Não é preciso muita explicação para chegarmos à conclusão de que no mundo da tecnologia da informação muito pouco é genuinamente criação e grande parte é cópia, ainda que parcial ou derivada.
No cenário mundial, podemos rememorar em 1988, o caso Apple x Microsoft envolvendo interface gráfica Xerox Alto, com acusações de plágio com o Windows 2.0, bem como o recente caso envolvendo o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg e os irmãos Winklevoss, além de outra batalha com o “ex-sócio” Eduardo Saverin.
Muitos já chegaram até meu escritório com projetos de “ideias online” – do tipo teve uma ideia, submeta e sinta o “colaborativo” dar o feedback se a ideia é boa ou não cooperando com a execução. Logicamente, explico que isto pode não dar certo no Brasil, embora tenha esperança que este cenário mude, porque temos uma cultura da cópia, do mínimo esforço. Você correria o risco de alguém com mais dinheiro que você executar seu projeto na frente?
Startups (empresas em implementação com pouca ou nenhuma experiência de mercado e com futuro promissor) são a onda da vez no Brasil, que é líder em empreendedorismo (com um empreendedor para cada oito adultos). Uma necessidade de ter negócios digitais toma a mente de investidores. Mídias sociais, social commerce, mobilidade, virtualização e cloud, dentre outros, são alguns segmentos de interesse.
Crescimento e riqueza estão migrando para economias emergentes como Brasil, que aliás possui uma “destreza tecnológica” invejável. Empresas inovadoras, com ideias interessantes, jovens e com poucos recursos para desengavetar projetos ou fazer a “máquina rodar” passam a valer “ouro” em um mercado que cresce no Brasil.
Antigamente, colecionávamos casos envolvendo incubadoras e aceleradoras que concebiam excelentes projetos; porém se ajudavam com uma mão, tiravam com a outra. Quantos profissionais prejudicados por orientadores e incubadoras que em troca do apoio exigiam sociedade ou administração no negócio ou mesmo direitos de exploração econômica dos softwares produzidos pelos empreendedores… Empreendedores chegavam até nós com aberrações contratuais firmadas, onde nada mais podia ser feito a não ser a tentativa de anulação judicial dos negócios.
Atualmente o quadro se agrava – vivemos uma onda de “corretoras de startups” (me desculpem, mas não vou usar anglicismos pouco claros) que oferecem a intermediação entre investidores e empreendedores. Chegam com o discurso de que possuem longa carteira de investidores ou fontes de “seed money”, aptos a investir em projetos viáveis no mundo da tecnologia da informação e que precisam fazer testes e avaliações. Mapeiam toda a empresa, coletam todas as informações estratégicas e nem sempre o negócio se concretiza.
Outras empresas propõem uma consultoria em formato de evento, onde o empreendedor paga uma inscrição para ter acesso a um ambiente com demais empreendedores, expõe seu projeto e recebe a avaliação de “especialistas” que prometem alavancar os negócios em pouquíssimos dias. Algumas ainda oferecem a investidores faixas de preços para “startups” que dizem fazer a prospecção. Tem startup de 10k, de 20k e assim por diante…
Quais os riscos? Seu projeto ser absolutamente usurpado, em um conceito que chamamos de “aproveitamento parasitário”. Não se trata de engessar seus negócios digitais, mas sim se proteger ao tentar obter “recursos” para sua alavancar sua startup. Algumas orientações básicas são necessárias e pertinentes:
- 1. Conheça sua empresa. Se você já não é uma pessoa física, conheça seu tipo societário, tributos existentes, obrigações. Leia o contrato social de sua empresa, conheça os poderes do sócio administrador;
- 2. Proteja sua obra. Seja um software, desenho industrial ou mesmo um serviço inovador, há a possibilidade de proteção intelectual por formas distintas no Brasil. Consulte um especialista e tenha as Leis 9609 e 9610/1998 sempre à mão;
- 3. Conheça as leis existentes: não é possível ser um empreendedor ou inventor em TI e não conhecer os conceitos da Lei de Inovação 10.973/2004 e demais leis inerentes. Se o projeto envolver desenvolvimento, blinde o contrato com os desenvolvedores, deixando claro seus direitos patrimoniais sobre o produto;
- 4. Celebre acordos de confidencialidade: carregue na sua pasta os chamados NDAs (Non disclosure agreements) e não comece a falar nada sobre seu projeto sem que o interlocutor, investidor ou corretor assine e obrigue-se à confidencialidade, principalmente, se você já tem um modelo de negócios pré-definido;
- 5. Se seu negócio se enquadra no conceito de “inovação”, procure agências de fomento legalizadas, que poderão financiar seus projetos desde que estimulem o desenvolvimento da tecnologia e inovação;
- 6. Faça parte de associações com credibilidade no setor: Sucesu, Assespro, Abrat, Anprotec, dentre outras associações, poderão oferecer assessoria, mentores e apoio ao empreendimento de TI, além de respaldo jurídico e mediação especializada em casos de litígios com investidores e terceiros;
- 7. Esteja “up-to-date” com as linhas de financiamento Finep e BNDES: talvez, com um bom projeto, você consiga um dinheiro sem a necessidade de abrir capital ou quotas da sua empresa. O Sebrae também não deve ser descartado.
