James B. Lansing

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Eu creio que muitos dos adolescentes audiófilos da minha geração sonharam um dia poder ter em casa o som profissional das caixas acústicas fabricadas pela JBL.

A história do seu fundador se confunde com a própria história do áudio, as suas dificuldades, triunfos e fracassos, períodos de transição, muitas vezes impulsionados pela então crescente indústria de cinema norte-americano.

James Bullough Lansing (nascido James Martini) foi um dos pioneiros inovadores do áudio profissional, que depois se estendeu ao mercado da alta fidelidade doméstica, com projetos ousados e bastante caros, pertencendo a um nicho de usuários durante anos a fio.

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Historiadores relatam que Lansing teria sido portador de uma doença mental, com comportamento maníaco depressivo (o que a psicologia moderna rotula hoje de bipolar), e isto teria sido a principal causa do seu suicídio, anos mais tarde.

Enquanto ativo, James B. Lansing deu uma imensa contribuição para a evolução dos alto-falantes (chamados de “drivers”), e no design de diversos modelos de caixas acústicas, a maioria delas direcionada para o mercado profissional.

Lansing fundou uma companhia para fabricar alto-falantes para rádios e carros, com o nome de Lansing Manufacturing Company, e achou em Ken Decker o sócio ideal para administrar a empresa financeiramente. A fábrica mudou-se de Salt Lake City para Los Angeles em 1927, onde a companhia encontrou uma indústria de cinema emergente, com o lançamento de filmes sonoros.

Tal coincidência fez a Lansing Manufacturing prosperar, aproveitando-se do fraco desempenho dos primeiros sistemas de áudio da época. Junto com a M-G-M, na pessoa de seu executivo Douglas Shearer, Lansing participou do design e construção do Shearer Horn, já comentado nesta coluna. O sucesso do projeto durou até 1936. Mas, em 1939, Ken Decker morre de desastre aéreo, deixando a empresa órfã de seus dotes administrativos, o que levou a situação da Lansing Manufacturing a dificuldades financeiras de tudo quanto é ordem.

Em paralelo com todo este histórico, a implementação do som no cinema obrigou a Western Electric a criação de um grupo de pesquisa, para o desenvolvimento de sistemas de áudio para produção e exibição de filmes. Este grupo foi chamado de Electrical Research Products Incorporated (ERPI), que desenvolveu alto-falantes e a eletrônica necessária ao processo de amplificação e correção da reprodução nas salas de cinema. Mas, alguns anos mais tarde, a Western Electric vendeu a sua parte nesta empresa e assim alguns de seus engenheiros fizeram dela uma nova companhia, agora com o nome de Altec Service Company. O nome Altec é na verdade uma abreviação da expressão “All Technical”. A Altec, que carecia de matéria prima e espaços de fabricação de componentes, encontrou na Lansing Manufacturing em decadência financeira a oportunidade de se expandir. Depois de adquiri-la a empresa passou a chamar-se de “Altec Lansing”, nome que se tornou sinônimo de equipamentos de áudio para estúdios durante décadas.

A Altec Lansing conseguiu contratos com o governo americano, e desenvolveu pesquisas que resultaram na obtenção de uma liga de ferro composta por alumínio (Al), níquel (Ni) e cobalto (Co), conhecida depois como Alnico, e cujas propriedades físico-químicas a tornaram o ímã permanente como um componente essencial do alto-falante moderno.

James B. Lansing tornou-se o vice-presidente de engenharia da Altec, encarregado do desenvolvimento de novos projetos. Um deles foi o design das caixas Voice of The Theater, tendo grande sucesso o modelo VOTT A-4, que permaneceu como instalação padrão nas salas de exibição por muitos anos:

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Entretanto, Lansing, provavelmente acostumado a dirigir o seu próprio negócio, após cinco anos de contrato com a Altec Lansing, pulou fora e formou a James B. Lansing Sound, Incorporated, em 1946. E quando mais tarde a Altec Lansing se queixou do uso do nome Lansing na nova empresa, esta simplificou eventualmente a sua razão social para JBL.

