Queria uma transação, jogou fora uma relação

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Por que o consumidor não aceita mais ser incomodado? Qual a explicação para a repulsa crescente frente ao e–mail marketing, ao telemarketing, ao preenchimento de cadastros? Em todo mundo crescem as listas do Do Not Call, que na verdade querem dizer Do Not Disturb.

Se a estratégia está correta, se é a mensagem certa, para a pessoa certa, na hora certa, imaginamos que o desejo do cliente de ser informado também esteja certo. Mas, ou não está sendo feito o dever de casa direito, ou estamos diante de um colapso nunca antes visto pelo mercado de comunicação. O que acontece quando queremos falar, mas o cliente não quer mais nos ouvir?

Do ponto de vista de antropologia de consumo, no estudo de análise de mudança de comportamento do ser humano frente ao uso de novas tecnologias, estamos vivendo a era do New Brain (livro publicado este ano sobre o tema nos Estados Unidos e que traz uma explicação científica para os distúrbios gerados pelo excesso de informação e pelas novas linguagens multimídia, com interfaces convergentes e interativas).

A capacidade de processamento do cérebro humano não tem um limite biológico ou fisiológico, mas sim um limite emocional. Estamos atravessando um momento histórico da evolução humana em que o tempo deixou de ser analógico para ser um tempo digital. Não há uma coisa acontecendo de cada vez, mas sim várias simultaneamente. Nas telas de cinema, os diretores já inserem roteiros paralelos com divisão de imagem e cenas que acontecem de modo distinto e fazem o telespectador acompanhar duas histórias no tempo de uma.

Esse consumidor sem tempo, atarefado, que precisa cuidar da vida profissional, tem conflitos dentro de casa, não consegue cuidar de si mesmo, sente medo de estar desatualizado… Ele é sozinho, utiliza a tecnologia como resposta para todas estas inquietudes e está à espera de atenção. Esse consumidor e–voluído entende que cada minuto seu é mais valioso que muito dinheiro. Portanto, quando uma mensagem não autorizada chega à sua caixa postal, ele se sente lesado.

É importante entender o fator emocional e contextual do indivíduo, no momento em que ele é abordado, para podermos melhor utilizar as novas mídias e estreitar o relacionamento com ele, ao invés de destruí–lo.

Essa preocupação – e isso me preocupa -, nem sempre existe!

No afã de se conseguir realizar uma transação, onde o resultado medido e cobrado é financeiro e de curto prazo, corre–se o risco, cada vez maior, da perda de valor, da perda de relacionamento, da ação da marca virar–se contra ela mesma e, pior que isso, gerar contingência jurídica.

Questões como invasão de privacidade e spam estão cada vez mais freqüentes e o prejuízo para imagem da marca junto ao consumidor pode se tornar irreversível.

No Brasil, existem hoje 220 projetos de lei contra o marketing direto. Essa tendência é crescente e aumenta a comunicação anti–marca, com e–mail viral e com homepage que critica atuação indevida das marcas.

Existem, e poucas pessoas sabem disso, sites de denuncia para questões que apóiam o consumidor, desde o âmbito do Procon, até o “Fique de Olho” (que é governamental), ou o “Saco Cheio” (de iniciativa privada).

Mas por que as reclamações ocorrem mais por telefone e e–mail? Por que o canal de ida e vinda da mensagem é o mesmo. Há uma conexão em tempo real, em que a ação gera reação, pela mesma via – diferente dos outros meios como TV, revista, jornal, em que há um tempo diferido e o retorno do consumidor acontece por outro meio (no SAC ou na loja).

O que falta, talvez, e seja extremamente importante, é que a indústria se organize de modo a criar uma estratégia de resposta que mantenha aberto o canal de comunicação com o cliente. Do jeito que estamos, vamos enterrar a oferta dirigida, que é a melhor forma de falar com o cliente.

Quando falamos de Internet Banking, então, a situação fica ainda mais grave. A segurança, que o principal serviço oferecido por um banco, não pode estar arranhada, já que ela está diretamente associada à credibilidade daquela instituição e marca. A discussão passa a ser sobre “de quem é a responsabilidade pela segurança de informação do usuário”, que é um cliente que usa um serviço que tem como pressuposto justamente fornecer segurança do dinheiro eletrônico (transformado em dados).

As fraudes que ocorrem hoje atingem, em menos de 24 horas, um público potencial de 10 milhões de pessoas que usam banco na Internet. Isso é algo sem precedentes, tanto do ponto de vista jurídico quanto de comunicação para gestão de crise.

O crescimento da consciência de consumo no Brasil, com o exercício dos direitos do Código de Defesa do Consumidor há apenas 13 anos, com o exercício dos direitos individuais garantidos pela Constituição Federal há 15 anos, está criando um cliente digital informado, impaciente e crítico, que exige uma conduta ética e de respeito do seu tempo, sem invasão.

O caminho está no marketing permissional, na comunicação oportuna, de resultado e segura (feita por uma certificação digital). O lado humano da tecnologia é e sempre será o usuário. E a alma do negócio continua e sempre será o entendimento e atendimento do senhor da relação: o cliente. Por isso, eu pergunto sempre: perguntaram ao cliente? [Webinsider]

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Patricia Peck (@patriciapeckadv) é advogada especialista em Direito Digital.

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