Jogadores não são ingênuos e estão mais experientes

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Com Luciene Santos.

“Por que fazer dinheiro para resolver um problema quando você pode fazer muito mais, tornando as coisas bem piores.” A citação sobre consultoria chegou às mãos de Tadhg Kelly, um famoso articulista do blog Tech Crunch e designer de jogos com 20 anos de experiência. No fundo, no fundo, a citação faz algum sentido ainda mais quando o assunto gira em torno de gamers, games e gamification. Do ponto de vista do objetivo (meta do jogo), os games tradicionais são brinquedinhos bem simples. Não acham?

O que separa o primeiro nível do último é apenas um grande labirinto (complicações) maliciosamente criado para que se pense que jogos são coisas complicadas. No marketing é interessante tornar as coisas mais complicadas. Pois, como observa Kelly, “complicação é sedutora.” A série House of Lies (Casa de Mentiras) é uma boa metáfora para entender o novelo criado pelas empresas para tentar insuflar complexidades onde não existem. A série narra a história de uma empresa de consultoria comandada pelo inescrupuloso Marty Kaan.

Na figura de Don Cheadle, o manager é capaz de fazer qualquer coisa para agradar seus clientes, nem que para isso tenha de manipular, mentir, ludibriar. Nessa visão oportunista do marketing desenvolvem-se soluções complexas para problemas simples. Criam-se as chamadas ‘tetas’ que alimentam a maioria dos ‘negócios de apelo popular’, levando as pessoas a pensar que não poderiam mais viver sem determinados produtos ou serviços. Ao invés de simplesmente usá-los passam a ser reféns!

Fazedores versus intelectuais

Para Kelly, “clientes apreciam mais fazedores que intelectuais, porque lhes oferecem ações reais”. Mas seriam os intelectuais, destaca Kelly, que perpetuam o mito de que os jogos são coisas difíceis e que designers de games precisam de algum conhecimento profundo para ser levado a sério. Em nenhum lugar isso é mais verdadeiro do que no campo dos games e da gamification, no qual designers, consultores e teóricos escrevem textos com um ar intelectualizado sobre o significado complexo de coisas simples.

Ao buscar ilustrar o universo gamification, Kelly simplifica

“Um site não é um site, é uma oportunidade de se envolver com o usuário através de uma viagem. A recompensa não é uma recompensa, é uma forma de manter uma conversa complexa com seus usuários. Um nível não é um nível, é um símbolo de status dentro de uma comunidade que se desenvolve em uma relação forte com a sua marca.”

Portanto,  gamificação se resume a uma dessas três coisas simples: completar, validar e premiar. Pode parecer que gamifying seja a soma de quantidades diferentes (níveis, emblemas, barras de progresso) de ações a fim de criar ares de mistério em torno do serviço ou produto gamificado. Também pode parecer que os usuários são ovelhas que seguem sistemas gamification criados com mais importância do que eles realmente tem. Os usuários não são ingênuos.

A verdade é que, com o passar do tempo, a maioria dos consumidores tende a se afastar de coisas que os levam à idiotização. Conquistas na vida não podem se reduzir a coisas sem nenhuma graça. No final das contas, as realizações na vida podem se tornar coisas chatas, a menos que elas estejam envoltas em uma atmosfera inteligente e divertida. Prêmios, pódios ou beijos de namorada não significam nada se a pessoa desejada não estiver presente.

Qual é o objetivo do jogo?

No tabuleiro de jogo, os jogadores tendem a olhar só o querem ver e fazer, não o que acontece dentro de sistemas complicados inventados apenas para iludi-los. Os usuários precisam ser capazes de ver o benefício da ação de jogar e gamificar. Precisam tocá-lo e ter a mesma sensação como os outros estão usando. Assim como nos jogos de ação, a recompensa precisa ser tangível. Se o sistema não expressa o que se pode ganhar imediatamente, não significa nada.

Então, qual é o objetivo de um dos jogos mais populares da história da indústria dos games? A trama do World of Warcraft se desenvolve em um universo fictício onde o objetivo principal é a luta pela sobrevivência (simples assim) entre humanos e a raça Orc. Como ações replicadas em estratégias gamification, o jogo oferece recompensas em forma de medalhas (cupons, prêmios, emblemas) ao jogador por passar de nível. Ainda são oferecidos bônus em forma de experiência (pontos de experiência).

No maior parte da história, o mapa do jogo se desenvolve em meio a labirintos (complicações sedutoras) de lutas, guerras, construção de bases militares e formação de exércitos, no mesmo estilo do game Age of Empires. Então, voltamos à discussão de que não é preciso raciocinar muito para entender a falsa complexidade da grande ‘jogada’ que existe por trás das tramas de jogos e ações gamification. Mesmo porque, aquilo mais significativo na vidas das pessoas está divorciado da recompensa financeira.

Recompensas versus motivações

É verdade que o universo dos games e da gamificação abre uma ótima discussão sobre a importância de recompensas versus motivações. Mas é bobagem pensar em esquemas de cupons, prêmios e emblemas, totalmente fora de contexto. Ou pensar em games baseados em notícias ou na criação de um aplicativo de apelo popular sem nenhum envolvimento pessoal. Mesmo assim nenhum serviço ou produto gamificado será mais importante que o trabalho da vida de alguém.

