Gilberto Galan
O período que hoje o Brasil vive é bastante propício à discussão sobre a escolha do modelo de software pelos governos. Há atualmente uma clara divisão de opiniões que chega a afetar a indústria brasileira de tecnologia.
A recente saída de Sérgio Amadeu do ITI (Instituto Nacional de Tecnologia da Informação), até então autoridade máxima do governo brasileiro na adoção e implementação de software livre, trouxe à tona a possibilidade da retomada do debate sobre a questão em bases mais imparciais.
O País pode se orgulhar de seu setor maduro e experiente de software, que se apresenta com sucesso tanto aqui como no exterior. Infelizmente, o debate fragmentado, como vem ocorrendo, sobre se o governo deve favorecer abertamente um ou outro tipo de software, em vez de contemplar todos os tipos, está interferindo nos fatos e distorcendo o mercado.
É indiscutível que o software é um assunto prioritário, conforme expresso por várias autoridades federais, já que hoje é praticamente impossível conceber qualquer setor importante das atividades que nos afetam sem que, por trás, de modo sutil e invisível, esteja algum tipo de software.
Em termos de modelos, de um lado está o software livre, cujo código fonte pode ser livremente acessado, modificado e distribuído pelos usuários. De outro está o software comercial, que consolida a inovação tecnológica com a rigorosa proteção dos direitos de propriedade intelectual.
Ambos os modelos têm suas qualidades e limitações e fornecem soluções competitivas para os consumidores dos setores público e privado. Sobre isto, todos os lados parecem concordar.
O software comercial vem recebendo a sua quota de críticas neste debate. Um dos mais constantes erros que eu percebo se relaciona à abertura do código fonte dos programas de computador. Alguns debatedores acreditam que o software comercial nunca deve ter o seu código aberto. Isto, naturalmente, é incorreto.
Em um recente artigo a favor do software livre, o autor mencionou as urnas eletrônicas; que esta excelente tecnologia resulta do código aberto. Está claro que ele não estava ciente de que o sistema em questão era comercial por natureza e não um software livre.
O autor, entretanto, acertou ao dizer que o código fonte fora aberto. É notório que o desenvolvedor do software de votação permite que os seus programas sejam analisados para fins de auditoria e, para esta finalidade, inspecionados. Isto assegura a verificação da integridade e da segurança do software para os administradores governamentais e para o público, com acesso garantido às autoridades do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e aos representantes dos partidos políticos.
Em um sentido mais geral, o software comercial está longe de ser “a caixa preta” do setor de tecnologia da informação. De fato, é o fundamento sobre o qual a maioria da indústria se baseia. Alguns legisladores ainda não percebem isto, acreditando que o modelo de software livre atenderia sozinho a todas as necessidades do País. Uma vez que o poder governamental, com o seu enorme poder de indução, emite um importante sinal ao setor, esta visão distante da realidade é, conseqüentemente, um risco para o mercado, já que impede a preparação de uma estratégia praticável que compare todas as opções antes que as decisões sejam tomadas.
Para grande parte da indústria de software aqui e no exterior, os direitos de propriedade intelectual tornam as transações do software comercialmente viáveis, permitindo que companhias e indivíduos recebam o retorno dos seus investimentos.
Muitas coisas positivas têm sido ditas a respeito do modelo de software aberto. Vale apenas ressaltar que também há muitos pontos positivos para se falar sobre o software comercial.
O que parece ter se perdido no debate, entretanto, é que o software livre e o comercial podem juntos – e já o fazem – fornecer as soluções de que o governo necessita. Não há necessidade de se optar por um ou outro modelo, por meio de políticas públicas ou leis de preferência. Em outras palavras, o modelo de software por si só não garante o sucesso. Cada caso demanda uma solução diferente, baseada nos seus próprios méritos.
Se, como apregoam algumas autoridades dos governos, nas instâncias federal, estadual e municipal, soluções baseadas no software livre já estão sendo adotadas com sucesso sem que tenham sido apoiadas em leis ou políticas formais de preferência, por que todas as partes interessadas deveriam estar perdendo enorme tempo e energia no debate esses tipos de políticas e de projetos de lei? Não há o menor sentido.
Há diversos ângulos que devem ser analisados para que possamos ter uma visão concreta sobre como o Brasil pode melhorar na área de desenvolvimento de software e em negócios de tecnologias da informação. É necessário levar este debate objetivamente, de modo a oferecer aos administradores do governo todas as ferramentas necessárias para que as compras de software tenham o melhor custo–benefício, trazendo vantagens para o governo, os cidadãos e a indústria de software.
Webinsider
Artigos de autores diversos.