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A imprensa em geral, sobretudo a de tecnologia, adora usar o termo democratizar o acesso. É pomposo. Democratizar o acesso à informação, levar a revolução digital para as massas e assim por diante. Um ufanismo coletivo.

Muitas vezes, esquecemos de olhar para o próprio umbigo e louvamos em demasia as novidades estrangeiras de democratizar o acesso.

Pela primeira vez, pude sentir na pele as agruras que são alguns projetos frustrados de inclusão digital. Um deles, o quiosque de acesso gratuito dos Correios. Projeto ambicioso –– desde 2000 e adiado inúmeras vezes –– que foi notícia em todos os jornais e na mídia internacional.

Entretanto, ao que parece, ainda não passa de um embrião.

Minha primeira vez (sem trocadilhos) foi uma decepção e uma alegria ao mesmo tempo.

A alegria…

Meu vôo estava marcado para 8h da manhã. Como de praxe, costumo virar a noite da véspera trabalhando, ou vendo filme, ou fazendo qualquer coisa que me mantenha acordado. Deixo para dormir durante o vôo, para mim é o suficiente e aproveito melhor o tempo. É um esquema que sempre deu certo. Ou melhor, dava certo.

Nesta última vez, porém, não consegui manter os olhos abertos e cochilei no meio da madrugada. No cochilo, esqueci de colocar despertador e perdi a hora. Acordo às 6h30. Tenho uma hora e meia para: levantar, tomar banho, arrumar a mala, fazer o backup dos emails e outros documentos importantes para levar em CD e, enfim, enfrentar o engarrafamento de 20km até o aeroporto.

Não preciso dizer que fui obrigado a pular várias dessas etapas. Sem banho, descabelado, a mala abarrotada de roupas sem a menor organização, deixei tudo para trás e chego no aeroporto dez minutos antes de o avião zarpar.

Acontece que, no backup em CD que sempre levo a tiracolo, estão a agenda de telefones, as matérias incompletas e um arquivo do Word que sempre faço antes de qualquer viagem – com os endereços, nomes e telefones dos contatos que precisarei fazer na cidade de destino. Imprimo esse papel, dobro, coloco no bolso e fico seguro. (nada com o bom e velho papel dobrado dentro da carteira!)

Sem o papel milagroso, estou ilhado. Não lembro o nome do hotel, não sei o endereço, não decorei o telefone. Não é o fim do mundo, mas é uma dorzinha de cabeça completamente desnecessária. Por outro lado, um problema facilmente resolvido se eu puder achar um cibercafé.

A idéia é tentar acessar o PC de casa, que fica ligado o dia inteiro com um programa “servidor”, para situações de emergência. A questão é: onde achar o cibercafé?

Meu vôo tem uma conexão no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, antes de chegar a cidade de destino. Acontece que… é incrível, não existe sequer um cibercafé em Congonhas. Isso mesmo, no segundo aeroporto da maior, mais rica e desenvolvida cidade brasileira, não tem cibercafé.

Até que me vem à cabeça: São Paulo, esta cidade enorme e desenvolvida, deve ter uma agência dos Correios. Será que aquele projeto do governo, sobre o qual tanto escrevi, resultou em algo? Afinal, há quase três anos se comenta. Em uma infeliz lógica comercial, deve haver indícios primeiro em São Paulo, antes de qualquer lugar.

Escondida no primeiro andar, lá estava. Toda bonitona e arrumada, ela me aguardava: a cabine de acesso gratuito à internet. Parecia dizer: “venha, Rebêlo, venha… me use!”

Foi uma alegria total. Em quinze minutos, consegui acessar meu próprio computador de casa (graças a um programinha gratuito de apenas 200k, o VNC), fiz um ZIP com todos aqueles documentos importantes e mandei para meu próprio email e, por fim, anotei o endereço, nome e telefone do hotel em um pedaço de papel qualquer.

Aliviado, só então me dei conta da monstruosa dor de barriga que eu estava desde que saí de casa nas pressas, sem tempo para resolver esse probleminha específico que perdurava até aquele momento. Computador não tem, mas felizmente banheiro é o que não falta em Congonhas.

…e a tristeza

A idéia dos quiosques é muito bacana. Cada pessoa tem direito a usar apenas quinze minutos de cada vez. Não é nada, mas é o suficiente para enviar um email importante ou verificar se mandaram um documento específico. Em alguns casos, é o suficiente para entrar no computador de casa e consultar a agenda.

O estranho é que em plena São Paulo, Congonhas, havia apenas uma cabine disponível. E em local bastante escondido. Tive que esperar 45 minutos para poder usar. E tive sorte, pois apenas três pessoas estavam na espera. Quinze minutos é pouco para quem usa, mas é muito para quem espera. Ainda por sorte, eu tinha três horas livres até o próximo embarque.

E se não tivesse? E as outras pessoas, que geralmente têm apenas uns trinta ou quarenta minutos disponíveis para esperar? Caso a agência dos Correios não fosse escondida em um desértico primeiro andar de Congonhas, creio que a fila para usar a desejada cabine fosse parecer fila de banco em dia de pagamento para servidor público.

O computador não era lento. Também, nem pode: usa Windows 95 e sem nenhum firewall. O máximo que há é um Norton Antivírus instalado. O Windows 95 é uma porta aberta para todo tipo de invasão. E sem firewall, pior ainda. Onde estão os técnicos dos Correios?

Fico pensando como seria interessante se o projeto desse certo. Mas, é difícil. Depois de tanto tempo, o site institucional dos Correios revela que os quiosques só existem na Grande São Paulo, no interior paulista e no Rio de Janeiro.

Tem gente que subestima demais as pessoas. Em Brasília, no Conjunto Nacional (ou naquele outro vizinho, que agora não lembro o nome) há um computador para acesso gratuito, bem no meio do shopping. Não é dos Correios. É apenas um computador, mas fica bem no meio, visível. A fila costuma ser enorme. Nem por isso as pessoas desistem de esperar. O tempo de uso é de quinze minutos também.

O projeto dos quiosques dos Correios é um, dentre tantos outros que existiram, que mais chances teria de dar certo. Vamos ver quanto tempo leva até melhorar. Ou a cair no esquecimento, como os anteriores.

Se é que já não caiu. [Webinsider]

Avatar de Paulo Rebêlo

Paulo Rebêlo é diretor da Paradox Zero e editor na Editora Paradoxum. Consultor em tecnologia, estratégias digitais, gestão e políticas públicas.

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