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Dizia um amigo meu, diante das suas próprias dificuldades para resolver problemas, que se tudo fosse fácil a vida ficaria sem graça! Interessante, porque, diante de certos problemas, eu prefiro a vida sem graça mesmo.

A vida do cientista, do pesquisador em geral, dos técnicos em manutenção e demais profissões correlatas, é cercada de problemas para resolver e de tentativas para achar uma explicação e solução adequadas para cada um deles. Primeiro, é preciso entender a natureza do problema, pois não se pode ter resposta de algo se não se sabe qual é a pergunta. E depois, pesar todas as variáveis envolvidas, até ver em qual delas, às vezes mais de uma, reside uma pista para elucidar a situação observada.

Todo mundo, mais cedo ou mais tarde, acaba acumulando nas costas um rosário de situações resolvidas, que faz as pessoas amadurecerem na busca por soluções de problemas novos. E uma coisa que eu sempre observei comigo e com outros é que quando se está envolvido demais com algum problema, a solução está na sua frente e você simplesmente não enxerga.

Uma situação que eu vivi anos atrás na universidade onde trabalhava ilustra muito bem o que eu afirmo: um dia, uma estudante de mestrado me procurou ansiosa, porque não estava conseguindo imprimir uma cópia da tese. Chegando à sala onde o computador estava, a primeira coisa que eu vi foi que a impressora estava desligada, e ela não havia notado nada!

Na informática do passado havia uma verdadeira via crucis a ser trilhada, toda vez que alguém instalava um board de expansão de alguma coisa na máquina. Todos os conflitos de IRQ e demais parâmetros tinham que ser resolvidos antes da placa ser montada, e quando não funcionava, gastavam-se horas para saber porque.

Tudo isto demanda tempo e quando não se tem uma resposta, é preferível parar tudo, ir fazer outra coisa, e tentar voltar renovado para enfrentar o problema outra vez. E nem sempre as pessoas que te cercam entendem isto: quando eu estava na UWCC, um professor de lá mandou comprar um módulo de expansão de memória para um computador 286. O técnico do departamento instalou, e quando ele viu que não funcionava, mandou devolver. Antes disto, foi interpelado por um dos meus orientadores, que disse a ele que ia me pedir para dar uma olhada.

E eu fui lá, com a cara e a coragem. Chegando à sala do professor, ele me convidou para sentar à mesa dele, uma honra concedida a poucos, para quem conhece o comportamento típico do britânico. E me diz que ia dar aula e que eu ficasse à vontade. Pois bem: bastaram alguns minutos para que eu me desse conta que o mapeamento dos dip switches usados para a configuração do módulo estava errado.

O “manual” da placa, um folheto impresso em papel de quinta categoria, tinha o mapeamento impresso, e se eu fosse me basear nele, iria concluir que a configuração estava certa, que foi provavelmente o que o técnico do departamento achou.

Aqueles dip switches, a propósito, substituíram os jumpers elétricos, mas eram cheios de problemas, entre eles mal contato nos terminais, e por isto todo mundo, ao olhar um conjunto daqueles, já ficava imediatamente com o pé para trás.

Para alterar uma placa de expansão, quando não havia acesso físico aos switches, era preciso removê-la do micro, e depois reinstalá-la. Uma hora inteira se passou, o professor voltou e, ao me ver no mesmo lugar, perguntou afirmando “Você ainda esta aí?!”. Então: eu levei um tempo enorme para remapear aquela geringonça, e só depois disto é que foi possível reconfigurar a placa que, ao contrário do que se presumia, não estava com defeito. A questão se resume, creio eu, ao tamanho da paciência, ou da obstinação, se quiserem, para atacar causas perdidas.

Desnecessário dizer que eu sou um que não tem a menor saudade da informática daquela época. Depois dos dip switches apareceram as placas “plug & play”, rapidamente apelidadas de “plug & pray”, a maioria híbridas, porque, se o “instale e rode” não funcionasse, lá estavam lá os velhos jumpers para quebrar um galho na configuração. Ainda a propósito: qualquer semelhança com os problemas das conexões HDMI não é mera coincidência!

