A definição da governança, atividade muitas vezes relegada para depois que o projeto já está no ar ou até mesmo esquecida, é um dos fatores cruciais para a sobrevivência de um produto ou serviço web.
Onde não há governança não há gestão, e onde não há gestão as coisas simplesmente não acontecem – prazos são esquecidos, resultados são monitorados de maneira informal, a evolução do produto não é pensada estrategicamente, entre outros desastres possíveis.
Este artigo tem o objetivo de apoiar o processo de definição da governança, estruturando-o a partir de sete perguntas. São elas:
- 1. Centralizar ou descentralizar?
- 2. Descentralizar quanto?
- 3. Validar ou monitorar?
- 4. Quais as atividades chave?
- 5. Quais as competências chave?
- 6. Como as demandas serão atendidas?
- 7. Quando e como a governança será revista?
Ao responder estas sete questões, pode ser que você não tenha sua estrutura de governança cem por cento definida, mas espero que ela esteja bem encaminhada, e – o mais importante – no caminho certo.
1. Centralizar ou descentralizar?
Uma estrutura de governança, por definição, é descentralizada. Ela depende de vários departamentos e equipes para funcionar de maneira efetiva – software, hardware, segurança, conteúdo, design, arquitetura de informação, usabilidade. É quase impossível para uma área apenas executar todas estas funções.
A questão da descentralização ou centralização, então, normalmente se dá mais especificamente quando estamos falando de conteúdo: “Vamos liberar para as áreas publicarem seu próprio conteúdo ou nós vamos centralizar todo o processo?”
Os prós e os contras são bastante óbvios – apesar de a resposta para a pergunta não o ser:
Prós da centralização
- Maior controle sobre o processo como um todo
- Menor risco de despadronização ou erros no conteúdo
- Menor esforço em treinamento e atualização dos contribuidores, do ponto de vista técnico e de negócios • Menor volume de trabalho para a área gestora
Contras da centralização
- Conteúdo pode refletir apenas o ponto de vista da área gestora
- Iniciativa não possui a “cara” da organização, e sim de uma área específica
- Maior esforço para atendimento às demandas das áreas, muitas vezes com prazos curtos
Prós da descentralização
- Maior engajamento das áreas contribuidoras dentro da iniciativa
- Mais pessoas no processo garante maior qualidade do conteúdo entregue e alavanca a identificação de problemas
Contras da descentralização
- Complexidade na gestão das áreas contribuidoras
- Risco de despadronização dos conteúdos entregues
- Maior risco de problemas de comunicação no processo
Além de pesar os prós e contras, também é importante ter em mente três outras questões:
O tipo de produto ou serviço: a descentralização da publicação normalmente se encaixa mais facilmente a intranets e portais corporativos, pois a natureza destas iniciativas pressupõe que as áreas e departamentos contribuam e colaborem. Sites institucionais normalmente possuem um rigor maior, mas permitem que haja descentralização sem maiores problemas – até para que o fluxo seja mais ágil para a publicação de determinadas informações. Mini-sites ou hotsites possuem um escopo muito mais restrito, por isso dificilmente permitirão uma gestão descentralizada de conteúdo. Já aplicações feitas para dispositivos móveis podem permitir este modelo – apesar de não ser uma prática comum atualmente, talvez por ainda ser um tema novo para a maioria das empresas.
O tamanho do produto ou serviço: iniciativas de escopo mais reduzido – ou com tempo curto de vida – deveriam optar pela centralização na gestão de conteúdo, para agilizar e facilitar o processo. Vale pesar se o esforço que será necessário para estabelecer o processo, criar políticas e regras e treinar as pessoas será maior ou menor que o esforço na criação e atualização dos conteúdos.
O momento do projeto: normalmente, produtos ou serviços recém lançados ou redesenhados necessitam de maior controle sobre o processo, por isso tendem a ter a gestão de conteúdo mais centralizada. Conforme a iniciativa vai amadurecendo, é normal – e recomendado – que a equipe gestora vá descentralizando a gestão para outras áreas e times.
A cultura da empresa: empresas que nasceram na internet ou que possuem parte importante de sua operação ocorrendo na web sabem – e precisam – de mais liberdade para gerenciar os conteúdos de seus produtos e serviços online. Empresas nas quais a internet representa um papel de mera figuração – por conta de seu negócio ou por escolha – não precisam de um processo descentralizado de produção de conteúdo. Ele provavelmente será gerenciado de maneira bastante efetiva pela gestão do site ou do portal.
