Orkut Büyükkomten, este engenheiro turco do Google com sobrenome de vulcão islandês, foi o responsável por, em 2004, criar um dos sites mais acessados do Brasil e praticamente sinônimo de rede social no país. Sem querer.
Quando, dentro dos 20% do tempo dedicado a projetos pessoais, o Orkut (o engenheiro, não o site) criou o Orkut (o site, não o engenheiro), seu objetivo era fortalecer os laços sociais dentro dos Estados Unidos e, indiretamente, provar o teorema dos seis graus de separação, no qual existem outras seis pessoas entre você e qualquer outro cidadão do mundo.
O que talvez o Orkut (o engenheiro) não imaginou, é a repercussão de sua criação em um país da América do Sul.
A verdade é que seu crescimento no Brasil deu-se mais por uma questão viral xenofóbica (oi?!). No início, muito se falava sobre a demografia dos usuários do site, com o, ainda existente, ranking com bandeiras indicando qual porcentagem dos usuários de cada país cadastrado na ferramenta.
Na época, os então early-adopters brasileiros adotaram uma postura combativa frente à hegemonia estounidense dentro do Orkut e começaram, em uma das maiores campanhas nacionalistas efetivamente espontâneas, a recrutar seus amigos e conhecidos para se juntarem à comunidade brasileira no Orkut e “sermos mais que os americanos”, conforme diziam.
Isto na época em que o acesso ao Orkut só era possível através de um convite de alguém que já era cadastrado (o que valorizava ainda mais o fato de se estar presente).
E este aspecto motivacional funcionou! Logo passamos dos 15% aos 20%, um pouco depois aos 35% e finalmente éramos a comunidade dominante dentro do Orkut. Vencemos! O que? Não sei, mas, além do futebol e vôlei, sempre se comemora quando o Brasil vence os Estados Unidos.
No meio deste processo todo o Google lançou, em 2005, a versão em português, facilitando a vida daqueles que sentem certa dificuldade com o idioma da rainha e seguindo a correta orientação do Google em localizar ao máximo suas ferramentas em todos os idiomas possíveis, entendendo ser esta uma questão chave e sensível na ampliação de sua base (você sabia que o buscador tem uma versão em Klingon?
Entre em uma lan-house e o que mais se vê são pessoas trocando mensagens e xeretando online a vida alheia pelo Orkut; viaje para o exterior e, quando avistar algum computador com o Orkut aberto, pode cumprimentar a pessoa em português.
E hoje os números indicam a importância desta rede social no país:
- Principal rede social brasileira, acessado por 73% dos internauras ativos no país em março de 2010, segundo o Ibope NetRatings;
- Considerando o universo a partir da amostra também do Ibope Netratings, quase 27 milhões de pessoas acessaram a rede social do Google;
- Quase quatro vezes maior que o Facebook no Brasil e três vezes maior que o Twitter (segundo colocado no ranking geral e com 24% de alcance entre os internautas ativos)
Na “guerra” contra os estadounidenses, vencemos:
É do Brasil! Da Índia! Do Paquistão! E… e… e só!
O fato é que a rede social Orkut não teve os mesmos méritos nos demais países do mundo.
Por alguma razão que ainda desconheço, os Estados Unidos e boa parte dos países do mundo preferiram compartilhar suas informações pessoas, gostos e inquietudes através do Facebook, uma, na época, similar ferramenta desenvolvida por Mark Zuckerberg, um ex-estudante de Harvard, também restrita a uma comunidade especifica inicialmente (estudantes de Harvard), passando a agregar com o tempo estudantes de outras universidades (MIT, Boston University) e, no segundo semestre 2006 somente, passar a aceitar qualquer indivíduo, maior de 13 anos, que quisesse compartilhar seus dados pessoais com o mundo ou com uma rede restrita de amigos e conhecidos.
O Facebook hoje é um monstro global que em março de 2010 contabilizou 7,07% de todos os acessos a sites nos Estados Unidos.
Acha pouco? Bem, o todo-poderoso Google tem 7,03%, ficando “apenas” em segundo lugar. Mais de 350 milhões de pessoas e uma empresa valendo US$ 14 bilhões? Nada mal para um recém formado.
Mas voltando a falar do Orkut, se formos pensar a nível global, não haveria porque o Google investir tanto numa ferramenta que “deu certo em três países (ainda que um deles seja o Brasil).
Nada mais lógico que, dentro do conceito de descentralização próprio da internet, transferir a responsabilidade e propriedade do Orkut para a subsidiária brasileiro, o que ocorreu em agosto de 2008.
