TV digital coloca a propaganda em um dilema

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Enfim, a TV digital entrou em funcionamento no Brasil, após muitas discussões sobre padrões e formatos.

Todas as emissoras já adaptadas a este novo padrão de transmissão (e recepção) do sinal televisivo gabam-se, neste momento, de possuírem imagem e som com qualidade similar a de aparelhos de DVD, como se esta percepção fosse crucial ao estilo de vida de um consumidor médio.

Os primeiros aparelhos capazes de captar e reproduzir o sinal digital são vendidos a cifras consideráveis e um novo mercado tomou forma, o de conversores de sinais analógicos, para reduzir um pouco a crise existencial de quem acabou de comprar aquela TV de plasma com 52′ que não processa o sinal digital.

Prender-se unicamente à qualidade de transmissão é subvalorizar, contudo, a potencialidade de digitalização na transmissão da informação e, ao que parece, esta é a única possibilidade comunicada pelas grandes redes às massas.

Qualquer conteúdo que possa ser digitalizado é mais facilmente controlável, digo, está mais suscetível à manipulação, alteração e propagação. Desde o surgimento do MP3, a indústria fonográfica passa por uma crise, tentando criar mecanismos para impedir a propagação de softwares P2P e da livre distribuição de músicas pela rede. Não fazendo apologia a nenhuma prática, mas tendo um olhar isento sobre a situação, qualquer iniciativa no sentido de coibir tal prática será inútil. O conteúdo digital é composto de bytes, intangíveis e, portanto, não cerceáveis.

Não entrando no mérito da questão acima, a digitalização da transmissão televisiva nos oferece algo muito maior do que imagens mais nítidas – nos oferece a possibilidade de manipular, alterar e propagar seu conteúdo. Na prática, qualquer televisão poderia comportar-se, inicialmente, como uma TiVo, ou seja, seria possível gravar, pausar, acelerar, retroceder qualquer programa de televisão que estivesse sendo exibido. Em breve veremos televisores sendo vendidos “com HD de x Tbs”. A customização da grade televisiva também é possível a partir do momento em que cada programa não passa de 0s e 1s. O Joost já pensa nisso desde sua criação e, agora, seu conceito poderá ser levado às grandes redes de televisão.

A digitalização de conteúdo televisivo abre uma gama de possibilidades para distribuição e manipulação de conteúdo, algo próximo do que o surgimento do conceito de internet trouxe para o mundo da informática.

Consideremos que, num dado momento, os telespectadores deixarão de ser passivos com relação à programação que lhes é apresentada e passem a interagir com ela, num primeiro instante apenas customizando-a e determinando o que é ou não relevante. Por exemplo, poderíamos escolher não assistir programas de esporte ao meio-dia e, em seu lugar, exibir os episódios de Friends. Num segundo momento, parodiando o que se chama de ?web 2.0? (que, como havia dito anteriormente, nada mais é do que efetivamente a aplicação do conceito de rede à internet), usuários poderiam montar seu próprio canal de TV e colaborarem com a programação das grandes redes.

Além de termos controle sobre o que nos está sendo exibido, pode-se também pensar na interação comercial entre espectador e programa. A princípio vamos pensar numa operação de e-commerce integrada à publicidade apresentada na TV: pausa-se o programa em exibição e, com o controle remoto, pode-se adquirir online o produto que está sendo apresentado em um anúncio (ou coloca-lo em sua lista de desejos, ou solicitar mais informações, ou navegar no website da empresa em uma tela PIP – Picture-in-picture); a compra de um determinado produto também pode ser feita em meio a uma programação comum: gostou do telefone que está sobre a mesa de centro durante a cena daquela novela? Clique e compre, depois volte a assistir o capítulo do dia.

Nada disto é oferecido pelas concessionárias de TV porque elas ainda não sabem como operacionalizar e aplicar este modelo de negócio a uma mídia que, há mais de 80 anos, desde o primeiro invento de John Logie Baird (e a transmissão de uma imagem do Gato Felix) está acostumada a tratar seus espectadores como seres passivos, cuja única interação, até então, era o clique do controle remoto para mudar de canal ou aumentar o volume.

Num âmbito onde o usuário decide o que quer assistir como a propaganda estará inserida?

Além da customização da transmissão televisiva, à primeira vista, é de se supor que, havendo a possibilidade de eliminar qualquer conteúdo publicitário, ninguém (à exceção de publicitários) permitirá com que fossem exibidos filmes de produtos em sua programação. O que faremos então? Criar um opt-in para a publicidade? Ou seja, ?quero assistir somente comerciais das seguintes empresas: x, y e z?, lá se vão os conceitos atuais de cobertura e freqüência em mídia; a cobertura será igual ao número de usuários que optaram por assistir à seu filme publicitário e a freqüência às vezes que ele decidiu assisti-lo (alguém assistiria a mesma comunicação publicitária mais de uma vez se não fosse forçado?).

