Quanto Mais Quente Melhor, lançado em 1959, é uma das maiores comédias de todos os tempos. Direção, roteiro e Marylin Monroe.
Parece incrível como certos filmes resistem ao tempo. Depois de anos a fio, eles são categorizados pelos fãs como “clássicos”. E são mesmo! Dentre esses clássicos de todos os tempos, eu considero até hoje esta uma das melhores comédias que eu assisti: Some Like It Hot (no Brasil, “Quanto Mais Quente Melhor”), dirigida por Billy Wilder, com o magnífico roteiro escrito por ele e por I. A. L. Diamond.
O filme foi lançado em 1959. Um ano mais tarde, eles fariam The Apartment (“Se meu apartamento falasse”), igualmente brilhante, várias vezes copiado, e recipiente de um Oscar de melhor roteiro original.
Wilder e Diamond eram emigrantes europeus, o primeiro um polonês que havia fugido do nazismo, assim como vários atores e diretores naquela época, e o segundo era romeno, que havia emigrado bem antes dos nazistas chegarem ao poder. Ambos fizeram cinema da melhor qualidade.
O roteiro original desta comédia nunca foi alterado em uma fala sequer, como testemunharam os atores tempos depois. E ninguém se surpreende com isso, porque as falas e os diálogos são brilhantes!
Na última cena, fugindo para “casar”, Jerry (Daphne) e o milionário Osgood Fielding III soltam a maior anedota do filme, que arrancou gargalhadas da plateia, diante do anúncio de que Jerry não era mulher:
Em todas as vezes que eu vi este filme nos cinemas, eu assisti gente rindo alto nesta cena, que encerra o filme. Ao longo do filme Jerry e Osgood flertam e dançam, terminando em uma proposta de casamento pelo segundo. E quando Joe pergunta a Jerry porque ele iria se casar com Osgood ele diz: “Segurança”. E novamente a plateia nos cinemas cai na gargalhada.
O elenco e a comédia
Este é, para mim pelo menos, seguramente o melhor filme feito pela atriz Marilyn Monroe, com aquele jeito de adolescente sapeca e extremamente sensual, capaz de deixar qualquer pretendente derretido!
Infelizmente, na vida real Marilyn era um desastre. Billy Wilder, em uma entrevista dada à televisão alemã, contou que ela errava ou esquecia as falas, e ele quase perdeu a paciência com ela. Marilyn foi uma profissional problemática em vários dos seus filmes, chegando tarde, atrasando a produção, etc. Porém, na tela, ela aparecia deslumbrante e encantava as plateias.
Em um depoimento do ator Tony Curtis ao crítico Leonard Maltin, ele disse que na cena dos beijos dentro do iate Marilyn foi para cima dele de uma forma voluptuosa, e foi difícil para ele conseguir se controlar.
Em contrapartida, se quem assiste prestar atenção, irá notar que a atriz havia engordado bem, os seios e a bunda estavam visivelmente fartos, e ela só iria emagrecer de novo anos depois, já então parecendo uma mulher abatida. Na época do seu último filme para a Fox, o estúdio a despediu no meio da filmagem, depois a trouxe de volta, mas não adiantou nada quando a atriz apareceu morta em casa, em circunstâncias misteriosas. Não se sabe até hoje se Marilyn suicidou-se ou foi envenenada, por causa dos rumores nos casos que ela teria tido com os irmãos Kennedy.
Marilyn contracena com Tony Curtis se anunciando como a clássica “loura burra”, personagem notadamente vítima das comédias de Hollywood, mas neste caso com o objetivo de mostrar, antes de mais nada, uma mulher ingênua e facilmente enganada por homens sem escrúpulo, que a usam e depois somem.
O centro da comédia está justamente no fato de que Joe é um desses tipos, mas que depois gosta dela e se arrepende por tê-la enganado. E em um momento brilhante do filme, ele se revela a Sugar (Marilyn) e diz uma belíssima frase de consolação: “Nada disso, Sugar, nenhum cara vale a pena”.
Na minha percepção de fã de cinema, é Jack Lemmon (Jerry, Daphne) quem rouba o filme. O ator iria repetir aquele jeito de homem mal humorado, ou sem senso de humor, em outros filmes, mas neste em particular, o seu jeito de atuar é impagável e sem comparação com qualquer outro ator que tenha feito o mesmo.
A trilha sonora do filme leva a assinatura de Adolph Deutsch , mas a maioria das músicas, como Runnin’ Wild ou Sugar Blues, foram escritas por outros compositores. Todas as músicas, sem exceção, se encaixam perfeitamente no roteiro. O título original “Some like it Hot”, “it” se refere ao Jazz, em contraste com as músicas tocadas com menos ênfase na emoção da execução.
Em um dos momentos mais sensíveis e memoráveis do filme, Marilyn Monroe (Sugar) canta “I’m Thru With Love” (“Chega de amor”), que contém na sua letra a explicação de uma pessoa apaixonada e rejeitada por outra, para não querer mais amar. Diz a letra:
“For I must have you or no one
And so I’m through with love”
A colocação dos autores, dizendo na letra “ou você ou ninguém” é, na minha opinião, de grande inspiração. Colocações deste tipo em muitas letras de música espelham o mesmo sentimento de perda da pessoa amada, sentimento este que pode carregar traumas para o resto da vida de qualquer um.
O filme se encerra com confissões e com honestidade, de forma catártica e direta. De fato, nenhuma fala do roteiro precisava sem modificada ou cacos de improvisação introduzidos. O roteiro devia ser exemplo de como um filme deve ser feito, ao contrário de tempos para cá, onde roteiros são vazios e não fazem o menor sentido. [Webinsider]
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.