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Eu tenho lido bastante sobre o PC Conectado ultimamente. Para quem não sabe do que se trata, o PC Conectado é uma forma que o governo encontrou de promover o que se chama de inclusão digital, permitindo que algumas pessoas que não poderiam ter um computador comprassem um a custos reduzidos por conta de isenções de impostos e subsidio a financiamentos.

Por se julgar moralmente inaceitável que o governo promova assim o software proprietário de uma empresa específica (e por conta de um engajamento poderoso da comunidade que defende o uso de software livre), o PC Conectado vem apenas com software livre.
E aí começa a parte divertida.

Pegando o jeito

É importante lembrar que quase ninguém fora da supramencionada comunidade tem alguma noção correta (abundam noções incorretas) do que, na verdade, é software livre. É de fato um conceito espinhoso, multifacetado e, por conta também da dita comunidade – que como toda boa comunidade de libertários, não consegue concordar em muitas coisas –um pouco mais confusa do que precisava ser.

Para um leigo, a escolha do Linux pode parecer estranha. Afinal, existem versões simplificadas do Windows (Home, Starter Edition, CE, Embedded). A coisa fica mais clara quando você entende que, para maximizar seus lucros (o que é normal para qualquer empresa, mesmo as boazinhas), a Microsoft quer incentivar você a comprar o modelo mais caro.

Ela faz isso colocando nos seus programas limitações artificiais – o Starter Edition só abre três programas por vez, não usa mais memória do que um máximo e falha se for rodado em um processador “bom demais”.

O Home Edition tem problemas crônicos com redes corporativas e não adianta argumentar com o instalador – você não vai rodar SQL Server no seu XP Professional como se fosse um 2000 Server ou 2003.

Pois bem – todas as limitações do software livre são naturais e conseqüências da tecnologia empregada. Se ele não faz uma coisa, não é porque o departamento de marketing quis (ou não quis) ou porque uma determinada divisão precisa cumprir alguma meta. E, de quebra, mesmo o mais limitado dos Windows tem um custo de licença infinitamente maior que o mais sofisticado dos Linuxes.

O papel da mídia

Na semana passada chegaram às minhas mãos (aos olhos, tecnicamente), dois vibrantes exemplos (Micro de programa PC Conectado tem configuração simplória e Linux complica operação de máquina do PC Conectado) da conspícua incapacidade da mídia especializada (que, como o nome diz, devia conhecer o assunto sobre o qual escreve) em sacar o que é, afinal, software livre. Pô… Não dá mais nem pra chamar software livre de novidade.

Em ambos os casos, vemos um certo nível de “esquizofrenia” – ninguém parece saber direito pra quem é o tal PC Conectado – reclama–se de que a memória é pouca (e é) e que a compatibilidade é ruim.

Não consigo entender porque ser compatível com minha webcam, com minha impressora ou com chaveiro USB é tão fundamental assim pro PC Conectado – e pro Linux que vem nele. O Windows XP, por exemplo, não é compatível com minha câmera digital. E daí? Eu me viro muito bem com um drive USB de cartões Compact Flash, que eu posso levar do Windows pro Linux pro Mac e todos entendem.

O PC Conectado foi concebido para ser o primeiro micro de alguém. Se alguém não tem um micro, parece improvável que tenha uma impressora, webcam, scanner ou chaveiro USB. Se ele se destina a incluir pessoas que não têm micro, qual a diferença da interface dele parecer (e é parecida sim) ou não com o Windows?

O medo e o preconceito

Minha experiência mostra que muitas dessas coisas tendem a “simplesmente funcionar” quando usadas. A impressora que eu uso em casa é uma obsoleta (e indestrutível) HP Deskjet e ela aparece na lista de drivers de impressora. A HP Laser colorida do escritório, novíssima e moderníssima, idem. Mesmo que não aparecessem, a primeira é uma impressora que fala PCL (uma linguagem de controle de impressoras inventada pela HP) e a outra é fluente em PostScript (uma linguagem de controle de impressoras inventada pela Adobe). Eu não preciso saber mais do que isso para colocar qualquer uma das duas pra trabalhar.

Ainda assim, um usuário leigo vai precisar de um manual para configurar impressoras, do mesmo jeito que precisaria de um para fazer isso no Windows (está bem – eu estou cedendo à tentação de considerar o Windows uma referência contra a qual medir qualquer outro ambiente gráfico).

Algumas outras coisas nos textos também me chamaram atenção. O conceito de “usuário administrador”, “root” ou assemelhados é, normalmente, estranho ao usuário Windows (embora possa não ser estranho a um usuário “virgem”). Explicar essas coisas básicas em um folheto não faria mal algum.

O Macintosh, que é o paradigma de usabilidade (não é o Windows que ia estar nessa posição, claro) volta–e–meia pede a senha do administrador (pode ser a senha do usuário logado mesmo) apenas para garantir que, antes de um programa fazer algo potencialmente estúpido com o computador, seja necessário que um humano dê seu aval. O Windows estaria livre de metade dos seus vírus se isso fosse necessário “Deseja instalar o programa Adolescentes Do Sexo no seu micro? [Sim] [Não]”

O PC Conectado não é isento de problemas – o hardware examinado não é exatamente o mesmo do definitivo, mas as escolhas de configuração do monitor me preocuparam um pouco. Já que se trata de uma configuração casada (devem estar vendendo o micro junto com o monitor, teclado e mouse), eu espero que seja feito um ajuste fino no sincronismo do monitor e na placa de vídeo.