Pode ser uma saída interessante mas, caso o opt-in fosse implementado em massa, como uma nova marca ou novo produto seria conhecido se não existem usuários que optaram por não conhecê-los e relacionarem-se apenas com aquelas empresas ou produtos que já estão familiarizados? Neste momento entra um discutível aspecto da propaganda como entretenimento e utilidade, a ser abordado em futuro artigo.

Pense nas discussões e mudanças causadas pela digitalização de conteúdos em áudio (MP3, iPods e afins) e, a isto, potencialize o impacto na mídia que ainda é a mais consumida no mundo todo. [Webinsider]

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Avatar de JC Rodrigues

JC Rodrigues (@jcrodrigues) é publicitário pela ESPM, pós-graduado pela UFRJ, MBA pela ESPM. Foi professor da ESPM, da Miami Ad School e diretor da Disney Interactive, na The Walt Disney Company.

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4 respostas

  1. Preciso saber onde acho o novo anúncio de um cara que vai nas lojas ver preços, e sai fazendo uma dancinha engraçada, dizendo: já éééé….
    Acho que é do mercado Livre, ou do Que barato!
    Só passa em canais fechados…
    Vc sabe onde acho?

  2. Acredito que algo semelhante ao Surface da Microsoft irá terminar o impasse criado entre a TV digital e o PC, pois realmente a TV está querendo se tornar um computador, enviando e recebendo mensagem, utilizando código binario, enviado via internet, basicamente isso, assim como o computador veio querendo se tornar uma TV, com placas de captura e etc..

    Barebones já estão sendo utilizados em algumas salas, isso é o presente, não é tanto o futuro, alguém sairá perdendo, mas como eu digo, ninguém some do mercado, simplesmente muda o foco, as agências não criarão peças de 30s, mas irão criar promoções interativas, utilizando uma webcam na própria TV, etc..

    O mercado está aberto, e acredito que temos pessoas qualificadas para suprir a necessidade, lógicamente o anunciante irá ter que aprender que o importante será a divulgação, interação e agregação de valor à sua marca, independente do veículo.

    Discussão forte, irei falar sobre isso no meu blog daqui uns dias heheh

    Att.

  3. Estranho. Por que não ficamos todos só com a internet então? Pra quê TV Digital? No final vai dar na mesma, parece que as duas coisas são na verdade uma só, o que muda é a tecnologia e isso é o item de menos relevância…

  4. Olá JC.
    Muito bom material e interessante teres tocado no assunto.
    Acredito que com o tempo a TV Digital não crie dilemas para a indústria da propaganda, mas sim que crie novos meios de anunciar e aprimore outros.
    Será aprimorado, por exemplo, o merchandising… Ao invés de a Coca-Cola criar um take de 30 segundos para os intervalos comerciais, embutirá sua mensagem na programação, como já vem fazendo há alguns anos.
    A propaganda built-in apenas será melhorada e utilizada sem tanta parcimônia, como hoje.
    … e por falar em propagandas built-in, o que podemos dizer sobre 007 e seu Aston Martin, ou da lendária briga entre a Z3 e SLK na mesma série?
    Esta é a propaganda do futuro, não tão nova assim.

    Será criada uma série de programas por agências de publicidade, com intuito de apresentar produtos de seus clientes, por exemplo, o projeto Viajante Mastercard criado da McCann Erickson, que conta, além de várias chamadas de 30 segundos na TV, com a música inteira veiculada na programação das rádios, como música mesmo e não como intervalo comercial. Som agradável (pra quem gosta), letra engraçada e ainda por cima passa a mensagem do produto. Isso é inovação.
    Grandes marcas criarão, através das agências, seriados para a TV. Entreterão o público o transmitirão o seu recado.

    A propaganda dos próximos anos precisa ser agradável e desejável. Os espectadores precisam querer assistir ao ponto de correr atrás, como no caso do Chevrolet Prisma, que além do comercial da TV tem um vídeo na a Web que foi sucesso de público… as pessoas correram atrás para assistir. E adivinha quem criou? Aham. a McCann Erickson? Os caras já entenderam o recado e montam seus projetos levando em consideração uma questão básica ? Ao que o público gostaria de assistir?

    Opt-in não é a solução, e tenho a certeza de que ninguém vai ficar parado na frente da TV, perdendo tempo assistindo ?propaganda?, mas se for tudo bem resolvido, aposto que os famosos intervalos comerciais estão com os dias contados. 10 anos? Talvez 15… Vamos ver.

    []
    Stivy

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