O disco “Duke Ellington, north of the border” mostra como Duke Ellington transcendeu as fronteiras do Jazz.
Duke Ellington, um dos maiores símbolos da música de Jazz, junto com Louis Armstrong e outros, esteve no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, em novembro de 1971, e eu estava lá com um amigo para conferir. Estávamos ansiosos para ver no palco o sax tenor de Paul Gonsalves. E nos surpreendeu vê-lo tocando todo curvado, com um som magistral e solos idem.
Aconteceu que, na década de 1960, o pai de um amigo de infância tinha resolvido nos levar eu e ele para visitar a Tapecar. Ele havia se aposentado da Companhia Industrial de Discos (CID) e convidado para trabalhar lá. O prédio ficava próximo à Avenida Brasil. O maquinário, super moderno, duplicava fitas magnéticas, nos formatos de carretel aberto, cartucho (daí o nome da fábrica) e cassete.
Nos foi dado um brinde, com direito à escolha. Esse meu amigo escolheu uma fita cassete, e eu uma fita de rolo. A Tapecar tinha acabado de receber a master da Decca com a gravação de Duke Ellington e a orquestra canadense de Ron Collier, por mim um artista que parecia importante, mas desconhecido. A duplicação foi feita na minha frente, e com ela eu aprendi como se fabricava uma fita de rolo pré-gravada.
A gravação foi intitulada “North of the border in Canada”, ou, como no elepê original da Decca, com o título “The Ron Collier Orchestra with Duke Ellington”. Para quem, como eu, já estava habituado a ouvir Jazz de todos os formatos, esta gravação transcendeu tudo, com arranjos contemporâneos de uma música super moderna, eu diria, quase erudita. Duke Ellington, neste caso, tocou apenas como pianista, e como tocou!
Durante anos, eu não vi esta gravação em outro formato, a não ser uma fita de rolo. Na década de 1970, porém, a MPS alemã remixou a master original, com um som superior ao da minha fita, e a lançou no elepê Collages, trazido para o Brasil pela BASF. A prensagem, de excelente padrão, foi feita na RCA. Alguns discos desta série chegaram às lojas nas versões importadas, mas a baixo custo. Os discos vinham selados, como prova de garantia talvez, da sua qualidade.
No início da década, eu dei a sorte de achar a gravação, editada e digitalizada, sob licença da MPS, pelo selo Folio. Na época, eu me correspondi com o dono e ele me garantiu a procedência da remixagem da MPS, feita em 1973. O título da MPS/BASF foi mantido.
Eu transcrevi uma das faixas, para quem quiser ouvir, com o título Collage #3, que simboliza bem os arranjos e o estilo de Jazz contido no disco:
Depois da Folio, ainda foi lançado outro CD, desta vez pelo selo canadense Attic, mantendo o título do disco original. Foi acrescentada uma entrevista com Duke Ellington. A mixagem deste disco é provável ter vinda da Decca, mas eu não tenho o disco e não achei referências sobre isso.
Em qualquer hipótese, eu me arrisco a dizer que qualquer fã de Duke Ellington ou do Jazz com traços de erudição, deve ter este disco em sua coleção. Mas, neste caso, boa sorte a quem for procura-la. Exceto algumas faixas isoladas nos canais do YouTube, eu até agora não vi nos meus streamings habituais.
Ainda sobre Duke Ellington, ele gravou várias suítes antes disso, o que prova sem dúvida alguma ser ele um compositor que transcendeu as fronteiras do Jazz. Todas essas suítes são composições sofisticadas, que devem ser ouvidas com atenção. [Webinsider]
Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.