CpME, o custo por minuto de entretenimento

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on telegram
Share on pocket

Com a digitalização das relações humanas e, consequentemente, a digitalização do entretenimento, os migrantes digitais se encontram perdidos quanto à compreensão do valor de bens e experiências digitais.

A conversa teve início na tentativa de checar a um consenso sobre que preço atribuir a um aplicativo na iTunes Store. U$ 1,99? U$ 2,99? U$ 0,99? Quanto vale aquele entretenimento?

Existem estudos e discussões sobre melhor preço a ser praticado especificamente em lojas de aplicativos, mas não gostaria aqui de tratar da barreira psicológica dos R$ 0,99, mas sim estabelecer um paralelo entre diferentes tipos de entretenimento (digital e físico) e valores pagos para tanto.

A relação de compra e venda para produtos tangíveis de entretenimento sempre foi bastante clara (sim, pessoas pagam quase R$ 1.000 em um console de videogame); a compra de experiências físicas também não desperta surpresas (levamos a família toda para os parques de diversão da Disney).

Contudo, a virtualização deste entretenimento e o crescimento do pensamento voltado a microtransações cria barreiras e dúvidas quanto ao valor percebido do produto/serviço.

Por exemplo, quando tratamos de comércio, pode-se elencar a tangibilidade ou virtualidade da operação em três eixos:

  • Ambiente: onde a transação se realiza
  • Valor de troca (pagamento): qual é o valor monetário utilizado na transação e como é feita a troca de valores
  • Produto: o bem em si

Em gráfico em três eixos (quase um cubo de Riddik), a curva de intagibilidade parte do tipo mais puro de venda (bem físico, comprado em uma loja física, e pago em efetivo) para a essência do e-commerce (um bem digital – virtual good – comprado online e pago através de bits & bytes). No meio, todas as possíveis combinações entre estas três variáveis.

Quanto mais se digitaliza um destes elementos, ou seja, quanto mais se passa do físico para o virtual, maior a dificuldade em quebrar a barreira de confiança junto a grande parte dos consumidores. Quando surge o e-commerce lá pelos idos de 1999, havia uma barreira cultural a ser quebrada – sim, pode colocar o cartão de crédito aqui que o produto vai chegar direitinho na sua casa. No Brasil, ao menos, isto não mais ocorre nestas proporções.

Outro desafio tem sido provar o valor de um produto digital. Sendo bem sincero, cada vez menos é percebido valor sobre um conteúdo digital, sobretudo quando este conteúdo é consumido sem interação (música/filme, passivos, versus games, interativos); sejamos pragmáticos, quantas pessoas hoje em dia COMPRAM música digital, e quantas baixam gratuitamente? Quantas COMPRAM filmes ou livros e quantas compartilham este conteúdo livremente? Não estou aqui entrando no mérito jurídico ou filosófico do valor autoral, mas dizendo: sim, isto acontece.

A venda de conteúdos digitais tem seu valor menos no conteúdo em si e mais na facilidade do serviço atrelado à sua obtenção e utilização nos dispositivos preferidos; por exemplo, é muito mais fácil pagar R$ 14,90 por um mês de Netflix ou Netmovies para assistir quantos filmes quiser do que se dar ao trabalho de buscar o filme, baixar a legenda, sincronizá-los e eventualmente se deparar com conteúdos de baixa qualidade. Conteúdo, há algum tempo, deixou de ser produto para virar serviço.

Se o conteúdo em si não tem valor financeiro percebido (elevando este comportamento em grande escala), duas abordagens conseguem extrair alguns centavos de real dos consumidores: serviços e experiência.

Apesar do conteúdo estar à sombra de serviços que facilitem sua obtenção e consumo, a experiência digital é sim tida como um valor percebido, porém não claramente precificado.

Os inúmeros dispositivos e distintas formas de entretenimento (passivo ou interativo) sempre foram vistos de maneira independente com relação a seu valor e preço (duas variáveis interligadas, porém gerenciadas separadamente).

Considerando que uma experiência digital interativa demanda um certo grau de foco e exclusividade (diferente de um consumo isolado de mídia, como assistir à TV, por exemplo, onde é muito mais fácil realizar uma atividade paralela), podemos estipular uma comparação de preços através do tempo dedicado à tal atividade. Chamemos de ‘custo por minuto de entretenimento’.

