Com Luciene Santos.
Em tempos de crise financeira, muitas empresas renomadas passaram a utilizar os games para tentar sair do vermelho. O MacDonald’s, uma das maiores redes de fast-food do mundo, decidiu usar técnicas gamification para atrair clientes arredios aos produtos que comercializa. Desde a onda de protestos contra produtos da marca que quase matou a galinha dos ovos de ouro, a rede da Dieta do Palhaço passou a usar o game Monopoly McDonald’s como tábua de salvação para evitar uma derrocada geral.
O marketing de gamificação da rede MacDonald’s já faz adeptos mundo a fora. A mesma técnica tem sido usada pelo pessoal do Facebook. Recentemente, a empresa comandada por Mark Zuckerberg, lançou o seu parque de diversões batizado de o ‘Fantástico Mundo da App Center do Facebook’. A ação de gamificar remete à ideia de games em todos os lugares. “São aplicações de mecânicas existentes em games em ambientes não-games” (Kimura, 2011).
Segundo Kimura, gamificação refere-se ao ato de transformar em jogos situações, aplicações, hábitos de consumo, ou qualquer outra coisa que não seja necessariamente um jogo. O conceito também pode ser estendido ao design de interatividade. No marketing, as ações gamificação podem favorecer melhor e mais profundamente a interação dos consumidores com os produtos.
Ações de marketing do MacDonalds.it
Na Europa, a rede MacDonald’s utiliza o tabuleiro de papel do game Monopoly para aumentar as vendas, principalmente na zona do Euro. Prevista para durar um mês, a promoção do MacDonalds.it prevê a distribuição de mais de 5 milhões e prêmios para engordar o ego de seus clientes. Os ganhadores podem levar para casa desde tables, smarphones, consoles de games, TV’s de led, motos, até carros. Os clientes podem ganhar ainda cursos de fotografia, combustível grátis, até cupons valendo lanche extra.
Assim como em outros países, como Cingapura e Inglaterra, a ação de marketing da rede de fast-food americana na Itália prevê três formas de premiação: prêmios instantâneos (raspadinha da embalagem do produto), através do jogo da série de propriedades (jogado com peças destacadas dos produtos) e um prêmio final especial (com inserção do código do produto da promoção no site). Na rede MacDonald’s jogar enquanto se come não é considerada nenhuma falta de educação.
O tabuleiro de jogo é disponibilizado nas bandejas dos restaurantes participantes. Se preferir, o cliente pode imprimi-lo diretamente do site. Não há nenhum custo para aquisição do tabuleiro. Para jogar o jogo Monopoly McDonald’s, basta comprar qualquer valor de refeição. As peças do jogo são emitidas na hora da compra da refeição e devem ser destacadas para revelar tanto as “propriedades do jogo”, quanto os prêmios instantâneos, como hambúrgueres, batatas fritas e descontos.
Ação de gamificação e NewsGames
Em 200 anos é a primeira vez que constatamos a união entre a razão pura e a razão lúdica em prol de solução de problemas cotidianos. Eis um dos pilares da Teoria dos Newsgames, segundo a qual, os próprios jogadores atuam em busca da cossolução de questões comuns que deram origem à trama do jogo. Em outras palavras, gamificação coloca em prática toda a engenharia cognitiva existente nos videogames para criar um engajamento lúdico na resolução de problemas do dia a dia.
Essa ludicidade é aplicada em ambientes fora de um contexto de lazer e entretenimento em si. A aplicação tem sido usada, de forma especial, em dispositivos móveis. A ideia é estimular a experiência de novos usuários no uso de aplicações lúdicas na vida diária. Um bom exemplo é o GPS com o qual podemos transitar por lugares desconhecidos sem ‘risco’ de nos perder. O Google Maps utiliza a mesma técnica. A ludicidade do aplicativo facilita a busca por localidades físicas e virtuais.