O jeitinho do brasileiro
O que aconteceu depois, acredito que por coincidência, é interessante de se observar do ponto de vista social. A presença em massa da população brasileira no Orkut acabou por refletir, online, aspectos não tão saudáveis do mundo offline.
Diversas denúncias de racismo, conteúdo inapropriado, calúnia, difamação e todos os demais crimes contra honra fizeram com que o Google fosse visto como a galinha dos ovos de ouro de advogados em busca de auto-promoção (Oba! Vamos processar o Google e aparecer na Rede Globo!); não que o assunto não merecesse toda atenção, claro que merecia (e merece), mas vamos separar o que são ações efetivas para se combater atitudes insalubres online e o que é fogo de palha pelos 15 segundos de fama em rede nacional.
Filtros e ferramentas de moderação implementadas, viagens e mais viagens de Alexandre Hohagen (CEO do Google Brasil na época) para Brasília, encontros com ONGs que trabalham a segurança online, enfim, muitos bits e bytes depois a empresa afirmou ter reduzido 98% a pedofilia em seu site de rede social.
Perigos à parte, a utilização (legal) do Orkut por seus usuários acabou modificando-se com o tempo; enquanto no início havia a surpresa em re-encontrar aquele seu colega de classe do pré-primário, com o passar dos anos aquelas fotos passaram a ser tratadas como álbum de figurinhas; o scrap em partes substituia o e-mail e acabou sendo responsável por diversas discussões de relacionamento, divórcios e afins; as comunidades, de fóruns passaram a serem tratadas como badges que definem os gostos e a personalidade do usuário (servindo também como ferramenta de avaliação por parte dos departamentos de RH; você odeia trabalhar? Próximo!)
A popularidade do Orkut também pode ser vista como uma ameaça à sua hegemonia. Ser querer ser preconceituosamente classista, a inclusão digital permitiu com que aqueles que até então não possuiam tanta experiência no meio online terem acesso à toda gama de possibilidades da Internet incluindo, é claro, as redes sociais. E qual era a rede social predominante nas classes sociais mais altas até então? O Orkut. E com isto o crescimento populacional do site deu vazão a uma série de comportamentos e atitudes um tanto quanto, digamos, comprometedoras no meio online, fazendo com que imediatamente o julgamento pré-concebido utiliza-se do mesmo meio para execrar esta nova Babilônia.
Não entendeu direito? Experimente visitar sites como o Tolices do Orkut ou o Orkut de Bêbado para se divertir (#prontofalei) com estas pérolas. Conteúdo que nada mais reflete a falta de educação (formal e informal) de grande parte da população brasileira, que agora tem um computador, mas que ainda não dominou o sutil equilíbrio entre exposição e discrição.
A associação da rede social com estes websites que exploram, de certa forma, a ingenuidade humana em redes sociais acaba transferindo para a marca Orkut parte das histórias vexatórias e, com isto, denegrindo, por consequencia, a imagem daqueles que o utilizam.
Aliado a uma má reformulação visual, o Orkut deixou de ser o queridinho de muitos de seus antigos usuários, principalmente aqueles com maior afinidade com o meio online, que migram cada vez mais para a rede social preferida do resto do planeta, o Facebook.
O fato da ferramenta de Mark Zuckerberg oferecer como bônus a possibilidade de se manter em contato com grupos de amigos/conhecidos de outros países, uma melhor integração entre a ferramenta principal e seus aplicativos e uma arquitetura de informação que destaca a dinâmica de conteúdo (lembram das críticas de que o Facebook estava parecendo o Twitter?) movem as classes sociais A/B, pregadores antigos do Orkut, para este novo bookmark.
Falando um pouco destes aspectos, o Orkut em certos pontos parou no tempo, sua última reformulação em 29 de outubro de 2009 (fontes não confirmadas afirmam que foi um presente de aniversário para mim; eu nego) foi nada mais que um leve facelift, uma mudança visual que não trouxe, na prática, muitos elementos que diferenciassem o Orkut de seu principal concorrente.
Funcionalidades similares (comentários na linha do tempo) e outras irrelevantes (temas no perdil) parecem não terem sido suficientes para retenção de parte do público. A ausência de integração com outras redes sociais (talvez também em parte pelo desinteresse das outras ferramentas globais em uma integrarem suas plataformas a uma rede social presente, na prática, unicamente em três países), uma versão mobile sofrível e a perda do timing das ferramentas mobile em geral (até agora a única app para iPhone foi desenvolvida por uma empresa privada, Lemon Mobile, serve apenas para fazer upload de fotos) também não contribuem.