Mas, a iniciativa de Lansing durou pouco, porque a empresa ficou novamente à mercê dos problemas financeiros, e Lansing cometeu suicídio em 1949. A empresa teria fechado, não fosse a iniciativa de seu colaborador William Thomas. Por volta de um ano mais tarde, Thomas cedeu à reclamação da Altec Lansing, nomeando a empresa com o nome de JBL, ficando assim até hoje.

A JBL entrou firme na fabricação de componentes para a área profissional. Novos contratos para o som estereofônico do cinema nos anos subsequentes deu o gás que a empresa precisava para se desenvolver. A JBL se tornou um nome conhecido para a instalação de monitores de áudio nos estúdios de gravação, inclusive no Brasil.

Em tempos recentes, a JBL foi comprada por Sidney Harman, co-fundador da Harman-Kardon, e passou a migrar os resultados dos novos projetos da linha profissional para o ambiente doméstico, mais ou menos como se faz na fórmula 1, que tira vantagem dos melhoramentos dos carros de alto desempenho para carros de passeio ou esportivos. O uso deste tipo de tecnologia avançada é comentado resumidamente a seguir.

 Line Arrays

O Fernando Blanco, amigo meu de longa data dotado de grande talento como hobbyista de áudio, me chama a atenção esses dias para a contribuição do projetista D. B. (Don) Keele, Jr. nos conceitos e designs, entre eles o aperfeiçoamento dos chamados “Line Arrays”, que são colunas de alto-falantes destinadas à dispersão controlada de som dentro de determinados ambientes. Abaixo se pode ver uma aplicação desse tipo de design, da própria JBL:

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Entre as muitas contribuições de Keele para os Line Arrays está o desenvolvimento do que foi chamado de Constant Beamwidth Transducer (CBT, ou Transdutor de Largura de Feixe Constante, em uma tradução aproximada). Keele é visto abaixo, com um desses modelos:

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Direcionalidade

O objetivo do Line Array é aumentar e controlar a direcionalidade do som emitido pela caixa acústica. Tentando explicar melhor:

O som é resultado da pressão contínua de moléculas do ar, que por sua vez se chocam com o ouvido, produzindo uma pressão no tímpano, que resulta em uma corrente elétrica que o cérebro identifica como sendo parte de uma determinada frequência. Se nós considerarmos o alto-falante como elemento iniciador desta pressão nós iremos perceber que ele é alimentado por uma corrente elétrica variável vinda do amplificador, que se transforma em energia mecânica, deslocando o ar como se fosse um êmbolo, em movimentos para frente e para trás, em uma determinada velocidade. Quando este deslocamento é percebido pelo ouvido o impulso mecânico inicial é transformado em corrente elétrica. Ambos os fenômenos são formas distintas de energia, neste caso que se propagam pelo ar. A transformação de energia elétrica em mecânica e vice-versa é chamada genericamente de “transdução de energia”, daí o termo “transdutor” ser aplicado comumente aos alto-falantes.

O problema maior para a propagação do som é que diferentes frequências (alta ou aguda, média e baixa ou grave) se propagam de maneira diferente no ar. Frequências baixas se espalham em todas as direções, e à medida que as frequências aumentam este espalhamento é cada vez menor, levando-o a apenas um feixe (“beam”) de energia.

Além disso, quando um som é emitido ele não chega de forma direta ao ouvido exclusivamente. Na realidade, o que o ouvido percebe é o feixe de energia que vem direto do alto-falante e mais todos os sons que se espalham no ambiente e que são, em última análise, refletidos ou absorvidos pelas paredes vizinhas e objetos no entorno da caixa acústica.

Estudos na área de acústica evidenciam que, idealmente, o som de um alto-falante deveria chegar aos nossos ouvidos sem a interferência de sons refletidos no ambiente. No tratamento acústico dos locais onde o som é reproduzido se analisa este percurso, de maneira a criar, se for o caso, o melhor ambiente possível para a percepção do som sem qualquer tipo de interferência.

