Assisti recentemente o filme O Brutalista, em “VistaVision”, lembrando La La Land, apresentado em “CinemaScope”. Cineastas estão ressuscitando formatos que o cinema deixou para trás, e neste caso em um filme com Abertura e Intervalo!
Dias atrás, eu assisti o filme O Brutalista, segundo soube apresentado no Festival de Cinema de São Paulo do final do ano passado. Logo de cara tomei um susto: aparece na tela o antigo logo do processo VistaVision, da Paramount Pictures, seem o nome do estúdio. E aí eu me lembrei logo que tinha aparecido um outro Damien Chazelle, que quando fez La La Land exibiu o logo CinemaScope da Fox.
O Brutalista foi dirigido pelo ator Brady Corbet. Ele e Chazelle estão ambos na faixa dos 40 anos. Se quiseram rememorar os formatos cinematográficos antigos, creio que deve ter sido pela paixão pelo cinema.
Mas, Corbet vai mais além: o filme começa com uma Abertura, dura cerca de 3 horas e 20 minutos e tem um Intervalo!
Indo ao IMDb eu fui ver que tipo de cinematografia tinha sido usada. E achei uma mistura de processos, que eu cito:
Câmera: Arri Alexa (uma tomada),Arricam LT, Cooke S4 Lenses, Arricam ST, Cooke S4 Lentes Arriflex 235, Cooke S4, Lentes Arriflex 416, Zeiss Super Speed Lenses (algumas cenas), Arriflex 435, Cooke S4 Lentes Beaumont, VistaVision Camera, Leica Lentes R, Digital Betacam (epilogo).
Formato do negativo: 16 mm (Kodak Vision3 250D 7207, Vision3 500T 7219). 35 mm (also horizontal, Kodak Vision3 250D 5207, Vision3 500T 5219, Codex (uma tomada),Vídeo (epílogo).
Processo cinematográfico: ARRIRAW (uma tomada), Digital Betacam (epílogo), Digital Intermediate (master), Super 16 (algumas cenas), Super 35 (3-perfurações, algumas cenas).Techniscope (2-perurações, algumas cenas), VistaVision.
Distribuição: 35 mm, 70 mm, e DCP (projeção digital).
Como se vê, parece que o cineasta experimentou tudo. A relação de aspecto adotada foi de 1.66:1, usada para o VistaVision em 35 mm vertical, que deixou de ser usada séculos atrás. Porque toda esta preocupação obsessiva com o cinema passado eu não entendi até agora.
A duração e o conteúdo do filme
Acho louvável a lembrança do que já se passou no cinema, e meritória a preservação de formatos historicamente importantes.
Mas, tem um detalhe: aonde estão os antigos cinemas, aqueles que propiciaram que Cinerama, CinemaScope, VistaVision, Technirama e outros formatos que marcaram época fossem vistos pelo público?
A qualidade fotográfica de O Brutalista não passa nem perto da qualidade dos filmes em VistaVision que eu assisti nos cinemas. Várias restaurações meticulosas recentes procuraram restaurar a qualidade original deste tipo de fotografia. Aliás, foi anunciado recentemente o lançamento do filme Alta Sociedade, da MGM, com restauração do negativo VistaVision em inéditos 13.5 K de resolução, e tratamento com Dolby Vision HDR.
O filme em si não justifica a sua duração, a narrativa poderia muito bem ter sido abreviada, sem prejuízo do conteúdo. A estória é baseada na vida de um imigrante judeu, que veio à América, fugindo da Europa do pós-guerra. Ou seja, nada de novo naquilo que já foi rodado antes.
O chamado “sonho americano”, que é começar de baixo, subir na escala econômica e depois ficar famoso e rico, é claramente mostrado no histórico do arquiteto húngaro László Tóth, personificado pelo ator Adrien Brody.
O cineasta mostra o seu lado dramático, mencionando a sobrevivência ao campo de concentração na segunda guerra mundial, mas não se furta de contar o lado agressivo e neurótico do personagem, cuja vida foi pontuada pelo seu vício com drogas. O lado artístico de Tóth o fez querido e reverenciado, mas o seu outro lado destrutivo tornou-o um homem ressentido pelos seus pares, inclusive profissionalmente. Nem a mulher dele escapa desta mistura de sentimentos.
Eu achei o filme interessante, mas de um certo ponto para a frente repetitivo e arrastado. Inicialmente, o enredo parece promissor, mas acaba no mais do mesmo. Mas isso sou eu, porque o filme ganhou prêmios e prestígio onde foi exibido.
Bem, cada um sabe de si e gosta do que quer. Volta e meia, o cinema americano tenta resgatar o pesadelo judeu da segunda guerra, para lembrar a quem assiste o holocausto. A impressão que dá é que esta retórica não vai terminar nunca. Mas como o cinema é livre, assiste e gosta do assunto quem quiser! [Webinsider]
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.