O Facebook, por sua vez, é acessado por 100 milhões de pessoas em um dos 70 idiomas disponíveis na versão mobile.
Não querendo pregar o apocalipse, o Orkut ainda é “A” rede social brasileira, ao menos considerando-se o volume de pessoas e tráfego.
A tendência de migração dos usários mais experientes para outras redes (que, em parte, também podem ser os influenciadores da massa), principalmente para o Facebook, contudo, não pode ser descartada. Certamente alguém no Google Brasil está buscando a resposta para este dilema. [Webinsider]
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JC Rodrigues
JC Rodrigues (@jcrodrigues) é publicitário pela ESPM, pós-graduado pela UFRJ, MBA pela ESPM. Foi professor da ESPM, da Miami Ad School e diretor da Disney Interactive, na The Walt Disney Company.
18 respostas
É impressionante como a trajetória de existência do Orkut é similar ao curso que o Brasil está tomando, com iniciação por pessoas possuidoras de conhecimento, educação e bom senso, havendo o “boom” de menos favorecidos de cultura a “seguir um líder” e o caminho para o caos pela falta de ética e inclusão de indivíduos menos idôneos e esclarecidos. Resumindo, os internautas brasileiros refletem a sociedade atual, onde a moralidade é banal, e praticar o certo é coisa de otário, bom mesmo é ser esperto e ter vantagem em cima dos outros.
Junto com a inclusão brasileira no Orkut, veio toda maldade que rege a cultura de nosso país, como por exemplo, pirataria, venda de produtos ilegais, divulgação de tutoriais de atos ilícitos, vagabundagem, agressões alheias, dentre outros… reflexo de nossa sociedade brasileira atual, ou você nunca se perguntou porque isso não ocorre no facebook em outros países?
Fico pasmo como ainda tem pessoas que confundem hipocrisia com a realidade, como esse tal de Gustavo. Infelizmente nem todos gostam de ouvir a verdade, no entanto, o comentário dele é no mínimo medíocre.
João Carlos Silveira
e rede internacional!!!!
falando do orkut ele ta vencendo e rede nacional o brazil e i primeiro no rang tomara que isso permanessa em milhoe em milhoes de anos, mas vamos a luta ficar em primeiro em milhoes e milhoes de anos o brazil é o melhor!!!!
Só não entendi porque substimou o Brasil assim?
“Mas voltando a falar do Orkut, se formos pensar a nível global, não haveria porque o Google investir tanto numa ferramenta que “deu certo em três países (ainda que um deles seja o Brasil)”.
Porque?
É bem estranho ver que parte das pessoas que falam tão mal do Orkut (não me referindo a você que escreveu o artigo), são as mesmas que passam horas por dia mandando recados cheios de baboseira ou fuçando na vida alheia. “Descem a lenha” na frente dos outros, bancando os eruditos que repudiam a baixaria, mas no escurinho do seu quarto (ou da lan-house) se embrenham pelo universo de bobajadas do Orkut (que poderia ser uma ferramenta muitíssimo melhor aproveitada, o que fica difícil levando em consideração a faixa etária e a educação dos usuários).
Acredito que se uma migração massiva dos usuários brasileiros do Orkut para o Facebook ocorresse, simplesmente haveria uma mudança de endereço de todas as mazelas. Tudo o que se faz de ruim lá seria despejado no Facebook.
E considerando o quanto os usuarios do Facebook devem se julgar melhores que os do Orkut (mais inteligentes, mais educados, mais cultos…), não seria de espantar que estes fugissem rapidinho pra qualquer outro serviço semelhante, que seria eleito o novo queridinhos dos hypados, só pra manter sua casta protegida. Afinal, “eles não se misturam com essa gentalha…”
ah é muita coisa pra mim, escrever.
resumindo: brasileiro falando mal de brasileiro é muita hipocrisia.
Prezados,
inicialmente obrigado pelos comentários. Também sinto que vale a réplica para alguns deles:
3o. Gustavo
A intenção não foi “descer a lenha” no Brasil; o artigo foi escrito baseado em conversas com usuários que migraram que rede social e na observação. Não estou e nem quero julgar comportamento x ou y, apenas descrever o fato
6o. Felipe
Também tenho minha opinião pessoal sobre prós e contras de cada serviço, contudo não há nenhum estudo ou pesquisa que comprove, endosse ou suporte esta percepção pessoal que você e eu temos em escalas diferentes
7o. gerson
ótima observação; e de fato isto já existiu qdo o Brasil conseguiu colocar um topic local nos TTs (o #zemayerfacts). não me arrisco a dizer que foi por isso, mas hoje os TTs são divididos por país/cidade 😉
8o. palavras
Se me permite, discordo de sua colocação. Ainda que o surgimento destes serviços sejam influência (e influenciem) um anseio da população, acredito que cada ferramenta tenha sua propriedade e utilidade, ainda que esta utilidade seja “apenas” entretenimento e comunicação.