Utilizando como comparação uma outra atividade que demanda um maior foco, o cinema. Hoje, assistir a uma sessão de cinema na cidade de São Paulo custa, mais ou menos, R$ 30,00. Considerando um filme de 1:45h (ou, 105 minutos), o CpME desta atividade é aproximadamente R$ 0,29 – claro, desconsiderando custos eventuais atrelados à atividade, como estacionamento, ou aquela pipoca para acompanhar o filme).

Mas não olhemos estes dados de maneira isolada; comparando com atividades de entretenimento digital:

Game para console

Um jogo de videogame (XBox, PS3, Wii, etc) leva, em média, 25 horas para ser finalizado (desconsiderando jogos em rede, virtualmente impossíveis de terem um tempo máximo de uso). Um exemplo, segundo a IGN Entertainment, as expansões de GTA IV – The Lost and Dammed e Balad of Gay Tony – levam 20 horas para serem completadas.

Assumamos as 25 horas (1.500 minutos) de um jogo completo, atualmente vendido no Brasil a um preço base de R$ 179,00. Isso traz um CpME de R$ 0,11, concluindo que é relativamente três vezes mais barato você comprar um jogo de videogame original (que muitos reclamam dos preços elevados no Brasil, não discordo), do que uma rápida ida ao cinema no final de semana.

Jogos mobile

Sobretudo por não serem necessariamente lineares, é difícil estipular um tempo de uso para alguns jogos em dispositivos móveis. A Rovio, dona do Angry Birds, havia divulgado que foram feitos 300 milhões de downloads de seu principal produto, e que as pessoas gastaram 200 milhões de minutos por dia entretendo-se com o título, o que daria, em média, R$ 0,67 minuto jogado por dia.

A empresa lança uma nova versão dos passarinhos bravos a cada 6 meses, levando em conta a redução dos DAUs (Daily Active Users) ao longo do tempo. Imaginando então estes 180 dias de vida útil estimada de uma versão como tempo de jogo, teríamos algo como aproximadamente 120 minutos, ou 2h ininterruptas, de arremessos de passarinho em porcos. Ao custo de U$ 0,99 (R$ 1,98), são R$ 0,0165 de CpME.

Jogos sociais

Segundo uma apresentação da O2 games, os jogos sociais atingem 42% dos usuários das redes, que os jogam por até 30 minutos por dia. O tempo médio de permanência em um jogo social é de quatro meses (com uma grande variância de 2 dias à 1,5 ano, este último referente ao grande sucesso Farmville, em seu tempo), e o valor médio gasto por aqueles que pagam é de U$ 2/dia (arredondemos R$ 4,00). Juntando tudo isso, entre aqueles que pagam, temos um CpME = R$ 0,13.

Mundos virtuais

Tomando o maior mundo virtual para crianças e adolescentes do mundo, o Club Penguin, como parâmetro. Segundo o Ibope Netratings, no mês de novembro de 2012 o tempo médio em que os pinguins interagem uns com os outros neste universo lúdico é de 01:27h, ou seja, 87 minutos. Um CpME de R$ 0,10.

Comparativamente, da próxima vez que seu filho pedir um XBox360 de presente, imagine que que será mais barato comprar três jogos para ele do que levá-lo apenas uma vez ao cinema.

Concorrência

Claro que cada tipo de entretenimento traz uma experiência e um grau de envolvimento distintos, e unicamente a questão de preço entre estas diferentes experiências não necessariamente, no curto prazo, determina a opção por um ou outro tipo de atividade – se você quer ver aquele filme no cinema, um game mobile não irá tirar sua vontade.

Por outro lado, este pensamento nos lembra que, hoje em dia, tudo concorre com tudo pois, no fundo, competimos pelas mesmas horas livres disponíveis em um dia de 24 horas. [Webinsider]

…………………………

Leia também:

JC Rodrigues (@jcrodrigues) é publicitário pela ESPM, pós-graduado pela UFRJ, MBA pela ESPM. Foi professor da ESPM, da Miami Ad School e diretor da Disney Interactive, na The Walt Disney Company.

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on telegram
Share on pocket

Mais lidas

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *