Batatolina, como diria aquele personagem de Nelson Rodrigues: bastou entregar minha coluna anterior (Marketing de permissão: isso ainda é permitido?, ao lado) e na mesma hora caiu–me na caixa postal mais um e–mail… de permissão, claro.
Contradizendo quase tudo o que eu disse naquele texto, o remetente do e–mail foi claro e objetivo, dando o nome da empresa sem rodeios e oferecendo não uma proposta, mas, como dizia o subject de uma das mensagens, “você recebeu um convite”.
Resolvi abrir a tal mensagem. Afinal, a empresa foi transparente e educada: não me perguntou se eu queria ganhar alguma coisa, mas me fazia um convite. Sem entrar em muitos detalhes nem citar nomes (afinal, não pedi permissão à empresa), posso dizer que era um e–mail em HTML, mas bem leve (apenas 12k) e muito bem escrito. Ao final do texto, um link para que eu pudesse conhecer melhor o serviço que estava sendo oferecido. Um mouse–over me revelou que o link levava para uma página de HTML, e não um executável contendo algum vírus, portanto eu provavelmente não teria problema algum em clicar sobre o link e entrar no site em questão.
Até aí, tudo bem. O problema estava no rodapé da mensagem, logo abaixo do link.
Entre outras coisas, ele mencionava a seguinte informação: Em concordância com o ato S.1618, parágrafo III emitido pelo 105º Congresso Norte Americano, este e–mail não pode ser considerado abusivo (spam) pois inclui um link de cancelamento. De fato, havia um link de cancelamento logo após esses dizeres, mas, como já foi dito na primeira parte deste artigo, quem pode nos garantir que não receberei mais e–mails dessa empresa? A própria empresa? Infelizmente, estamos muito distante do tempo em que a palavra empenhada podia servir como garantia de alguma coisa.
Mas, como diz o velho chavão, há males que vêm para o bem. O que eu havia esquecido de dizer a vocês, caros leitores (mas a empresa que me mandou este e–mail me fez o grande e irretribuível favor de lembrar por intermédio desse rodapé), é a famosa jogada da Legislação Americana sobre spam.
Na verdade, o ato S. 1618 realmente existe, e passou no Senado dos EUA em 12 de maio de 1998. Mas o site americano Tech Law Journal alerta que esse ato não se tornou lei e considera que as empresas que o utilizarem como justificativa para envio de correspondência eletrônica não–autorizada estão fraudando o consumidor.
Mas se isso não for o bastante para incentivar uma empresa a não fazer isso, devo lembrar que a empresa que me enviou o e–mail era do Brasil, e não dos Estados Unidos. As leis de lá não vigoram aqui.
No Brasil, segundo Walkyria Menezes, consultora legislativa da Câmara dos Deputados para assuntos ligados à Comunicação Social, Informática,Telecomunicações,
Sistema Postal, Ciência e Tecnologia em seu documento Legislação Anti–Spam, publicado em junho de 2003, afirma que, apesar de várias propostas da autoria de deputados, ainda não existe legislação específica regulando a matéria.
Entretanto, como ela mesma salienta, “A inexistência de legislação específica, segundo alguns especialistas, não impede que se promovam ações contra os remetentes de spam, com base no art. 186 do Código Civil e no art. 286 do Código Penal. O primeiro dispositivo poderia ser invocado para punir aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral. No caso do Código Penal, a ação pode se basear no fato de que a Internet já pode ser considerada um serviço de utilidade pública e que o envio de spam pode pôr em risco seu funcionamento, ainda que parcial.”
Depois da palavra do governo brasileiro sobre o assunto, talvez nem fosse necessário dizer mais nada. Mas não custa reforçar tudo o que já foi dito com um último ponto:
Quinta regra: na web, o cliente (mais do que nunca) sempre tem razão. Na verdade, esta até poderia ser uma variação da segunda regra (não engane o prospect, publicada no artigo anterior), mas merece um espaço adicional para dar um puxão de orelha nos marqueteiros preguiçosos que lançam mão de um expediente mentiroso e constrangem o usuário mais desinformado.
Saiba convencer o cliente de que ele precisa do seu produto ou serviço, mas não use recursos como a legislação de outros países para, em última instância, dizer a ele que você tem razão e que ele não tem direito de reclamar depois. Isso implica, por dedução, a dizer que o cliente não tem razão, que ele não está certo. E esse é um dos maiores erros que você pode cometer na hora de anunciar o seu produto. [Webinsider]
Corte transversal: em agosto darei um curso de extensão no Centro Universitário de Belas Artes de São Paulo. O tema: Webwriting – Redação para a Web. Para quem não fez os meus cursos da série Webinsider no ano passado, esta será uma boa oportunidade. Estou esperando vocês!
Fábio Fernandes
Fábio Fernandes é jornalista, tradutor e escritor. Na PUC-SP, é responsável pelo grupo de pesquisa Observatório do Futuro, que estuda narrativas de ficção científica e a forma como elas interpretam e são interpretadas pelo campo do real.