A introdução da banda larga neste país foi penosa. Do acesso discado à fibra ótica, o usuário sempre foi mal informado.
Eu fui do tempo da Internet a texto, muito similar a redes anteriores, algumas delas, como a própria Internet, usadas pelas redes acadêmicas. Em 1994, o meu irmão me fala que o NCE (UFRJ) havia aberto o acesso discado para a Internet, então eu fui lá e me inscrevi.
Recebi um libreto com comandos, palavras do tipo Telnet, FTP, Gopher, etc., seguidos de uma breve explicação sobre eles. O usuário se sentava na frente de um terminal, onde na linha do prompt o comando era digitado e executado. Vários desses comandos, aliás, ainda estão em uso por aí.
Mas, a Internet evoluiu, com a introdução ao mundo acadêmico da World Wide Web, criada em 1989, pelo cientista Tim Berners-Lee, quando ele trabalha no centro de pesquisa nuclear, chamado de CERN. O seu objetivo foi rodar links com o uso de hipertexto, antes inventado e desenvolvido por Doug Engelbart. O acesso aos documentos iria propiciar a visualização não somente de textos, mas de imagens e vídeo. Nascia ali, então, a Web 2.0. E com ela, vários novos benefícios de programação.
O acesso remoto da academia à World Wide Web não foi rápido, ele ficou restrito a uma meia dúzia de privilegiados. O acesso remoto do NCE, por exemplo, era feito via RENPAC, da Embratel, com um backbone arcaico. Quando um dia eu encontrei com um pessoal da Embratel dentro de uma feira de informática e disse a eles que eu usava a RENPAC eles riram, porque achavam que a rede nem funcionava mais! Foi mais ou menos nesta época que apareceu o apelido “internauta da madrugada”, porque era o único momento do dia no qual a conexão discada não se interrompia subitamente.
Tempos depois, eu tive que implorar (literalmente) o acesso à Web 2.0 a uma pessoa do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), que naquela época ocupava o campus da UFRJ na Praia Vermelha. Só assim, eu consegui ver e pude mostrar aos meus filhos o que era a Internet com imagens. O Jornal do Brasil foi o primeiro de todos a ter uma página na World Wide Web e era, na época, emocionante poder ver as notícias com imagens!
O acesso discado e o início da banda larga
A saída do domínio acadêmico nas conexões à Internet foi recheada de protestos políticos. Eu estive em uma reunião que discutia esse assunto, e lá apareceram funcionários da Embratel, que eram contra a passagem do controle da Internet para o público. Mas, o governo de então estava determinado a mudar o status acadêmico e abrir a rede para qualquer um.
Quem teve acesso à Internet por modem analógico discado sabe a tortura que aquilo foi. A Telemar (atual Oi) começou a fornecer um sistema ISDN, chamado por eles de DVI. Para contratar, era preciso ter duas linhas telefônicas em casa, para atingir uma conexão de 128 Kbps. Se uma das linhas tocasse e o usuário atendesse, a conexão caia para 64 Kbps. Claro que não deu certo!
Depois, veio o DSL, fornecido pela própria Telemar, que havia abandonado o DVI. Mas já no início, as distorções começaram a crepitar. O usuário tinha que ter o modem em casa, mas o acesso era indireto, pagando-se um provedor por fora, caso contrário não se poderia fazer logon na rede.
Criou-se, creio que nessa época, a figura do ISP (Internet Service Provider ou Provedor de Acesso a Internet), que, no nosso caso, era a Telemar e de seus associados limitados ao logon na rede. A turma da Telemar escondia o jogo, e o usuário teve que se virar, se quisesse melhorar o acesso dentro de casa. Eles obrigavam o acesso por dial-up em um computador, ou seja, se tivesse mais de um usuário em casa, pelo menos um dos computadores teria que fazer logon daquela maneira, um absurdo.
A Telemar, e depois a Oi, dizia na cara do cliente que eles não davam apoio a rede doméstica. Eu, meu irmão e amigos começamos a lutar contra isso. Eu cheguei a quebrar a cara com informações que vazaram pela rede, e que nos permitiriam rodar um modem Dlink com uma configuração de roteamento. Quando isso foi feito, todo mundo em casa poderia fazer uso de uma rede local, e dar adeus ao inconveniente acesso discado do sistema operacional.
