Cinema Ultra Panavision: o espectador dentro do filme

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on telegram
Share on pocket

O processo Ultra Panavision foi o segundo método de filmagem e apresentação nos cinemas em Cinerama, usando uma única câmera e projetor.

Quando o excêntrico e esotérico diretor Quentin Tarantino decidiu filmar “Os Oito Odiados” em Ultra Panavision, usando câmera e lentes originais, eu fui um que ficou surpreso com a audácia.

E ele ainda conseguiu que vários cinemas na América projetassem o filme com o uso de aparelhagem completa disponível, ou em alguns casos com o projetor Century JJ, para 70 mm, reinstalado para esta finalidade, como mostra o vídeo retrospectivo postado no YouTube:

 

 

Seja lá porque motivo for que Tarantino decidira filmar em um processo infelizmente abandonado décadas atrás, o fato em si serviu para tornar evidente que não se pode ignorar a história do cinema impunemente. Além disso, serviu também para consubstanciar o argumento daqueles que pedem aos exibidores a manutenção de equipamentos destinados à projeção de película!

O primeiro e principal processo de projeção em tela larga com impacto comercial foi, sem dúvida, o Cinerama com o uso de 3 películas de 35 mm e tela ultra curva (146 graus), produzindo uma imagem cujo objetivo era colocar o espectador dentro do filme. Isso só seria possível se a tela acompanhasse o campo de visão de quem assistia.

Entraves de várias naturezas acabaram tornando o Cinerama um formato pouco exequível. Aqui no Brasil, a única sala que adotou este formato foi o Cine Comodoro, localizado na Avenida São João, centro de São Paulo. Mas, depois que o formato foi abandonado o Comodoro usou a mesma tela para o Super Cinerama, de 70 mm.

A ideia de usar uma película de bitola larga, neste caso de 70 mm, para projetar imagens em tela de Cinerama, foi a de simplificar a aparelhagem usada para a filmagem e a usada para projeção. Até então, o Cinerama de 3 películas fora pouco usado para projetos convencionais de cinema. A câmera era pesada, desajeitada, e não permitia a observação em tempo real do enquadramento da cena, com erro substancial de paralaxe, quando a objetiva era montada no topo da câmera.

O igualmente excêntrico Michael Todd financiou o projeto para construir um processo em tela de Cinerama, mas usando negativo de 65 mm, posteriormente batizado como “Todd-AO”, com lente desenvolvida pela American Optical. A sua empresa, Magna, comissionou a Philips na Holanda para resolver a projeção, e esta criou o lendário Philips DP70, o primeiro projetor para Todd-AO, podendo projetar em 30 ou 24 quadros por segundo, a última dessas cadências, para 70 ou 35 mm.

O segundo grande projeto nesta direção foi o do formato Ultra Panavision. Em ambos os casos, o objetivo era ocupar totalmente a tela de Cinerama, exceto que o Ultra Panavision passou a capturar imagens com lente anamórfica, resultando em uma relação de aspecto 2.76:1, brutalmente larga, e praticamente idêntica a do Cinerama original.

 

Processo Cinematográfico Negativo Lente
Todd-AO (1955) 65 mm Esférica 2.20:1
Ultra Panavision (1957) 65 mm Anamórfica (1.25x) 2.76:1
Super Panavision 70 (1959) 65 mm Esférica 2.20:1
Dimension 150 (1966) 65 mm Esférica

 

 

Diferentes lentes Panavision para o cinema

 

A Panavision desenvolveu a câmera para o Ultra Panavision, batizada de “MGM Camera 65”, em alusão ao estúdio para onde o projeto fora desenvolvido. Em 1957, a M-G-M já andava em constante dificuldade financeira, e assim apressou o lançamento de Raintree County, em 1957 e Ben Hur, mega produção de 1959.

Para cinemas sem projeção de 70 mm, cópias destes filmes foram feitas com a modificação da relação de aspecto, de 2.76:1 para 2.55:1 (CinemaScope). Estes filmes foram exibidos desta forma nos cinemas Metro, aqui no Brasil.

Ben Hur teve um relançamento no formato 2.20:1, tela 70 mm “plana”, que eu tive a sorte de assistir em anos recentes.

O que possibilitou a modificação do negativo de captura em 65 mm para a tela curva do Cinerama foi a correção de distorção na cópia de 70 mm enviada aos cinemas:

 

image003 2

 

Estas cópias foram rotuladas como “cópias retificadas”. Os fotogramas acima obtidos, e postados no site in70mm.com, saíram do filme em Todd-AO “Oklahoma”, lançado neste formato de tela curva em Cinerama 70, em outubro de 1955, no Cinema Rivoli, localizado em Nova York.

No Cinerama 70 do Cine Roxy, localizado até hoje, em Copacabana, foi possível assistir filmes em 70 mm de todos os formatos acima mencionados, e mais filmes originalmente rodados em 35 mm, posteriormente ampliados para 70 mm.

O processo Dimensão 150 (Dimension 150), compreendeu sistemas separados de filmagem e projeção, intercambiáveis. Este sistema inaugurou a nova sala do agora abandonado Metro Boavista (antigo Metro Passeio). A tela tem uma curvatura de 150 graus, daí o nome adotado para o formato.

Telas para Dimensão 150 podem abrigar imagens com cópias retificadas em 70 mm, advindas de qualquer outro processo fotográfico, inclusive 35 mm ampliados para 70 mm.

Foi no Cinema Palácio, equipado com 70 mm “plano”, que eu assisti “Patton”, fotografado em Dimensão 150, provando assim que cópias não retificadas podiam ser exibidas em telas convencionais, de um processo pretendido para tela ultra curva.

Igualmente, eu assisti no Metro Boavista o filme “E.T.”, de Steven Spielberg, rodado em 35 mm 1.85:1, com lente esférica, apresentado em tela de Dimensão 150.

Em mídia ótica, nem sempre filmes de bitola larga apresentam bons resultados, exclusivamente por culpa da negligência de transcrição. De um lado, se vê pessoas com grande preocupação com os procedimentos de restauração, mas do outro, pessoas que pegam estes filmes somente para faturar algum, ignorando fãs e pessoas vividas, que viram filmes em 70 mm apresentados como espetáculos teatrais.

De qualquer forma, quem agora tem chance de ver filmes novos, insistentemente rodados em 70 mm e apresentados como tal, deve-se considerar um privilegiado. Outrolado_

 

. . .

 

Leia também

 

Formato Super Panavision vai bem, obrigado

 

Os processos fotográficos Technirama e Technirama 70

 

A minha primeira experiência em uma sala de cinema com Dolby Atmos

 

Adaptações de filmes de cinema em mídias de disco ou fita

 

O formato HDR ainda sem definição de padrão

Avatar de Paulo Roberto Elias

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on telegram
Share on pocket

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *