O caso da uva e a falta de tato na interação com o cliente

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O Brasil, enquanto economia em desenvolvimento, tem um desafio sério pela frente: o apagão de mão de obra. Mas não este apagão que normalmente é alardeado pelos veículos de comunicação, no qual se aponta déficit de engenheiros, mecânicos industriais, gerentes de TI, entre outras áreas. O apagão ao qual me refiro está intimamente ligado à cultura de prestação de serviços e de atendimento aos clientes.

Faltam pessoas preparadas para lidar com atendimento. Em especial quando falamos em economia de serviços em que, por definição, a interação com o cliente é fundamental para a geração de valor pela qual se está pagando, como ficamos?

Nossos profissionais, independente do nível, da escolaridade ou da área de atuação, em geral, não possuem esta cultura de atendimento internalizada. Conclusão: o atendimento, mesmo quando se investe pesado em treinamentos e preparação, enfrenta crises diárias, pois há instalado um problema de crença.

Em diversos momentos, por mais que protocolos sejam seguidos à risca, o resultado da interação é negativo porque há uma crença limitante do lado dos atendentes (e da empresa como um todo) impedindo que eles enxerguem além e que se comprometam efetivamente na prestação de um bom serviço.

Outro dia estava em um grande supermercado aqui no Rio e, disposto a comprar algumas uvas, dirigi-me ao balcão, perguntando ao atendente sobre qual variedade de uva estava melhor. Foi aí que se deu a cena dantesca: ao invés de oferecer as uvas para que eu experimentasse e decidisse minha compra, ele fez o inacreditável, provando ele próprio cada uma das cinco variedades de uva expostas na gôndola. Ao final da prova, sacramentou:

– Senhor, todas estão azedas. Melhor o senhor não levar nada hoje.

A importância da economia de serviços

Não é preciosismo de especialista em marketing e negócios reclamar que um pobre atendente de supermercado cometa uma gafe como essa. Na realidade, até seria preciosismo, caso fosse algo pontual – o que não é -, como qualquer um de nós pode atestar a partir de nossas experiências diárias (e hilárias) sobre atendimento ao cliente no Brasil. No caso do mercado, estamos tratando de uma empresa de conveniência, que possui no atendimento ao cliente um canal importante para construção de marca e reputação.

Christian Grönroos, um dos grandes autores sobre marketing de serviços, afirma: é justamente o setor de serviços que mais se desenvolve nas economias de primeiro mundo (superavitárias). Quando o avanço e o desenvolvimento atingem certo patamar, as pessoas passam a demandar por serviços cada vez mais elaborados e complexos.

O Brasil, enquanto economia supostamente em desenvolvimento (mas ainda muito deficitária), vem experimentando esta maior busca por serviços. Um estudo do Ipea, de 2006, mostra que o setor de serviços compreendia naquele ano 945 mil empresas e empregava 6,85 milhões de trabalhadores, enquanto a indústria compreendia 135 mil empresas e emprega 5,68 milhões de pessoas. Se contarmos o setor “oculto” de serviços (conforme definição de Grönroos, ou seja, serviços prestados pela indústria como complementares aos produtos que fabricam), esta diferença será ainda maior. E não é apenas a geração de emprego que conta aqui, mas também a criação de riqueza.

A cultura dos serviços e do atendimento

Uma das diferenças básicas entre produtos e serviços é que no caso dos serviços, lidamos com algo abstrato. Outro ponto fundamental é que o consumo desta “abstração” se dá na interação entre cliente e prestador. Trocando em miúdos, para a qualidade dos serviços (como já visto, um dos pilares das economias modernas) precisamos de atendimento de excelência, pois é justo aí que se cria o tal do valor para o cliente.

Logo, a ameaça maior de apagão talvez não esteja na ausência de engenheiros ou técnicos em diversas áreas, mas de um quadro generalizado e crônico de ausência de uma cultura de atendimento de qualidade. Talvez por questões históricas, talvez por falta de educação ou simplesmente porque nos acostumamos com o péssimo atendimento, o fato é que estamos pouco habituados em buscar a excelência.

Possivelmente, falta ainda maturidade no nosso mercado, tanto por parte das empresas, que não reconhecem seus reais deveres, quanto por parte dos consumidores, que encontram na mediocridade algo razoável e não estão conscientes dos seus direitos durante uma relação de consumo.

Isso resulta em disparates: por vezes tanto empresa quanto consumidor oscilam entre direitos e deveres além da conta e direitos e deveres aquém do mínimo tolerável.

Este apagão é tão perigoso quanto o apagão tratado pelos meios de comunicação: torna-se um obstáculo para o crescimento da economia e para a competitividade das empresas brasileiras. [Webinsider]

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Bruno Garcia (bruno.garcia@com2b.com.br) é o editor do Mundo do Marketing. Sócio da Com2B, mantém o site Com2Business e o Twitter @bruno_com2b.

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