Essa situação nunca mudou até então. Quando aparecia algum problema na conexão do usuário e o técnico da operadora (Telemar e depois Oi) entrava em casa e se deparava com uma rede local, ele desmanchava tudo e reinstalava o acesso por dial-up. O meu irmão passou por isso duas vezes, porque ele não estava em casa quando o técnico apareceu, e ficou furioso, com justificada razão.
Foi somente com o aparecimento da concorrência que o status quo mudou. A Oi, herdeira da Telemar, cobrava caro, o serviço era claudicante, e limitava a velocidade de conexão. Eu mesmo fiquei anos com 5 Mbps de conexão, a despeito do meu plano ter me dado direito a 10 Mbps. A Oi dizia que não tinha espaço no armário e ponto final.
Naquela época, a GVT (hoje Vivo) cabeou a minha rua. Com ela não era necessário pagar por fora para se logar, e eles davam o modem ADSL de graça. Como eu fui o primeiro da rua a instalar a conexão, o engenheiro veio pessoalmente na minha casa e constatou que eu já tinha rede local, mas, mesmo assim, me deu todas as instruções de conexão e me ofereceu um cartão, caso eu precisasse.
Quanto a Oi, eles continuaram mandando boleto para eu pagar, apesar do contrato desfeito. Eu ligava para lá e só ouvia mentiras, os boletos continuavam chegando, e aí só me restou ir ao Procon, onde lá eu achei uma plantonista deles, super mal humorada, que ligou para alguém e resolveu o caso em poucos minutos.
Mas a concorrência suja não ficou por aí. Técnicos da GVT viram gente da Oi cortar os cabos da empresa na rua. Nada muito diferente dos atuais roubos de cabos que o nosso bairro enfrenta até hoje. No meu prédio, a entrada de cabos foi concretada (é isso mesmo!), e isso fez a GVT mandar pedreiros para desobstruir tudo.
De volta para o futuro
Quando a gente se lembra de tudo isso, nem acredita que tenha acontecido. O Brasil levou anos empurrando com a barriga a conexão com a Internet e os problemas crônicos de um backbone defasado. Foi preciso que a tecnologia mudasse radicalmente e a concorrência entre provedores aumentasse, para que os acessos atuais chegassem a termo.
Quando eu passei a usar fibra ótica, e isso foi relativamente recente, eu já não tinha mais noção da facilidade de configuração que as operadoras tem para mudar tudo, a qualquer momento. Na prática, significa que uma vez instalado um determinado modem, fornecido pela operadora para a tecnologia e configuração dela, a sua troca só será feita por algum motivo técnico ou defeito. O resto é resolvido on-line, e passa transparente ao usuário.
Isto não quer dizer que o que se aprendeu antes ficou para trás. A diferença entre o antigo e o atual é que os roteadores passaram a operar com configurações inteligentes. Assim, até um usuário não experimentado pode configurar tudo apenas seguindo s instruções na tela. Claro que não seria possível entrar em configurações avançadas sem um mínimo de conhecimento sobre o assunto, mas elas não são radicalmente indispensáveis no dia a dia do usuário leigo.
Eu noto com clareza que ainda sobra muita sopa de letrinhas na tecnologia de conexão atual sem uma explicação convincente, e quem, como eu, já está cansado de guerra, só vai fuçar o assunto de novo debaixo de um motivo muito forte!
A minha última experiência me levou a este estado de espírito. Há mais de um ano eu sou usuário da TIM Ultra Fibra, que eu acho excelente e com bom apoio técnico. Mas, de vez em quando a turma da TIM pisa na bola, nada de grave, mas não deixa de ser alguma coisa previamente contornável.
Eu comecei contratando 250 Mbps, que passou logo depois para 300 Mbps, mas a TIM me deu uma conexão de cortesia para 500 Mbps. Disseram para eu esperar o aviso da mudança, mas este aviso não chegou.