É risível que o jornalista responsável reclame que o OpenOffice não grava seus arquivos nos formatos doc, xls e ppt… Ele não entendeu que uma das virtudes do PC Conectado é que você não precisa de um Word, um Excel ou de um Powerpoint. Usar esses formatos fechados, secretos e proprietários acabaria por criar problemas de compatibilidade. Quando você receber um .sxw (é essa mesmo a extensão? …não lembro de cabeça), vá até Openoffice.org e baixe um. Tem em português e é grátis (além de livre).

Descobertas

Tá. Até concordo que, ao optar pelo Linux do PC Conectado o usuário estará embarcando em uma “aventura”. Mas entenda essa aventura como algo positivo – é uma aventura por terras inexploradas (90% dos usuários de PC nunca usou algo que não fosse Windows) e, eu preciso acrescentar, muito ricas.

Ao usar um PC Conectado, o usuário vai, forçosamente, aprender um pouco mais sobre como funciona seu computador do que um usuário de Windows ou Macintosh. Vai entender que internet não é um “e” azul, que e–mail não é um envelopinho. Vai ver que spam pode ser filtrado automaticamente no cliente de e–mail e vai notar que MSN não é o único instant messenger que existe.

Vai entender que o computador tem “usuários” e que cada um tem as suas configurações, seus arquivos e que um não pode ficar xeretando nos arquivos dos outros. Vai poder acompanhar os pedaços do sistema operacional sendo carregados e entender que, enquanto a barrinha verde do Windows enche, na verdade, um monte de coisas está acontecendo dentro do computador. É um instrumento educativo.

Se o dono levar jeito pra coisa, vai poder instalar servidores de web, de aplicações, de bancos de dados, de e–mail, compartilhar a internet com outros computadores… à vontade. Tente fazer isso com alguma das alternativas que o mercado propôs.

Vai, em suma, receber um computador novo. Não é nem melhor, nem pior que um PC rodando Windows ou um Macintosh. É diferente. Se computadores são “máquinas universais” que podem simular outras máquinas, o software livre é o “software universal” – que pode ser montado e configurado para fazer o que o usuário quer, não o que o fabricante do software permite.

O que o usuário não vai aprender

Tem uma coisa importante que o usuário não vai aprender com o PC Conectado. Ele não vai precisar piratear programas.

Porque, se você olhar direito, a imensa maioria dos Offices, Words e afins que existem por aí são piratas. É assim porque os usuários acham que precisam, porque cedo ou tarde vão receber um .doc que não abre direito no WordPad, porque o camelô da esquina vende por R$10 e porque é melhor pra Microsoft que você pirateie um Word do que você experimente um OpenOffice (ou WordPerfect, a propósito).

Parágrafos pra trás eu comentei dos formados doc, xls e ppt… Pois é – eles são “padrão de mercado” porque quando o usuário não tem dinheiro para comprar um Word na loja, ele compra no camelô e usa do mesmo jeito. De pirata em pirata, todos acabam usando e está formado um “padrão de mercado”. Isto aliado à pressão sobre grandes usuários e a uma certa tolerância contra o pequeno pirata gera uma invejável fonte de receita.

Pois é. Isso é meio que um insulto para quem ganha a vida escrevendo software. O OpenOffice custa nada não porque você está, tecnicamente, roubando o produto. Ele custa nada porque as pessoas que o fazem estão dando ele pra você. Assim, de presente. É de quem quiser. Software não é que nem carro ou televisão, quando você dá o seu, você fica sem. Software é como conhecimento. Quando você dá o seu, os dois têm. É o milagre da multiplicação das idéias.

Meus gostos pessoais

Depois de anos usando software livre ao lado do Windows e do MacOS eu me acostumei com essas liberdades. E eu acho que mesmo os usuários novatos vão acabar gostando à medida que forem aprendendo.

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Adendos

Eu escrevi esse texto em um PC rodando Gnome e Debian GNU/Linux. Escrevi o texto usando o Kate, um editor de textos do KDE. Editei esse texto diretamente no meu servidor Zope, via WebDAV (uma invenção, se bem me lembro, da Microsoft), que está rodando em um servidor, de forma totalmente transparente. Eu tenho até medo do tamanho da lista de programas que eu ia precisar ter e dos passos que eu ia ter que dar só pra fazer a mesma coisa em um PC com Windows.

Meu amigo Leo diz que o lance do chaveiro USB é interessante. No Ubuntu dele pula uma janela no segundo em que o brinquedo é espetado na porta. Eu já vi a mesma coisa no Fedora e no Mandrake, hoje Mandriva (Debian, Ubuntu, Fedora e Mandrake são distribuições de Linux – outra hora eu explico melhor). Meu palpite é que devia ter pulado a janela e não rolou porque o computador não era o modelo “oficial” e o kernel (que é o “miolo” do sistema operacional) devia ter sido montado especialmente para o outro micro. [Webinsider]

Avatar de Ricardo Bánffy

Ricardo Bánffy (ricardo@dieblinkenlights.com) é engenheiro, desenvolvedor, palestrante e consultor.

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Uma resposta

  1. Eu depois de ter testado varias distrus posso dizer que a escolhida para o pc conectado é devidamente incorreta e so levara infelizmente o usuario a procurar uma solução mais simples e ele carregarrá uma impressão muito negativa sobre o linux ao ver o que o Ruimdows pode proporcionar sem inumeras coisas repetitivas do que existe no pc conectado.

    Nele só pude constatar uma triste realidade que existe inumeras soluções para mesma coisa, encontrei varios tocadores de musicas, de video, messengers etc.

    Tenho certeza que se a comunidade já tivesse percebido que a união faz a força por exemplo teriamos algo como um Mplayer com uma interface do Rhythmbox que então uma ferramenta faria as duas coisas muito melhor, que na verdade ja fas mais so tocar nao adianta. Algo que o concorrente ja percebeu fais muito tempo.

    Foi uma escolha muito mal feita nem mesmo o sistema de restauração funciona.

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