Depois dos asiáticos se industrializarem, os manuais passaram a ser horríveis!

O manual de instruções deve ser a ponte entre o projetista e o usuário final. Ele não pode conter ambiguidades, não pode ser lacônico e, principalmente, não pode ser omisso.

Dos manuais que eu consultei, foram os de equipamentos científicos americanos os que mais favoravelmente me impressionaram. Em alguns deles, a gente encontrava uma verdadeira bíblia de conhecimentos, explicações repetitivas (que são absurdamente saudáveis para o iniciado no assunto) e detalhadas à exaustação.

Em contrapartida, a primeira vez que eu folheei um manual de um equipamento eletrônico japonês, a impressão deixada foi: a – o projetista ou a equipe que o desenvolveu não estavam nem aí para o usuário final; b – quem desenhou os circuitos achava que o usuário não precisa conhecer nem se envolver com o lado técnico do trabalho dele; c – a indústria concorda com a e b, e acha que resolve tudo no suporte, ao lidar com aqueles chatos que resolverem ligar para lá.

Acontece que frequentemente no suporte, a seguinte cadeia de eventos irá acontecer: 1 – você liga para ele, atende uma mocinha ou um rapaz, treinados pela fábrica; 2 – você faz uma pergunta técnica, usando os jargões técnicos, a pessoa que está no telefone contigo não entende nada, e pede para aguardar; 3 – o tempo pedido é para consultar o técnico da retaguarda: se este também não souber a resposta, ele irá consultar o engenheiro. Isto, se houver algum disponível naquele momento, porque, se não tiver, a pessoa que te atendeu volta ao telefone para pedir um prazo para dar a resposta por e-mail.

Se a gente levar em conta que o equipamento não foi projetado e muitas vezes nem adaptado no nosso país, a resposta para perguntas vai estar no suporte da matriz. Esta é a situação da maioria dos fabricantes de TV que atuam no Brasil e em outros países que, ao invés de criar, usam a tecnologia alheia. A exceção fica por conta de empresas que mantém os seus corpos de engenheiros estudando cada produto, antes do lançamento.

O problema maior do suporte técnico é que a pessoa que atua na linha de frente com o usuário precisa ser treinada, a ponto de, idealmente, estar no nível do seu técnico superior mais próximo, e este no nível do corpo de engenheiros.

Um manual se for bem feito, boa parte da orientação técnica seria evitada, ou pelo menos evitada no nível dos que fazem áudio e vídeo o seu hobby, ou são entusiastas do assunto. Com os manuais do jeito que são escritos, muita gente que eu conheço não os lê, ou até prefere jogá-los em alguma gaveta ou no lixo.

 A internet vem ao socorro, mas nem sempre ajuda!

A internet foi originalmente criada para trocas de informações e acesso a repositários e a grandes bancos de dados, influência das suas raízes acadêmicas.

Na década de 1990, os fóruns de discussão congregavam entusiastas em torno de assuntos específicos, e foi em um deles que eu encontrei os meus pares de áudio e vídeo de outros países. Na época, não havia influências comerciais a ponto de estragar a convivência e a participação de pessoas realmente envolvidas com o hobby, coisa que ocorreu com o tempo, e dispersou muita gente boa que eu conheci.

Certa feita, um usuário iniciou uma lista de discussão, porque havia ficado uma fera quando o receiver que ele acabara de instalar começou a piscar a mensagem “dialnorm +2 dB” ou algo semelhante no display, e ele não sabia do que se tratava. Mas, a raiva ficou por conta de um fato singular: o manual não tinha referência alguma para explicar o aparecimento da mensagem.

