobbiadene, diversas gerações (sociedade) viveram (e vivem) em função da uva(tecnologia).

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