Como funcionam aplicações gamificação
O conceito pode ser aplicado a inúmeras situações, tais como em sistemas de pontuação, níveis, recompensas e missões para criar o engajamento na resolução de problemas. O Google News Badges é um sistema que premia com medalhas o usuário que lê mais notícias. Por exemplo, se você lê diversas notícias sobre política ou economia, ganha um badge (distintivos) batizado de stock market.
O sistema de bagdes foi criado para elevar o percentual de leitores de sites de notícias. A rede social Foursquare ficou conhecida por utilizar a mesma dinâmica dos badges, assim como o site Huffington Post – leitores que mais comentam ganham distintivos especiais. Mas como aplicar tais técnicas no mundo real e, ao mesmo tempo, criar um ambiente de sinergia entre cidadãos, empresas e governos? Então, vamos usar a cidade de Treviso (TV) como laboratório.
Situada a Nordeste da Itália, a Menina dos Olhos do Veneto (como é carinhosamente chamada) conta com uma excelente coleta seletiva de lixo, mas não possui um sistema de pontuação e premiação dos moradores. Para valorizar a ação cidadã bastaria criar um ranking de pontuação e promover uma redução gradual dos valores cobrados pela taxa de coleta. O sistema poderia funcionar por regiões e contribuintes individualmente.
Em suma, a gamificação é uma ferramenta que pode atuar visceralmente sobre os nossos instintos, criando novas motivações para que as pessoas possam mudar seus hábitos e comportamentos de maneira saudável e muito mais divertida. Futuramente, partindo desse princípio, podemos pensar no fim da velha e famigerada cultura da multa. Ficaria para trás o modelo pautado pela punição por infrações de trânsito, falta de pagamento de impostos, ou inadimplência no comércio.
O lado B da gamificação
Se por um lado, a gamificação pode se tornar uma estrada que nos levará a um futuro mais promissor, de outro ela pode nos levar para a infantilização irreparável da internet. De qualquer modo, a ação gamification se desloca da esfera de interesse pessoal para a esfera de interesse do mercado de produtos. Mas não é simplesmente uma questão de dar aos clientes pontos ou distintivos para completar uma série de atividades.
Quando aplicada adequadamente, a gamificação alimenta o desejo humano de participação, de estar no mundo e, em última análise, o sentimento de pertencimento. Contudo, a maioria dos programas de recompensa, como milhas aéreas, são exemplos de gamificação atroz. Já o sistema de pontuação do site Weight Watchers (mantido por vigilantes do peso) e das redes sociais LinkedIn (compartilha conhecimento profissional) e Foursquare (compartilha lugares com amigos) são exemplos mais positivos.
Existem outras técnicas simples de gamification voltadas para as pessoas que compartilham experiências em plataformas sociais. Dentro de uma rede social, as pessoas buscam se relacionar, muitas vezes, de forma aleatória, sem se dar conta disso. Explico: quando existe algo em comum, nos aproximamos, Quando não, nos afastamos, numa sinfonia de compartilhamento de delícias e desafios de viver na superfície.
No final das contas, é bom ficar claro que tudo isso não é nenhum jogo. Trata-se de transformar ações cotidianas comuns em algo prazeroso. Tudo que nos últimos tempos parece ter desaparecido do nosso cotidiano. Com muito ou pouco dinheiro, o nosso modo de vida se tornou miserável. Como imaginar viver com a possibilidade de a crise do Euro durar até 2018? Melhor pensar como Ian Bogost: – “Em breve, toda sociedade será um tabuleiro onde todos serão jogadores.” [Webinsider]
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Leia também:
- Quer obter envolvimento? Transforme em game
- A gamificação da empresa
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Geraldo Seabra
Geraldo Seabra, (@newsgames) jornalista e professor, mestre em estudos midiáticos e tecnologia, e especialista em informação visual e em games como informação e notícia. É editor e produtor do Blog dos NewsGames.