No início do Dolby Digital doméstico, os laboratórios Dolby iniciaram uma campanha on-line, para tornar disponível o máximo de informações possíveis a respeito dos seus decodificadores. E incluíram vários dos chamados “White papers”, que são documentações técnicas, com detalhes que normalmente não são escritos para usuários. Em um deles, que por acaso eu baixei e li, havia uma descrição das flags de programação usadas no codec AC-3, versão base do Dolby Digital como o conhecemos hoje. A flagdialnorm” estava lá, e eu só tive que apontar o documento para o usuário que iniciou o inquérito daquele tópico, até para mostrar que o receiver dele não estava errado ou com defeito.

A internet foi, e ainda é, a residência de pessoas cuja generosidade e espírito tem ajudado a divulgar a tecnologia que as empresas do ramo se omitiram estes anos todos.

Existe, porém, infelizmente, um lado ruim neste processo: o do usuário de fórum que dá palpite na forma de instruções com ar professoral, sem que os conselhos e orientações que são descritos por ele sequer passe perto do problema enfrentado por quem pede ajuda.

Nestes últimos dias, por coincidência, eu liguei o meu receiver e a TV no conector HDMI com a porta do retorno do canal de áudio (ARC – Audio Return Channel). Os dois se falaram, mas nada de áudio. Frustrante, não é não?

Indo à internet, eu vi pilhas de queixas idênticas. Em um destes pedidos de socorro, o ajudado recebe o conselho de um cidadão para retirar todos os cabos HDMI do receiver e comandar o reset do mesmo para os ajustes de fábrica. E não adiantou nada que o ajudado tenha declarado depois que o procedimento proposto não tinha resolvido o seu problema. Um conselho destes obriga o ajudado a re-calibrar o receiver de volta, ponto a ponto, ou seja, uma trabalheira danada, com um final inútil.

No meu caso, e sem ter tido a sorte de achar uma solução on-line à vista, eu resolvi fazer comigo o que eu costumo dizer aos outros: nunca resolva um problema com a cabeça cheia! No dia seguinte, revendo a configuração do receiver, eu descobri um conflito na atribuição da porta de comunicação usada, cujo default de fábrica era previamente fixado para o uso de um cabo ótico. Bastou modificar a porta para “nenhum conector” (a tela mostra ——–), que o retorno de áudio apareceu. Não só isto, mas TV e receiver se entendem tão bem, que quando eu ligo o receiver, os alto-falantes da TV se desligam automaticamente, e voltam a funcionar quando o receiver é desligado. O recurso é prontamente “desabilitável”, tanto na TV quanto no receiver. O usuário poderá achar inconveniente ver um deles comandado e ajustado automaticamente pelo outro, toda vez que os dois são ligados juntos. Mas, nada que impeça de se modificar qualquer coisa depois de ambos ligados.

Agora, se eu fosse seguir o conselho do sujeito que mandava ressetar o equipamento, eu voltaria ao default da fábrica, ocupando a porta de conexão da TV novamente com a mesma entrada ótica, e sem resolver o problema. Sem falar no tempo perdido para reconfigurar tudo outra vez.

 O fim da bagunça no áudio da televisão digital aberta

O mundo da DTV terrestre vinha sistematicamente se afastando do AC-3 (Dolby Digital), por razões de economia. Codecs alternativos, como o AAC (HE-AAC, no caso brasileiro), ou o Dolby Digital Plus, permitem a poupança de espaço de banda de transmissão, economia de bits (compressão do sinal de áudio), mas sem perder a qualidade desejada.

A adoção destes codecs deveria encontrar uma contrapartida na presença de decodificadores dentro dos equipamentos tradicionalmente usados nas instalações de home theater, mas raramente foi este o caso.

A solução foi implementar nas TVs este decodificador, contemplando de um lado o codec adotado pelo padrão de DTV usado no local da fabricação, e de outro a conversão para codecs usados nos decodificadores domésticos. Com isto, o sinal de áudio é transportado em ambiente digital, por cabo convencional ótico ou coaxial, ou por retorno HDMI na versão 1.4 (ARC).

A solução definitiva, entretanto, está vindo na linha 2012 das TVs fabricadas no país: trata-se de uma solução em chip único (“one chip solution”), capaz de identificar o codec transmitido, e converte-lo para outro codec desejado, se for o caso. A solução vem dos laboratórios Dolby, com o nome de Dolby MS10 Multistream Decoder.