É dentro deste contexto que os chamados Line Arrays se inserem, ao criar uma fonte emissora com direcionalidade constante! Em outras palavras: se instalados em um auditório, por exemplo, irão permitir que o som direto chegue primeiro ao ouvido das pessoas que lá estão, ao invés de viajar pelo ambiente, de forma descontrolada. Ao fazer isso, aumenta-se consideravelmente a inteligibilidade do som que é emitido pelo sistema!

Nos projetos de Keele leva-se em consideração outro fator: de que a percepção do som é mais alta para aqueles ouvintes que estão próximos às caixas e menor, relativamente, para os que estão mais distantes. Para permitir que a percepção do som seja a mesma em todos os lugares da sala os alto-falantes recebem níveis diferentes de amplificação, ou seja, aqueles direcionados aos ouvintes mais próximos tocarão mais baixo e vice-versa.

Cada coluna deve ser projetada e ajustada para um tipo específico de local. A JBL, bem como os outros fabricantes que se dedicam a este tipo de produto, fornecem programas para fazer a estimativa do tipo de line array que deverá ser empregado.

 Waveguides

Waveguides (ou “Guias de Onda”) são tubos de diversos tamanhos, na forma de cornetas, quadrados ou retangulares, ou dutos, que orientam e reforçam a reprodução de frequências elevadas, e às vezes de frequências mais baixas.

O termo pode até parecer alguma coisa emergente da alta tecnologia, mas o fato é que os waveguides na forma de cornetas foram usados nos primeiros gramofones, para a reprodução sem amplificação de discos gravados acusticamente.

Um exemplo de waveguide moderno pode ser visto na imagem abaixo. Trata-se de um waveguide proprietário, desenvolvido pela JBL, com o nome de EOS, acrônimo de Elliptical Oblate Spheroidal. Como o nome indica, ele é desenhado no formato oblato esferoidal, e posicionado à frente de dois drivers, o de cima um ultra tweeter (capaz de reproduzir sons acima de 15 kHz) e em baixo um tweeter normal. O EOS está instalado nas caixas JBL da série ES. Variantes deste design são vistos em outros modelos.

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O desenho e o emprego de waveguides diz respeito à forma como o som se propaga. À medida que a onda sonora viaja no espaço a energia inicial cai progressivamente. Isto é particularmente verdadeiro durante a reprodução de frequências altas (agudos). A ideia de amplificar o som acusticamente, na forma de um guia de ondas, somou-se à noção de controlar a direcionalidade do som propagado. Ao fazer isso, os waveguides melhoram substancialmente a percepção dos sons que permitem ao ouvinte identificar a fonte sonora, independente onde ele/ela estará posicionado no ambiente.

Em última análise, um waveguide aumenta a eficiência do alto-falante ao qual ele está acoplado, e pode por isso ser usado com unidades de baixa potência, o que é interessante sobre o ponto de vista da durabilidade e da distorção do som reproduzido.

Os waveguides modernos são projetados em programas de computadores, e depois testados com os seus respectivos drivers (alto-falantes). Cada waveguide é então otimizado e incluído nos projetos de caixas acústicas propriamente ditos.

Waveguides são também vendidos separadamente pelos seus fabricantes, o que facilita ao hobbyista desenvolver o seu projeto e fazer a montagem ele próprio.

 Comentários finais

Nomes como JBL ou Altec se tornaram sinônimo de aplicações em áudio profissional por décadas a fio, e atiçaram a imaginação dos jovens audiófilos da minha geração.

Tudo que se quer de uma caixa acústica é que ela seja o mais transparente possível, ou seja, reproduzir o som sem que a presença delas seja sequer notada na sala. Até hoje, os maiores méritos de uma caixa acústica com este tipo de característica, e que chegaram aos meus ouvidos, são dos painéis eletrostáticos Quad. Mas, a realidade de custo e manutenção desses painéis o torna na prática inviável em instalações demandantes. Por este e outros tantos motivos, as caixas acústicas dotadas de alto-falantes dinâmicos continuam a predominar o mercado profissional e, por extensão, o doméstico.