11o. gustavo
Não sei se é o mesmo gustavo do 3o. comentario, mas de qualquer forma não ficou claro o porquê de sua revolta com relação ao artigo. Caso queira, estou à disposição para trocarmos idéias via Twitter (@jcrodrigues).
No mais, sigo acompanhando os comentários de vocês, muito bons! 😉
como acho absurdo nego alienado duplamente por tecnologia e por geografia, usar a boa relevância que tem pra alienar pela terceira vez o próximo…
veículos pós massivos são tão porcos quanto os massivos, isso é pânico na tv em forma de artigo!
Boa prof!
Sedimentou em um artigo um assunto que paira no ar e em ligeiros comentários. Nada mais precisa ser comentado a respeito, está tudo aí.
abs
Fiz meu Facebook em 2008, quando esse nome ainda soava estranho para a maioria dos brasileiros. Nem acessava muito. No começo do ano passado redescobri o FB ao usá-lo com mais freqüência e senti uma vergonha imensurável por ainda ter Orkut, tamanha é a discrepância entre os dois. Semana passada eu deletei o Orkut, finalmente. Esse papo de “ainda preciso dos contatos de lá” não cola. Manda uma msg pedindo nº de celular e e-mail de cada um e pronto.
Orkut e Facebook, são somente fenomenos temporais, como já tinha outros “grandes sites” e serviços na internet.
A grande massa na europa nem deu bola e usa muito pouco o facebook, ele é supervalorizado mas somente uma brincadeira para crianças que ainda não cresceram.
O único que traz valor é o TWITTER, que é uma ferramenta cada vez mais importante, tanto la na europa, como nos Estados Unidos e no Brasil e no final vai superar todos eles, pois o TWITTER oferece o que faltava em nossas vidas que nem ORKUT e nem Facebook tem.
Já pensou essa “massa” no Twitter? Os americanos vão querer matar esses gafanhotos…
Vc citou: “Por alguma razão que ainda desconheço, os Estados Unidos e boa parte dos países do mundo preferiram compartilhar suas informações pessoais, gostos e inquietudes através do Facebook”
Vc desconhece, mas eu conheço a razão disso: FB é muito mais robusto e mais rico no quesito funcionalidades, com isso se torna muito mais interessante usa-lo. Já o orkut, é sem dúvida, muito mais limitado!
Concordo plenamente e assino embaixo!
O orkut parou no tempo desde que foi lançado, na verdade. É uma ferramenta horrorosa que só tem a quantidade de membros alta porque no começo foi feita aquela campanha enorme e o orkut fez muito sucesso por ser novidade. Depois só foram entrando pessoas por causa da inclusão digital.
Classes A e B estão cada vez mais longes e ausentes do orkut, eu sou uma dessas pessoas que não suporta mais. É um serviço com péssima usabilidade, funcionalidades inúteis e pouquíssima evolução.
Facebook é o futuro (no Brasil, pois no resto do mundo é presente)!
Um abraço,
Felipe Gomes.
Concordo plenamente. Meses atrás fiz um artigo com esta mesma estrutura. O que o Rodrigo disse também é o mesmo pensamento que tenho. O “Novo Orkut” foi um “tiro no pé”. Expectativas foram criadas e nada de relevante aconteceu.
Abraços!
Ótimo artigo, tirando a parte que você utilizou ele Pra falar descer a lenha no brasil…
Pra mim foi a maior hipocrisia, embora também percebi o comportamento dos usuários como vc descreveu.
Ótimo post! Concordo plenamente! O pessoal do Google deve estar quebrando a cabeça para incluir novidades para reter seus usuários.
Exatamente Rodrigo, eu sou um destes usuários que só não deletou o perfil porque preciso manter alguns contatos ali.
Abraços!
Perfeito! Concordo integralmente.
E ainda em mais: a tentiva do Google em inserir algumas ferramentas do Facebook no chamado “Orkut novo” foi um tiro no pe (meu teclado esta sem acento).
Os usuarios que ja tinham Facebook migraram de vez e os que nao conheciam foram testar, influenciados pelos early adopers.
Pra sorte do Orkut muitos usuarios so nao deletam o perfil pra manter uma agenda de contatos com amigos que vc nao tem telefone/email e que “ainda” nao migrou pro Facebook.
Valeu!