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Parafraseando Nelson Rodrigues, os idiotas da objetividade que me perdoem o clichê, mas se você não tem mais “sacco” para ler gibi de super–heróis, seus problemas acabaram. Uma história de Sarajevo é a solução.



Joe Sacco – jornalista maltês magro, tímido e míope que lembra uma versão européia de Renato Russo – continua suas idas e vindas pelo mundo. Neste álbum mais recente publicado no Brasil, Uma história de Sarajevo (Conrad, 2005), seu foco se desloca ligeiramente de outro álbum igualmente contundente, Gorazde, onde focou a limpeza étnica da Bósnia no início da década de 1990.



Ao invés de uma visão mais vaga e fragmentada do conflito, como nos álbuns sobre a Palestina e Gorazde, Sacco desta vez nos mostra não a frente de batalha, mas reminiscências mostradas pela boca de Neven, um guia que o acompanhou em sua última visita à região, em 1995, alguns anos depois de o conflito ter acabado.



Evidentemente, as seqüelas não desaparecem. Mas o bom de Sacco é que ele não se prende a elas como um jornalista marrom, sequioso por qualquer detalhe sórdido. Ele quer é o lado humano da coisa. E é o que ele nos mostra.



Seu traço é feio, seus personagens têm defeitos, não são musculosos, mas têm narizes e orelhas grandes, eventualmente algum jovem mais bonito ou bem–apessoado. Mas não é para agradar editores ou leitores fanboys. Sacco desenha o que vê. E a guerra que ele vê não é bonita.



Se em Gorazde, Sacco fazia parênteses para comentar a alienação das meninas que, no meio de tanta insanidade de guerra, faziam de tudo para obter pares de jeans americanos, em Uma história de Sarajevo ele conta a história de pessoas que estiveram no front e participaram de atrocidades. E tentam sobreviver no pós–guerra servindo de guias e contando histórias sobre suas próprias participações no front – que podem ser verdadeiras ou não.



Tirando a questão da guerra, qualquer semelhança com a sobrevivência dos brasileiros no cotidiano da malandragem e da economia informal não é mera coincidência. Estamos num mundo globalizado, lembram? Sacco nos ajuda a não esquecer.



Mas não espere um libelo antibelicista. Sacco se coloca como participante, não lutando, apenas registrando, mas sentindo medo e se identificando com seus personagens. Ele sabe que poderia estar lá no lugar deles, ser um deles, ter de lutar pelo pão (ou pelos cigarros) de cada dia da maneira que fosse possível. E não os julga, pois não sabe se faria a mesma coisa no lugar deles.



Nem nós, leitores confortavelmente refestelados em nossas poltronas. Nem nós. [Webinsider]



Avatar de Fábio Fernandes

Fábio Fernandes é jornalista, tradutor e escritor. Na PUC-SP, é responsável pelo grupo de pesquisa Observatório do Futuro, que estuda narrativas de ficção científica e a forma como elas interpretam e são interpretadas pelo campo do real.

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