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O humor judeu no cinema americano

Na década de 1960, o humor judeu, em roteiros de filmes americanos, atingiu o ápice. Durante muitos anos Hollywood produziu filmes antológicos. Com o tempo, a fórmula e o formato se desgastaram, deixando para trás o que de melhor foi feito em comédia no cinema.

 

Quando Primavera Para Hitler (The Producers) foi lançado, se não me engano, no Cine Paissandú, templo do cinema de arte do Rio de Janeiro, os críticos jornalistas o classificaram de “o clássico humor judeu norte-americano”. Isso foi em torno de 1968, na época eu não fazia a mínima ideia do que se tratava. Era uma produção independente e teve ampla repercussão junto ao público. O filme está hoje restaurado e preservado em 4K:

Eu ainda estava no colégio, quando um professor de História comentou a obra de Woody Allen, e fez menção ao genial O Dorminhoco (Sleeper). Ele citou a cena em que o ambiente doméstico do personagem foi recriado, para que o dorminhoco lembrasse de onde ele veio. Na cena, Allen descreve o típico ambiente dos lares judeus e os traumas que seus descendentes sofreram.

O meu professor estava certo. Em vários dos seus filmes Woody Allen encarna um personagem neurótico, às vezes histérico, e cheio de traumas. Da mesma forma como Gene Wilder faz o papel de um homem introvertido com surtos histéricos, em The Producers.

Essencialmente, os traumas são também incluídos nos roteiros por outras formas. Em ambos os filmes acima citados, são feitas menções diretas e subjacentes ao regime nazista:

Em Sleeper, o personagem acha um Volkswagen (Fusca) com mais de 200 anos de idade e ainda funcionando. O tal líder político sofrera um atentado, mas iria ser reconstruído a partir de um nariz sobrevivente, uma clara alusão ao formato do nariz de Hitler. Em The Producers, a menção a Hitler é direta e na base do deboche.

A chuva de autocríticas

Além do deboche e sarcasmo do humor judeu aparecem também autocríticas e/ou críticas ao comportamento social  judaico.

Em The Producers, Max Bialystock é um empresário produtor falido de peças de teatro, mas louco para ficar rico de novo. Ele recorre a todo tipo de métodos desonestos, para tapear mulheres carentes ou indefesas, e arrancar delas o dinheiro para continuar produzindo. Mas, as peças não dão certo, e o seu contador descobre acidentalmente que ele lucrava com os fracassos, daí todo o resto da comédia, uma trama brilhante, que dá graça àquela sucessão de erros.

Os cineastas, além da paródia e do sarcasmo, condenam, visualmente, a ganância desmedida, talvez, e muito provavelmente, em memória dos grandes magnatas judeus do cinema, aqueles que criaram o studio system, e que tripudiaram e exploraram atores e atrizes. No último escândalo da Miramax, por exemplo, este tipo de ambição ficou muito claro.

Da genialidade à decadência

Mel Brooks, um dos epítomes do humor judeu, fez dois filmes que eu considero antológicos: Blazing Saddles (com o título idiota de Banzé No Oeste) e Young Frankenstein (O Jovem Frankenstein), ambos de 1974.

Eu assisti O Jovem Frankestein cinco vezes nos cinemas, acreditem se quiser, e uma última vez, quando o operador de cinema do Centro de Ciências da Saúde (UFRJ) me chamou para assistir uma cópia em 16 mm, que foi projetada para os alunos.

O filme é brilhante, ele reflete uma paródia ao cinema de 1930, nas produções de horror da Universal Pictures. Mas, acima de tudo, é uma crítica à vaidade dos cientistas, que eu conheço muito bem!

Várias gags do filme são hilárias, mas em pelo menos uma delas, é impossível mostrar a anedota para quem não conhece a língua inglesa, ou seja, são “intraduzíveis”. A cena mostra Igor dizendo ao “Dr. Fronkonsteen”: “Walk this way”. A frase tem dois significados no seu original, que são “Venha por aqui” e “Ande deste jeito”, que é o que Igor queria dizer, quando repete “This way, this way”, e estende a bengala ao inocente doutor, que só se dá conta do pedido depois.

A cena da bengala funciona muito bem, mas em A História do Mundo Parte 1 ela é repetida e não tem a mesma graça. O filme tem alguns bons momentos, mas no geral é um pastiche de situações nas quais o humor não atinge a mesma qualidade como sátira ou paródia.

Em Banzé No Oeste, o tema é o do preconceito racial (o título original era Black Bart) e parte do roteiro foi escrito pelo brilhante, mas complicado ator negro Richard Pryor. A despeito da trama gerar em torno do preconceito contra negros, ainda assim são feitos comentários seguidos criticando o modo de agir dos judeus e principalmente dos políticos, que não querem perder o seu cargo e poder.

Este é talvez o grande mérito do filme, o de satirizar o governador tentando tapear seus eleitores com conversa, problema crônico em qualquer lugar onde quem é eleito engana todo mundo com discursos surrealistas!

Gene Wilder, que colabora em ambos os filmes citados acima, não conseguiu se sair bem em dois filmes feitos na Inglaterra: The Adventure Of Sherlock Holmes Smarter Brother e The World’s Greatest Lover, este último uma paródia aos mitos do cinema mudo. Eu até gosto desses dois filmes, mas eles estão longe de ser brilhantes.

O personagem neurótico criado por Wilder não cola mais, fica repetitivo e cansativo. Uma das premissas do filme é que o maior amante do mundo (supostamente a figura de Rodolfo Valentino) é uma miragem nas telas, porque na realidade ele seria homossexual.

O colecionador de cinema que se preza deve ter os antigos filmes em sua coleção, em memória de uma época em que nem Woody Allen conseguiu repetir. Aliás, Allen sempre teve uma mania como cineasta que eu e amigos nunca conseguimos entender, como, por exemplo, a recusa em fazer filmes com som estereofônico, até mesmo na era Dolby Digital. Suas neuroses estão sempre na tela, o que às vezes funciona muito bem, mas em outras é desnecessariamente redundante.

Atores, atrizes, cineastas e principalmente produtores judeus povoaram o cinema americano desde o seu início até hoje. Muitos deles trocaram de nome e entenderam que o público em sua maioria provavelmente não conseguiria assimilar a cultura judaica mostrada diretamente nos roteiros. Além disso, a popularidade mais prevalente no cinema é baseada na cultura da fé cristã. Assim, assuntos do povo judeu puderam ser vistos sob outro ângulo, como em Ben-Hur, personagem herói judeu, mas na época de Cristo, a quem, no final, ele reconhece como o Messias.

A cultura judaica no cinema é predominantemente norte-americana. Talvez possa ser encontrada em outros países (no Brasil, na figura do menestrel Juca Chaves), mas muito mais esparsa e fora do mesmo contexto. O humor propriamente dito não tem cor nem credo, ele é engraçado ou não, dependendo de quem cria.  [Webinsider]

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Película de cinema versus imagem digital dos filmes

Avatar de Paulo Roberto Elias

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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