Intuitivamente, eu fiz o clássico hard reset no modem, isto é, desliguei da tomada, aguardei uns 10 segundos e religuei o equipamento. O modem então ressincronizou para 500 Mbps, problema resolvido. Se alguém do suporte tivesse me avisado que o procedimento era necessário, eu não precisaria recorrer aos alfarrábios…
Atualmente, a TIM me oferece um plano de 1 Gbps com custo reduzido por um ano. Para quem já passou por modem analógico discado ou pelo início tumultuado da banda larga, parece ficção científica. Mas, ela não vem por acaso, porque fora do país isso já virou rotina!
Ora, existe um princípio filosófico de vida que eu aprendi com a minha mãe, que diz que sempre existe espaço para se aprender algo novo, e aqui não deu outra!
Se de alguma coisa eu já tinha conhecimento, era o calibre e o isolamento de cabos Ethernet. Eles são categorizados de acordo com esses parâmetros, embora de fabricante para fabricante não exista um cabo igual ao outro, exceto pela pinagem. Historicamente, os cabos são classificados, de acordo com a sua categoria, abreviada de Cat:
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A melhor maneira de saber qual a velocidade real de conexão é cabear desde o modem da operadora até o computador em uso. Na minha rede, eu uso um cabo Cat-5e (e = Enhanced), fornecido pela TP-Link, entre o modem e o roteador deles, e a seguir, saindo da porta de 1 Gbps do roteador um cabo Cat-7 até o meu computador, que faz parte da minha pequena estação de trabalho (SOHO):
Antes da conexão atual de 1 Gbps ser feita o suporte da TIM disse que um técnico viria na minha casa trocar o modem, mas não apareceu ninguém. Após passados os dias informados para a mudança, eu liguei para a operadora e o suporte técnico se disse surpreso da velocidade não ter sido trocada, o que ele, técnico, fez de imediato e com o mesmo modem de antes, que não precisou ser mudado.
A única coisa que me cabia era ressincronizar o modem, através do velho e bom hard reset. Essas pisadas na bola são fruto de empresas muito grandes, quando um setor não se entende com o outro. Neste caso, alguém da TIM teria tentado entrar em contato comigo para “confirmar” os meus dados, mas para quê, se eu sou cliente deles há muitos anos?
Quando o modem trabalhava com 500 Mbps de sincronismo, a conexão passava dos 540 Mbps. Mas, a conexão com sincronismo para 1 Gbps tem perdas incontornáveis. Não há nada de errado quando se verifica que 1 Gbps não será atingido, o que eu constatei de imediato:
Segundo vários técnicos de rede a extensão da faixa estimada para conexão a 1 Gbps é de 949.28 Mbps, mas este valor é teórico. Se alguém resolver mudar de ferramenta de medição vai achar valores completamente diferentes, e não há consenso, que eu saiba, de qual é a ferramenta ideal.
Na ferramenta propriamente dita, é possível que a conexão de referência (na figura acima, o site EdgeUno) dê um valor diferente em cada teste, e se a referência mudar para outro servidor, idem!
Entretanto, é possível estimar se a conexão está dentro dos prometidos 1 Gbps: a conexão por fibra ótica fornece habitualmente a metade da velocidade quando as informações saem do computador de origem (upload), assim basta multiplicar o valor medido do upload por 2, no caso acima 536.63 x 2 = 1073.26 Mbps.
Na parte que cabe ao usuário final, o mais importante é ter certeza de que a rede cabeada é toda capaz de aceitar sinal de 1 Gbps. Cabos Cat-5e para a frente são teoricamente garantidos para atingir a passagem de sinal de 1 Gbps, sendo que a partir de Cat-6, a tolerância chega a 10 Gbps. É muito importante usar somente cabos de alta qualidade, com bom isolamento!
Eu fiz um teste banal, troquei o cabo Cat-5e da TP-Link por um cabo Cat-6, que tem uma blindagem superior, mas nada mudou, provando assim que o Cat-5e deu conta do recado como deveria.
Usuários que se queixam das operadoras (da TIM então eu já várias vezes) parecem não estabelecer as condições de instalação necessárias à rede pretendida, desde cabos Ethernet até a configuração da rede local sem fio no roteador instalado.