Embutido neste chip, aparece um novo codec, o Dolby Pulse, uma união do Dolby Digital Plus com o HE-AAC versão 2. Isto é, em última análise, o que permite que o nosso ISDB-T possa transmitir em HE-AAC e as TVs com receptor embutido repassá-lo em Dolby Digital 5.1 legacy na saída digital.

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A fusão do núcleo (“core”) do HE-AAC com o Dolby Digital Plus só foi concretizada após a Dolby ter comprado a Coding Technologies, empresa que criou o AAC. A ideia seria aproveitar o melhor dos dois mundos:

O Dolby Digital Plus é um aperfeiçoamento do Dolby Digital (AC-3), capaz de transmitir melhor qualidade de áudio, podendo ir até 7.1 canais de áudio, porém na mesma faixa de compressão.

O HE-AAC é bem visto na engenharia de transmissão por ter a melhor eficiência na mesma faixa de compressão, podendo ser codificado e transmitido em um bitrate baixo, e sem perder a qualidade desejada.

O que o HE-AAC aparentemente não tem é um conjunto de metadados (informações contidas nos codecs) padrão, e para tal a Dolby desenvolveu a versão 2, e criando o Dolby Pulse, que pode ser usado opcionalmente para transmissão.

O novo chip decodifica Dolby Digital legacy (AC-3), Dolby Digital Plus, Dolby Pulse, AAC, AAC+ e HE-AAC versões 1 e 2. Todo e qualquer sinal de entrada, vinda da transmissão é convertida a Dolby Digital, com retro compatibilidade de metadados, e com todo o parque de decodificadores domésticos em existência.

O chip permite ainda mudar a saída de áudio digital para PCM 2.0, garantindo assim a compatibilidade com equipamentos externos desprovidos de decodificador Dolby Digital.

Qualquer um dos codecs mencionados acima pode ser decodificado dentro da TV e reproduzido pelos seus alto-falantes internos. Eu fiz um teste com Dolby Digital Plus, com resultados convincentes. No caso, sendo a fonte DD+ 5.1/7.1, a TV fez um downmixing para 2.0.

Eu creio que, salvo algum fato novo, esta talvez seja a solução que encerra um problema que dura anos. O resto fica por conta de quem transmite. [Webinsider]

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Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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2 respostas

  1. Olá, Rogério,

    Mais uma vez obrigado pelos seus amáveis comentários. Quisera eu ter sido o verdadeiro porta-voz da notícia, mas o fato é que o chipset da Dolby já existe no mercado faz algum tempo.

    Não sei por que, a presença dele nas TVs não é informação disseminada para os usuários, e eu não tenho acesso a nenhum fabricante ou eles a mim, para saber com exatidão que tipo de circuito eles usam. O que você vê é a presença do logotipo que eu mostrei na coluna dentro do manual, motivo pelo qual eu fiz questão de mostrá-lo, até para que o leitor saiba da existência dele.

    Quanto ao uso deste chip, ele está saindo em TVs LG e creio que Samsung. As outras eu ainda não pesquisei, e também não sei lhe dizer se sai em todos os modelos. Talvez seja o caso de você dar uma perguntada no suporte ou baixar o manual antes de contemplar uma nova compra.

  2. Mestre Paulo

    Prazer em renovar nosso contato.
    Brilhante e genial sua explanação.
    Agora sim a luz saiu do fim do túnel.
    Esta realmente será a noticia mais importante para o “ÁUDIO” Broadcasting aqui do Brasil e dos demais países que adotam nosso padrão ISDBT.
    Sinceramente jamais esperava ler esta descoberta inovadora, e o melhor de tudo, sendo você Paulo o porta voz desta notícia.
    Só para complementar você saberia informar quais marcas e modelos de TV já estão adotando este novo chip Dolby Digital Plus ?
    Um abraço e parabéns pela noticia.

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