Meias de Seda em disco de veludo

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A orquestra MGM é destaque no filme Meias de Seda

Meias de Seda (Silk Stockings, de 1957) foi finalmente lançado em Blu-Ray, como parte da Warner Archive Collection, lamentavelmente ainda não editada no Brasil, o que é uma pena, pois colecionadores que não gostariam de perder este e outros títulos da coleção terão que importar o disco, com todas as penalidades alfandegárias que o acompanham!

Meias de Seda foi um dos últimos musicais da M-G-M produzidos pela unidade de Arthur Freed. O filme é uma readaptação de Ninotchka, feito em 1937 com a estonteante e quase mítica Greta Garbo, estrela das estrelas do estúdio.

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Muita gente não gostou de ver a Metro refilmar a estória com números musicais. Em Meias de Seda, com adaptações parciais no roteiro, a camarada Yoschenko é uma mulher russa austera e tradicionalista, que vê no regime de seu país a luz que a guia para uma vida mais voltada para os benefícios comunitários do estado, e em detrimento dos prazeres mundanos do cotidiano dos indivíduos de outras culturas.

Ao visitar Paris para resolver o retorno imediato de um compositor e três agentes soviéticos que desobedeceram as ordens do partido, Ninotchka acaba por se deixar seduzir por tudo aquilo que ela antes objetara.

O filme foi realizado no então novo processo fotográfico em CinemaScope, com lentes anamórficas, e som estereofônico de quatro canais. Como de praxe, a M-G-M adicionou trilha sonora Perspecta, que felizmente nunca reapareceu em todas as edições em home vídeo do filme.

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O resgate de luxo

O objetivo da Archive Collection é o de remasterizar filmes do catálogo seja Warner ou M-G-M, com o mínimo de compressão da imagem, o que implica em reprodução com bitrate elevado (mais de 35 Mbps em média), e com som restaurado.

Meias de Seda foi feito em uma época onde as lentes usadas para filmes CinemaScope tinham ainda características óticas indesejadas, com notória distorção no centro da imagem. Além disso, a capacidade de resolução na captura é visivelmente inferior à mesma cena feita com lente esférica convencional.

As imagens resultantes fotografadas pelas lentes anamórficas de então exibiam uma fotografia com flou impossível de corrigir no laboratório. Tal efeito produz contornos imprecisos e às vezes grosseiro, até mesmo em tomadas em close-up. Tudo isso pode ser observado na nova cópia de Meias de Seda.

Ao reproduzir a nova edição logo no início nota-se uma granulação intensa na cópia, mas que se fosse retirada da imagem por algum tipo de filtragem iria certamente arruinar a vista de quem visse o filme.

A granulação neste caso é muito provavelmente devida à deterioração da camada da cor amarela do negativo ou da cópia. Os negativos Eastmancolor usados nesta época continuam a dar muito trabalho aos restauradores. Muito embora se possa corrigir a cromaticidade por software, a granulação continua aparecendo e varia de uma tomada para outra. A prática tem demonstrado que o uso de redução de ruído piora consideravelmente a qualidade da imagem em vídeo e por isso ele tem sido condenado por fãs e restauradores.

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Felizmente, os técnicos da Warner se refrearam em usar qualquer método de correção de grãos fotográficos ou de aumentar a nitidez de forma artificial, o que introduziria os temidos halos nos contornos que enfeiam a imagem.

Uma vez passado os primeiros momentos do filme eu consegui me abstrair dos grãos, e passei a curtir o desenrolar da trama. Acho que a maioria dos que adquirirem esta edição irá sentir o mesmo, pois aqui o filme em si é muito mais importante do que as limitações técnicas que o tempo não perdoou.

O processo CinemaScope  com som estereofônico é valorizado na música de Cole Porter para o enredo de Meias de Seda. De todas as edições em disco que eu já tive, começando com o Laserdisc, esta é sem dúvida a melhor restauração da trilha sonora deste filme já feita até hoje.

Uma parte da direcionalidade dos diálogos, comum em filmes CinemaScope e normalmente espalhados nos três canais frontais, foi parcialmente perdida, por motivos que eu desconheço. Entretanto, a direcionalidade das vozes está totalmente preservada em todos os segmentos contendo as gravações prévias das músicas e dubladas durante as tomadas de cena.

O conteúdo

O veterano diretor Rouben Mamoulian ficou conhecido como aquele que odiava o CinemaScope, e se dizia perdido para “encher a tela com imagem”. No entanto, o filme funciona com bons enquadramentos do início ao fim.

Meias de seda toca em um assunto delicado com generoso bom humor: a diferença de crença em sistemas políticos antagônicos, neste caso o comunismo ante burguesia versus o capitalismo explorador da massa de trabalhadores.

Em uma das cenas Ninotchka pergunta se o produtor Steve Canfield é um opressor ou oprimido, e ele responde “opressor é claro”. E ela retruca “você não tem vergonha?” e ele rebate “de um opressor para outro, você sabe que é a melhor posição para se ficar!”

O diálogo pode hoje parecer de um certo mau gosto, mas tem a desculpa de que a estória foi feita para ridicularizar mitos e não para despencar discursos panfletários em cima da plateia. Claro que o roteiro é focado na visão americana comercial de sucesso, mas por outro lado ele mostra o lado humano dos personagens, que independem de país ou credo.

Em torno disso a estória se desenvolve com muito bom humor. Se juntarmos neste clima a criatividade do compositor Cole Porter, o resultado final é ótimo, imperdível, diria eu, para o colecionador de filmes desta época.