Outro fator que muita gente se esquece ou simplesmente não sabe é o da rota de sinal. Vejam abaixo um exemplo de como uma solicitação na ponta do usuário chega ao seu destino. No prompt do PowerShell do Windows digita-se o comando tracert (“trace route”), seguido do destino do sinal que parte do computador do usuário:
PS C:\Users\Paulo Roberto Elias> tracert www.yahoo.com
Tracing route to new-fp-shed.wg1.b.yahoo.com [74.6.143.25]
over a maximum of 30 hops:
1 <1 ms <1 ms <1 ms 192.168.0.1
2 1 ms 1 ms <1 ms MyRouter [192.168.1.1]
3 8 ms 9 ms 7 ms 186-230-220-89.ded.intelignet.com.br [186.230.220.89]
4 4 ms 4 ms 4 ms 10.40.48.56
5 3 ms 4 ms 4 ms 10.221.252.50
6 4 ms 2 ms 2 ms 10.223.238.244
7 4 ms 2 ms 4 ms ae10.rio5.rio.seabone.net [213.144.160.100]
8 136 ms 135 ms 135 ms 195.22.206.0
9 135 ms 135 ms 135 ms g2-12-bas2.dce.yahoo.com [206.126.236.2]
10 138 ms 138 ms 138 ms ae-13.pat1.nyc.yahoo.com [209.191.64.3]
11 153 ms 151 ms 150 ms ae-0.pat2.bfw.yahoo.com [209.191.64.155]
12 150 ms 149 ms 149 ms et-18-1-0.msr2.bf1.yahoo.com [74.6.227.49]
13 149 ms 145 ms 146 ms et-19-0-0.clr1-a-gdc.bf2.yahoo.com [74.6.122.41]
14 149 ms 149 ms 148 ms lo0.fab3-1-gdc.bf2.yahoo.com [74.6.123.242]
15 149 ms 148 ms 148 ms usw2-1-lbb.bf2.yahoo.com [74.6.98.139]
16 150 ms 150 ms 149 ms media-router-fp73.prod.media.vip.bf1.yahoo.com [74.6.143.25]
Trace complete.
N.B.: 192.168.0.1 é o endereço IP da porta do roteador que o computador enxerga. Mas, o gateway, que é a porta de saída para a Internet é 192.168.1.1, que é o endereço IP do modem da TIM, ao qual o roteador está conectado. Assim o pedido de conexão passa primeiro pelo adaptador usado (Intel i211, instalado na placa-mãe), através da porta 192.168.0.1 do roteador no qual o cabo Cat-7 está conectado. A seguir, o sinal vai para a WAN (Internet) via modem da Oi, porta 192.168.1.1, endereço final.
Isto na prática significa que cada conexão estabelecida por solicitação do usuário segue um caminho tortuoso entre os vários nós da rede, e isso toma tempo. Se o usuário usa um navegador capaz de armazenar buffers dessas ligações é possível ter um segundo acesso mais rápido.
Os downloads, por seu turno, variam de provedor para provedor. Se o usuário der sorte, a conexão dele acha uma porta do servidor onde o arquivo está com poucas restrições. Mas, notem que não é incomum um servidor de arquivos ser lento ou colocar restrições que impeçam um download mais rápido.
Assim, deste modo, tanto faz 250, 500 Mbps ou 1 Gbps, que o download ou o acesso a uma página qualquer será lento mesmo. E não é só isso que está em jogo. A gente vê todo dia pilhas de anúncios e armadilhas nas páginas que a gente visita. Até mesmo os bloqueadores de anúncio, que são instalados nas extensões dos navegadores, têm as suas limitações, ou, em alguns sites, até impedindo o acesso às páginas.
A meu ver, o usuário precisa e deve se proteger, não só dos anúncios, mas dos sites que contém material suspeito. A proteção mais corriqueira começa no roteador, quando ele dispõe de um antivírus interno e firewall, passa pelos bancos de dados do navegador e termina no antivírus e firewall do sistema operacional. Ignorar avisos e/ou entrar em sites perigosos pode acabar em uma novela triste, às vezes difíceis de se livrar dela! Outrolado_
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.