Uma das grandes dificuldades que vejo as agências tradicionais sofrendo, resulta da mudança de cenário onde as disciplinas se confundem e aquela estrutura tradicional da agência passa a perder o sentido. Entre as mudanças, está o crescimento de uma porção produtora dentro da agência.
Não é um problema sentido nas grandes agências digitais porque elas já nasceram com uma parcela grande de produtora. Diferente do histórico das agências que é agenciar, nas digitais, especializações como gerência de projetos ou controle de qualidade não são novidades.
Por mais criativos que sejam, a fórmula utilizada em veículos de massa tende a fugir da tradução literal de projeto, que obrigatoriamente envolve as palavras ?temporário? e ?único?. Antes que alguém reclame, digo temporário e único em relação ao projeto, não ao conceito, a criatividade ou a campanha.
Projetos verticais
Dando apenas um exemplo bobo: um site institucional pode conter dezenas de textos, dos mais variados tipos, tamanhos, sabores e pior, variados processos. Briefing e aprovações em tempos diferentes com processos únicos. Enquanto alguns precisam passar pelos gerentes de produto, outros precisam da aprovação do departamento legal. Enquanto alguns são mais vendedores, outros são mais jornalísticos. Algumas vezes envolvendo tradução e localizações, e por aí vai.
Em agências digitais, os trabalhos são muito mais verticais, por isso a necessidade do profissional de projeto. Não é desdém ao pessoal do tráfego, mas é que são trabalhos distintos. Um pinta paredes, o outro restaura quadros. Pintar paredes é muito mais árduo, mas restaurar quadros requer conhecimentos e especializações para não causar estrago na obra. Sem nenhum juízo de valor ou preconceito na metáfora usada. Se você precisa de um pintor de paredes, o restaurador será caro e pouco útil para você.
Processo matricial
A mistura de disciplinas traz nova complexidade para a agência. Os projetos se tornam mais complexos, mais diversos e envolvendo cada vez mais ?ciências?. Além das especializações mais comuns, uma salada russa de novidades como arquitetura de informação, inteligência artificial, syndication, conteúdo colaborativo, SEO, guerrilha, jogos, viral, ARG, etc.
A seqüência atendimento, planejamento, criação, produtora passou a não funcionar tão bem. O processo, que antes tinha grande linearidade começa a mudar. O planejador precisa sentar junto com a criação, a mídia junto com o planejamento. Na verdade, todos precisam sentar juntos.
Não é falta de processos, é um processo mais matricial. Não adianta o criativo pensar em algo para depois a tecnologia enterrar o projeto por ser muito custoso ou por ser inviável entregá-lo no prazo.
Alguém pode dizer que é impossível ter projetos em agências por causa do caos que vivemos. As coisas caem de pára-quedas enquanto clientes e criativos mudam tudo sempre na última hora. Sem contar os malditos prazos que surtariam qualquer gringo. Mas isso é balela, o caos existe igual nas agências digitais e a disciplina de projetos funciona muito bem, obrigado. É um caos controlado.
Aliás, deste caos vem a maior dificuldade de contratar profissionais de projetos para o mercado de comunicação.
Cultura
Claro que o caos atrapalha pra cacete, mas na minha opinião, o maior problema não é ele. Não adianta simplesmente contratar um gerente de projetos para uma agência funcionar melhor.
O gerente de projetos é apenas parte do trabalho. É preciso criar uma metodologia adequada para este novo cenário. E mudar a cultura de uma empresa não é fácil, principalmente implementar uma metodologia, que é visto por muitos apenas como burocracia.
Nos papéis descritos para o profissional de projetos está o de pensar, monitorar e reportar. Mas ter um dedo duro na agência para apontar culpados não resolve. A equipe de projetos precisa ter poder para manter custos, escopo e prazos na linha.
E sabemos que a divisão dos poderes dentro de muitas agências costuma ser bastante desproporcional. Esta desproporção não dificulta somente o trabalho do gerente de projetos. Dificulta também o trabalho de equipes que fazem parte do core business da agência, como o planejamento.
Isso significa mudar toda a maneira como algumas agências estão estruturadas hoje. O trabalho não é pequeno, muito menos agradável. [Webinsider]
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Ricardo Cavallini
Ricardo Cavallini é profissional de comunicação interativa, autor do livro O marketing depois de amanhã.
6 respostas
Excelente artigo.
Vivi o lado de Gerente de TI em um jornal e conheci parte do processo de venda/captação de anúncios e realmente é muito dinâmico. Somente gostaria de comentar um ponto de vista, onde a aplicação de metodologia de gerenciamento de projetos em agências tem que ser muito bem medida, devido a velocidade exigida e também pelo cuidado com o que é projeto vs o que efetivamente poderia ser um processo. Creio que um dos maiores benefícios de metodologia de GP é na visão de Gestão de Riscos, gostaria de poder discutir com o autor como explorar este tema em um próximo artigo.
Ótimo artigo,
Por fim, não me acho um estranho num ninho. Gestão de projetos faz bem até para qualidade de vida dos funcionários.
Pena que não seja realidade das agências.
Muito legal a reflexão deste artigo.
No meu ponto de vista, cada empresa procura se espelhar nas melhores empresas benchmarketing, e acho muito valido o que Walmar fala sobre Metodologias de Produção, cada empresa deve criar a sua própria metodologia, pois então inseridas em regiões diferentes, com clientes diferentes, e com culturas diferentes. A adequação sim, acho que deva ser o crucial para o sucesso.
Um abraço a todos, muito boa essa discussão!
T+++
Ao meu ver, sobre buscar conceitos já definidos e nos adaptar, como diz Walmar na resposta acima, concordo em partes. Busco esse tal conhecimento para minha agencia, e ao mesmo tempo criar novos conceitos que atendam perfeitamente nossa realidade, conceitos que podem ser adapdatos a outras agencias, valorizo mais essa segunda posição.
Estamos passando justamente o que o Ricardo comentou em seu post, é uma fase MUITO complicada, porém devemos tirar proveito de todo processo, pois em alguns anos estaremos passando pelo mesmo processo, porem numa proporção maior, e nossa análise lá no começo de criar novos padrões e busca de conhecimento faz com que tiramos de letra a cada nova mudança.
Concordo com o Jean. Atualmente já existem muitos estudos sobre metodologias de produção que podem ajudar as agências, desde metodologias bem planejadas até outras mais imediatistas, basta escolher a que se encaixa melhor, adaptar e – o mais importante – fazer todo mundo segui-la.
Muito bom seu artigo Ricardo. Só uma questão: não é necessário uma agência criar uma metodologia do zero. Muitas vezes o que acontece é a customização de uma metodologia ou o cruzamento de diversas metodologias a fim de organizar um processo nas empresas. E claro, o que funciona para uma agência, não necessária irá funcionar em outra. : )