Cole Porter consegue inserir música incidental e canções de excelente nível como, por exemplo, “All of You”, interpretada no filme por Fred Astaire.

Astaire fora contratado pela M-G-M já aposentado. É interessante notar a presença e o vigor do ator tendo passado dos cinquenta anos de idade. Não havia sido a primeira vez que a M-G-M iria estrelar um ator fora da idade do personagem, e por coincidência isso aconteceu de novo no último musical de Arthur Freed “Gigi?”, onde Leslie Caron já com idade além dos trinta interpreta uma adolescente. E especificamente em Meias de Seda ninguém se importa porque Astaire e Cyd Charisse se entrosam facilmente como parceiros de cena e de dança.

Como também a plateia não se importa e na realidade se diverte em ver Peter Lorre participando dos números musicais. Tudo isso faz parte de uma comédia proposital, que nos encanta até hoje.

A edição em disco

A Warner migrou o conteúdo de extras do antigo DVD, mas tomando o cuidado de remasterizar o curta “Abertura do Poeta e o Camponês”, destinado à demonstração do CinemaScope nos cinemas.

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A orquestra da M-G-M é a grande estrela deste filme, e pode ser vista em tomada em plano geral:

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O trailer também sofreu uma limpeza, inclusive no áudio. O pequeno documentário com Cyd Charisse sobre o filme foi originalmente gravado em vídeo standard e, portanto, não sofreu grande alteração na imagem.

Comentários finais

Eu ainda torço para que a Warner Brothers do Brasil se valha de bom senso e comece a relançar todos os musicais da M-G-M agora editados em Blu-Ray, pois nem todo mundo tem interesse em importar discos.

Como fã da época e em particular dos esforços técnicos da M-G-M eu pouco me importo com a ingenuidade destes filmes. Prefiro levar em conta a lembrança de um momento mágico do cinema, que ficou apenas na memória daqueles que o viveram. Fico feliz de ter a chance de resgatar esta memória, ainda que na época do lançamento deste e de outros filmes do estúdio eu não tenha tido a chance de vê-los pessoalmente.

Meias de Seda é um filme alegre, completado com música de alta qualidade, com som estereofônico de notável qualidade. Nesta nova edição em Blu-Ray o filme ganha som 5.1 real, com alguns efeitos usados nas laterais da sala, com a ajuda dos canais surround.

Em outras palavras: Imperdível! [Webinsider]

. . . . .

Leia também:

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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4 respostas

  1. Oi, Lee,

    Concordo totalmente contigo.

    E tem mais um outro detalhe: a estabilidade do sinal via HDMI, prejudicado com todas estas porcarias de proteção contra cópia, que a meu ver não servem para nada, a não ser encher o saco do usuário.

    No Blu-Ray 4K algumas notícias a este respeito não são nada animadoras. Mas, como nem player nem discos chegaram oficialmente aqui, e diante da qualidade que se pode obter com o que existe atualmente, isto passou a ser um assunto a ser encarado em outro momento.

  2. Olá Paulo,

    Existe uma porrada de filmes em BD atualmente, que são velhos masters datados e terríveis em imagem.

    Já existem sites especializados no assunto que diz respeito ao BD 4k, que os masters para autoração, são finalizados em 2K, 3K para o estoque DI dos estúdios e posteriormente lançados em BD 4k fake no novo formato, ou seja, não vão entregar o 4k de verdade, puro marketing, o negócio deles são números, e não o que realmente entregam.

    Te digo mais, uma conceituada empresa americana chamada Shout factory, finaliza seus masters em 2K, esse ano mesmo vão lançar o The Thing 1982 de John Carpenter, licenciado pela Universal, que essa última é famosa em lançar master datado de DVD para o BD.

    Para finalizar, 1080P em uma tela competente, filme restaurado, cores ajustadas, e o principal objetivo, distinguir os objetos dos cenários,no lançamento do HD-DVD e do BD, esse era o propósito, coisa que em nenhum formato antes do HD-DVD/BD foi possível alcançar.

  3. Oi, Lee

    Este seu comentário faz parte de um texto que ainda não saiu. Eu acho difícil de acreditar que os estúdios estejam fazendo upscaling dentro dos discos, isso depois daquele rolo todo com dos downloads, oferecidos à venda neste mesmo esquema e que foi rapidamente descoberto por vários usuários.

    Outro texto que está na pauta do Webinsider é o da ausência de 3D nas TVs 2016, incluindo as mais caras. O colecionador que quiser trocar a TV por uma nova faz o quê? Jogar os discos 3D fora? E não há desculpa técnica para o abandono do formato, é pura jogada de marketing.

    Eu concordo contigo que virou abuso esta coisa de comprar o mesmo título várias vezes, ainda mais que agora a qualidade do vídeo chegou a um ponto que não deixa mais a desejar, exceto por erros de autoração.

  4. Olá Paulo,

    Eu particularmente sou adepto da restauração em massa dos filmes em geral, tantos filmes populares como os de nicho, e o selo Archive Collection da Warner, eu tiro meu chapéu, os caras sabem fazer excelentes remasterizações, e pra mim isso é mais importante do que qualquer tecnologia do tal BD 4k fake, estão empurrando de goela a baixo para o pessoal desinformado como, achar que todos os filmes antigos que estão sendo relançados nesse novo formato 4k, que na verdade são um upscaling para essas TVs 4k, eu prefiro uma imagem 1080p de uma restauração exemplar, em vez de comprar o mesmo titulo por causa de resolução, como isso fosse essencial para imagem.

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