Anos atrás ninguém iria imaginar que uma caixa fabricada pela JBL pudesse chegar às nossas casas com um preço abordável, e na verdade relativamente inferior aos da concorrência.

Com a necessidade de se recriar o som do cinema no ambiente doméstico, fabricantes diversos vêm elaborando projetos cada vez mais robustos e precisos. O que torna o investimento em um sistema de áudio hoje capaz de ser tão bom para música quanto para trilhas de filmes.

A tecnologia de alto-falantes e caixas acústicas continua a ser fascinante, e aquele que outrora era considerado o elo mais fraco da cadeia de reprodução do som hoje em dia é sinônimo de avanços nesta mesma tecnologia. [Webinsider]

Leia também:

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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5 respostas

  1. Olá, Felipe,

    Não tem problema ter trocado o nome, acontece.

    Eu fiz no passado remoto um monte de audições com caixas de duplo terminal e com amplificadores estéreo, e no final preferi usar as caixas sem uso da biamplificação. E não me refiro a qualquer caixa, eu usava caixas Linn de excelente nível.

    Por causa desta experiência frustrante, que marcou negativamente os meus esforços naquela época, eu acabei esquecendo o assunto.

    Mas, é preciso enfatizar que tudo depende do projeto da caixa, do seu crossover interno, e aí eu creio que o ideal é ir experimentando para ver o resultado auditivo, se convence ou não a você, que é o principal interessado e cujos ouvidos são diferentes das outras pessoas.

    Por outro lado, quando se trata de som multicanal, e sem o usuário se propor a modificar a parte interna da caixa (eu conheço quem faz isso invariavelmente), eu acho o recurso de biamplificação totalmente dispensável, até porque você sempre corre o risco de perder um dos canais.

    Agora, experimentar não faz mal a ninguém, e neste caso com apenas um par de cabos a mais.

    Pessoalmente, não creio que a biamplificação seja um recurso esquecido ou mal divulgado, apenas ele não reflete o interesse da maioria, por diversos motivos.

  2. Olá Paulo Henrique,

    Gostaria de saber sua opinião sobre sistemas bi-amplificados. Recentemente adquiri um par de caixas torre de boa marca com terminais independentes
    de graves/agudos bem como um amplificador também da mesma marca com um switch que permite a saída bi-amplificada. Antes que imagine se tratar de equipamento hi-end adianto que não, é uma marca conhecida e popular no mundo do áudio, mas que decidiu lançar receivers somente estéreo acompanhando uma onda vintage. Minha impressão ouvindo diversas gravações é que o resultado é excelente e não perde em qualidade (perceptível) para execuções HD já que as saídas são analógicas e limitadas à resolução standard de CD. Seria a bi-amplificação um recurso esquecido ou mal divulgado e que é capaz de melhorar sobremaneira a resposta das caixas?

  3. Olá, Leeosvald,

    É verdade. Outro dia um amigo meu, que conhece áudio a fundo, diga-se de passagem, me mostrou um player na forma de um cubo pequeno o suficiente para caber na palma da mão. Espetou lá um chip de memória cheio de arquivos MP3 de gravações conhecidas. Eu não acreditei no grave que saiu daquele cubo, e até hoje nem ele muito menos eu sabemos como aquilo era possível. Eu fiquei de queixo caído!

  4. Olá Paulo.

    Bacana essa história da JBL, o que mais me impressiona é que cada vez os fabricantes constroem equipamentos mais compactos e impactantes.

    Certa vez fui fazer um teste nessas unidades chamadas de Soundbar, não dava muita fé nesse tipo sistema, e me impressionei com tamanha qualidade sonora que esse sistema nos entrega, junto a um subwoofer e a praticidade sem aquele ninho de fios como nos HTs convencionais.

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