- 8. Cheque a integridade: esteja aberto a investimentos e conversações (lógico!), porém cheque a integridade de “intermediários” e “investidores”. O Google está aí para isso. Pesquise casos passados, avalie. Assim como eles farão uma análise de risco e due dilligence sobre o seu negócio, faça sobre o deles, principalmente, se sua empresa já está faturando. Se o investidor for estrangeiro, consulte o modelo legal existente em seu país de origem; Gustavo Chierighini é preciso em sua explicação sobre o tema, onde pondera:
Não acredite na força dos relacionamentos, isso é pura ilusão. Intermediários baratos adoram usar isso para conquistar negócios e clientes. Ninguém vai investir absolutamente nada por causa disso. Gestores de investimentos prestam contas sobre suas decisões e nessas horas a amizade pode até atrapalhar.
- 9. Cuidado com programas de aceleramento relâmpago de sua empresa inovadora de TI. Só querem o seu dinheiro; em troca vão te despejar inúmeras planilhas e números, conceitos e alguns e-mails, para que você se vire. Em co-working, saiba antes dos direitos e deveres de cada um e como ficará a propriedade ou co-propriedade do projeto após finalizados os trabalhos.
- 10. Não busque assessoria jurídica orientada ao incidente. Tenha profissionais especializados em direito e tecnologia da informação do seu lado, a cada etapa de amadurecimento de seu projeto. Não faça nada sem antes consultá-los, inclusive nos contratos de venda da empresa ou cessão de direitos de exploração. Não aceite tudo que está escrito nos contratos ou cartas de intenções (term-sheets), questione! Muito cuidado quando o empreendedor se mantiver com algumas ações da empresa, será preciso avaliar cláusulas que limitam seus poderes neste caso.
Com estas singelas orientações, o empreendedor digital poderá minimizar riscos de ter sua ideia sabotada, de concorrência desleal ou até mesmo exclusão dos quadros societários da startup, sendo forçado a vendê-la. O aspecto jurídico deve estar presente em todo o projeto de anúncio e aceleração das startups.
Logicamente, cobrar pelo serviço de captação de recursos ou consultoria para o negócio são atividades comuns; porém desconfie de consultorias que como preço pedem sociedade ou participação nos lucros da empresa. Normalmente, o ingresso à sociedade se dá apenas para investidores e na modalidade venture capital ou capital de riscos, que é um tipo de investimento privado, através do qual se compra participação societária em startups que apresentem possibilidades de crescimento exponencial.
Importa dizer: as fusões e aquisições devem ser planejadas, sobretudo no que tange a aspectos legais existentes em relação aos dados de consumidores.
Devemos ter em mente que incumbents vão cada vez mais tentar a aproximação de startups, sobretudo com os eventos de Olimpíadas e Copa do Mundo a se realizarem no Brasil. Viveremos a chamada “febre das aceleradoras”. Isto é bom? Isso é ótimo, mas a ânsia em conceber um modelo de negócio e ver um projeto decolar pode superar etapas de planejamento, risco e segurança, que podem impactar completamente o futuro da startup e de seus criadores. Pense nisso e cautela!
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José Antonio Milagre
José Antonio Milagre (@periciadigital) é Perito e Advogado especializado em Tecnologia da Informação. Site: www.legaltech.com.br.
2 respostas
Muito bom o artigo, parabéns!
Muito interessante o artigo! Empreendedores devem ficar de olhos abertos sempre! Fico em dúvida em relação a dificuldade que é achar um advogado especialista em direito eletrônico e questões deste tipo ou se na maioria dos casos um advogado não especializado já é suficiente.