Claro, não estamos falando dos chamados heavy plays (jogadores compulsivos), tampouco dos outliers (pessoas excêntricas). No dois casos são pessoas que passam pela vida ao largo de seu verdadeiro sabor. Os outliers adoram acumular milhagens em casa apenas para quantificar o poder dos números. Um tipo de pessoa, como George Cloney em “Amor sem Escalas (2009), onde o seu personagem não pensava no prazer de viajar. Apenas nos números que deslizavam sobre painéis de partidas e chegadas.

Quando atingiu o tão desejado número de milhagens recebeu das mãos do próprio comandante o cartão vip metalizado. Neste momento, o prazer da realização não chegou nem perto do instante em que o filho abraça a mãe no sagão aeroporto após 10 anos separados pelo destino. Na maioria das vezes, os esforços gamifying das empresas nunca vão chegar a lugar nenhum próximo ao nível de significância de histórias vividas por pessoas normais.

Tais iniciativas serão, em grande parte, motivadas apenas pela quantidade externas (cupons, prêmios, etc.) que tem a oferecer aos usuários. Então, as empresas deveriam parar de tentar enganar seus clientes com presentinhos desinteressantes e descartáveis. Pois, “a maioria das motivações do tempo não são difíceis de entender”, filosofa Tadhg Kelly.

Gamification para idiotas

Reddit é um gamified da seguinte forma: os usuários da rede social coletam karma pelo teor da postagem, e seus seguidores votam positivamente ou não, levando ao bloqueio ocasional de emblemas do troféu. O Twitter gamified funciona assim: todo mundo gosta de saber quem tem mais seguidores hoje do que ontem. Já a única regra escrita no game Pong é: evite a bola faltando para conseguir uma pontuação mais elevada. Em outras palavras, alguns jogos e ações gamification nos levam a pensar que temos que aprender a ser idiotas.

Em muitos casos, recompensas, emblemas, conquistas, níveis e pontos de experiência não nos leva a lugar nenhum. Como diz Kelly, sempre desconfie dos ludemes – regras, convenções ou termos comumente usadas na maioria dos jogos e ações gamification e plagiados como vírus um para o outro. Muitas vezes, gamifiers querem alcançar níveis, emblemas, pontos de experiência e realizações, porque essas são ludemes com as quais os usuários já estão familiarizados como jogadores de games. Mas, os clientes muitas vezes nem são jogadores.

Mas acabam sendo atraídos pela premissa gamification de que tais ludemes usadas freqüentemente assumem alguma universalidade de verdade absoluta. Ledo engano! Em vez disso, a familiaridade alimenta o desprezo. Lembrando que os usuários não são tão ingênuos pois, provavelmente, utilizam cada sistema para aprender com o uso de vários serviços gamificados. Na prática notam que a maioria dessas ludemes são utilizadas como simples íscas para seduzir idiotas.

Evite anátemas em projetos

No final do dia, os tipos mais bem sucedidos de gamification são aqueles bem simples, que trabalham apenas um tipo de ação que leva a um único tipo de resultado. Afinal, a complexidade é um anátema, como tentar explicar o excesso de um sistema, ou esperando muito mais dele que pode nos oferecer. Um sistema de jogo inteligente busca reduzir objetivos (metas) em favor das vezes em que os jogadores podem influenciá-lo, somado a um tipo particular de emoção associada a essa interação.

Então, por que é tão difícil para a maioria dos serviços chegarem a esse ponto tão simples? Prestadores de serviço e gamifiers tendem a compartilhar um viés positivo em torno da velha história do “cliente nobre”, um tipo que gosta de se envolver com serviços e marcas e encontrar um significado nissa bajulação. Ambos parecem acreditar que, de alguma forma, os jogos tornam as coisas melhores. Acham humilhante aceitar que o único objetivo da gamification é vender mais ou atrair mais cliques.

E, na maioria das vezes, a melhor maneira de fazer isso é tão simples como apertar um botão de comprar. A verdade é que as pessoas se sentem menos que as outras quando pensam sem rodeios. Em geral, o modelo gamification atual se cobre de confetes em forma de níveis e emblemas, como se fosse uma árvore de Natal de cabeça para baixo. Explora a estratégia do labirinto (complicação sedutora) para falar sobre viagens (simples assim), experiências dos usuários e dos efeitos da psicologia do jogo. É difícil aceitar que toda essa conversa mole é, muitas vezes, fontes de ilusão.

Desta forma, a razão pela qual, muitas vezes, ações gamification não envolvem dinheiro, esconde o fato de que há muito mais a ser ‘feito’ para tornar as coisas ainda mais piores, porque as pessoas envolvidas não querem realmente consertá-las. Querem apenas nos enrolar com modernos contos de fadas. Não por acaso tanto o visual quanto o objetivo da maioria dos joguinhos do Facebook é levar o jogador para o campo, bem distante da sua realidade cotidiana.

Além do mais, a maioria dos jogos comerciais famosos busca alienar o jogador com narrativas de estratégia e  aventura que se desenvolvem no passado, ou no futuro. Jamais acontecem no presente! Então, se a uma empresa quer apenas dar presentinhos a seus clientes, o processo é muito fácil dentro do velho modelo “do quanto mais complicado melhor.” A parte mais difícil é a aceitação. O nosso mundo funciona simples assim! [Webinsider]

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Geraldo Seabra, (@newsgames) jornalista e professor, mestre em estudos midiáticos e tecnologia, e especialista em informação visual e em games como informação e notícia. É editor e produtor do Blog dos NewsGames.

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