O cenário global de negócios eleva constantemente o nível de requerimentos em competitividade das empresas que dele participam. Ao se confrontarem com uma enorme diversidade de métodos e ferramentas para melhoria do negócio, os executivos enfrentam dificuldades para entender as propostas de valor, que acabam se tornando confusas e levando a decisões distorcidas.
O assunto foi também tratado por Michael Porter, professor da Harvard Business School em sua última visita ao Brasil. Apesar das suas idéias serem atualmente bastante questionadas por outros pensadores, principalmente pela menor ênfase concedida a assuntos como inovação, recursos e pessoas dentro do contexto estratégico (1), Porter permanece como uma das maiores autoridades no assunto.
Segundo ele, para ser eficaz, uma corporação precisa ter em vista muito claramente quais são os seus objetivos, a sua proposição de valor e como propagá-la ao longo dos anos. Adicionalmente seria necessário também ter muita clareza sobre o que não deve ser feito.
Poderíamos resumir que, na prática, o objetivo é definir um modelo de negócios moderno, inovador e sustentável, com desenho operacional adequado, gestão de pessoas motivadora e tecnologia no estado da arte. E é justamente aí que começam as dificuldades em discernir o posicionamento estratégico correto.
É o que ocorre, por exemplo, com a aplicação do Business Process Management (BPM), um modelo de gestão estratégico por natureza, mas que acaba sendo confundido, por exemplo, com metodologias operacionais como o Seis Sigma e o Lean Production que, erroneamente, são vistas como estratégias empresariais.
BPM é um conceito que integra estratégia, operação e controle através da gestão dos processos de negócio. Permite alinhar a operação com as necessidades dos clientes e de todos os demais stakeholders como acionistas, empregados, fornecedores, parceiros, reguladores e sociedade.
O que não é estratégia
Para Porter, uma forma simples e eficaz de descobrir se a estratégia empresarial é eficiente é saber o que não é estratégia. A confusão mais comum é considerar como estratégia a inovação, flexibilidade, reestruturação, terceirização, internacionalização, aprendizado, fusões/consolidação, aspirações ou downsizing.
Também estão na lista o aperfeiçoamento das melhores práticas e a execução, exatamente o caso do Seis Sigma e do Lean Production.
O Seis Sigma surgiu como reação da indústria americana à evolução dos japoneses na qualidade após o fim da Segunda Guerra Mundial e pode ser definida como metodologia de projeto e não de gestão. A metodologia tem como seus objetivos principais o aumento da qualidade e a redução de custos com base na melhoria de um determinado processo.
Embora a sua implementação apresente ganhos consideráveis em produtividade, estes são pontuais, restringindo-se a processos isolados e não envolve a integração destes processos e nem de como eles interagem entre si.
Sucesso na GE e consagrada pelo seu CEO Jack Welch, o Seis Sigma, entretanto gerou resultados insatisfatórios em outras empresas de grande porte, como a IBM e Bombardier, que inclusive a abandonaram. Sucesso com Seis Sigma não é sinônimo de sucesso no negócio.(2)
Mais conhecida por suas ferramentas, como o Total Quality Management (TQM), Just In Time, Cell Production, Kaizen e Zero Defeito de Produção, a Lean Production ou Lean Manufacturing, método derivado principalmente da War Manpower Commission (3) tem na montadora de automóveis Toyota a sua maior referência.
Seu principal foco de atuação é produzir bens com menos desperdício, menos esforço humano, menos espaço industrial, menos investimento em ferramentas e menos engenharia para desenvolver um produto novo em tempo reduzido.
Embora com mais possibilidades que o Seis Sigma, a Lean Production apresenta as mesmas limitações (é, da mesma maneira, uma metodologia para aumento de produtividade e aperfeiçoamento das melhores práticas). Ou seja, por mais eficientes e bem-sucedidas, as duas constituem-se de metodologias operacionais e não estratégias de negócio.
O BPM é um modelo de gestão que parte do valor atribuído pelo cliente final ao produto ou serviço que deseja receber. Toda a cadeia de valor e os processos são desenhados ou redesenhados para que isso aconteça. As grandes atividades (macro processos) são então classificadas pelo seu valor agregado, de modo a orientar como serão executadas e geridas.
A essência do BPM se encontra na afirmação de que tudo o que vier a ser feito tem de ser orientado pela satisfação do cliente (interno ou externo). Isto leva de imediato ao questionamento das estruturas tradicionais, que privilegiam os objetivos definidos por área funcional (visão vertical) e concedem menor ou nenhuma importância ao conjunto de atividades realizadas pelas áreas (visão horizontal) que, no final das contas, gera o produto ou serviço que o cliente recebe.
É importante citar aqui uma declaração de Lee Lacoca (4) quando chegou à Chrysler:
?Encontrei na Chrysler 35 vice-presidentes, cada um no seu próprio castelo. Não podia acreditar que o executivo responsável pela engenharia não mantivesse contato constante com seu par da manufatura. Todos trabalhavam de forma individual. Nesse momento percebi que tinha grandes problemas pela frente.
Na Chrysler ninguém parecia entender que a interação entre as funções de uma companhia é vital. O pessoal de engenharia e manufatura tem quase que dormir juntos. Eles se tratavam por ?Senhor?.?
BPM é um conceito maior
Por este motivo, quando falamos de Business Process Management estamos tratando de um conceito maior, o sistema de gestão que irá definir como iremos fazer para atender o cliente. E isto envolve modelo de negócio, estratégia, processos, organização, pessoas e tecnologia. Por fim, constitui-se na principal diretriz para o desenvolvimento da operação empresarial. (5)
Assuntos como custo e qualidade, que representam os objetivos principais do Seis Sigma e Lean Production, devem ser tratados naturalmente com a maior atenção. Na sua essência, porém, não podem ser considerados como suficientes para se alcançar os objetivos estratégicos definidos.
Os dois métodos devem ser utilizados como partes ou ferramentas, integrando-se ao BPM. Caso isto não seja feito, corre-se o risco de desenvolver projetos de melhoria operacional desalinhados com a estratégia da organização. [Webinsider]
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Notas
(1) M. Porter. Estratégia Competitiva.
(2) Harry. Seis Sigma.
(3) The War Manpower Commission was a World War II agency of the United States Government charged with planning to balance the labor needs of agriculture, industry and the armed forces. It was created by President Franklin D. Roosevelt in Executive Order 9139 of April 18, 1942
(4) Lee Iacocca with William Novak, Iacocca: An Autobiography (New York: Phantom Books, 1984, 152-153).
(5) L. Piemonte. Revista eManager, Junho 2002.
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Luis Alberto Piemonte
<strong>Luis Alberto Piemonte</strong> (luis.piemonte@insadi.org.br) é presidente e consultor do <strong><a href="http://www.insadi.org.br" rel="externo">Insadi </a></strong> - Instituto Avançado de Desenvolvimento Intelectual e da Business Processes School.