2. Descentralizar quanto?
Se a opção foi pela descentralização da gestão de conteúdo, você precisará responder também a esta questão. É preciso definir o quanto se quer descentralizar o processo – mais do que isso, é preciso definir como isso será feito e como será a evolução ao longo do tempo. Se isso não for feito, o processo de descentralização pode ocorrer de maneira muito rápida – sem critério ou estratégia – ou excessivamente lenta – deixando passar oportunidades importantes para o projeto –, prejudicando a qualidade do produto ou serviço.
A descentralização pode – e deve – ocorrer de maneira gradual, para que o processo possa ser bem estabelecido e para que ele possa ser ajustado com base nas primeiras experiências. Para isso, é importante pensar com que conjunto de conteúdos será dado o pontapé inicial para a descentralização.
Uma maneira interessante de segmentar a evolução da descentralização do processo é por tipo de conteúdo. Podem ser definidos critérios para esta segmentação, como por exemplo urgência (conteúdos urgentes são descentralizados primeiro), complexidade (conteúdos mais complexos serão gerenciados de maneira centralizada até que a iniciativa tenha maturidade suficiente) ou freqüência de atualização (conteúdos que são mais frequentemente atualizados, como notícias e posts são centralizados pela equipe que cuida da comunicação institucional, por exemplo). Outra maneira de olhar a segmentação é por volume de acessos. Na maioria das vezes a equipe gestora irá centralizar a edição e publicação do conteúdo nas páginas mais acessadas, para evitar riscos de despadronização ou informações incorretas.
Além de decidir quais conteúdos serão descentralizados primeiro, é importante decidir para quem o processo será delegado. Normalmente, são eleitas pessoas chave – que podem ser chamadas de focais de conteúdo, usuários-chave, multiplicadores, etc. – que serão treinados, orientados e monitorados ao longo do tempo. Mesmo que o objetivo final seja que todos sejam editores/publicadores, é importante que o processo se inicie com a definição destes usuários-chave, pois eles poderão ser utilizados como pontos focais para controle de qualidade e também para replicação de conceitos, treinamento e resolução de problemas.
3. Validar ou monitorar?
Outra perguntas que deve ser respondida quando se fala em descentralizar a gestão de conteúdos, é se a equipe gestora do produto ou serviço irá validar todo o conteúdo que as demais áreas produzem ou se a publicação será realizada sem nenhum filtro.
A resposta para isso depende de alguns fatores, dentre eles a característica do conteúdo que será publicado – se é sensível a sigilo ou algum tipo de regulamentação ou se pode ter algum impacto muito negativo para a empresa caso ocorra algum erro – e a maturidade do processo e da equipe responsável por este conteúdo.
Novamente, aqui vale a pena pesar os prós e os contras. O esforço que será necessário para estar à disposição para validar os conteúdos compensa os riscos de uma publicação incorreta ou indevida?
Mesmo que não hajam filtros iniciais para a publicação, a área gestora do produto/serviço deverá realizar uma validação – em formato de monitoramento. Para isso, a área deve estabelecer um processo com periodicidade adequada (não adianta validar um conteúdo que foi ao ar um mês antes) e mecanismo de feedback bem definido. As ferramentas de gerenciamento de conteúdo (CMS) oferecem algumas funcionalidades neste sentido. Para validações de conteúdo a priori existem os workflows de aprovação. Para as validações a posteriori, podem ser definidas notificações para a equipe gestora, que recebe alertas sempre que um novo conteúdo for publicado.
4. Quais são as atividades chave?
Para que a estrutura de governança seja definida, é importante pensar nas atividades que deverão estar sob sua tutela. A governança deve ser responsável tanto por atividades de nível estratégico (evolução do produto, orçamento), como de nível tático (compras, pessoas, estruturação de projetos) e operacional (resolução de problemas, monitoramento, atualização de conteúdo).
É a partir da definição das atividades que a governança deverá executar que sua estrutura irá se delinear, mais especificamente a partir das competências necessárias para atender às demandas e pessoas que possuem estas competências.
5. Quais são as competências chave?
A partir da lista de atividades que devem ser realizadas pela governança, é possível detalhar que competências são necessárias para que elas possam ser executadas. Definir estas competências – e habilidades, em nível mais operacional – é imprescindível para que a empresa possa saber que pessoas melhor se encaixam em cada papel, quais os treinamentos necessários e até mesmo se a empresa possui realmente pessoas com determinado perfil ou se haverá necessidade de recrutamento externo.
6. Como as demandas serão atendidas?
Se o seu produto ainda está em fase de projeto, assim que ele estiver no ar você já terá uma fila considerável de pedidos e melhorias para implementar – é sempre assim. Se a sua iniciativa já está no ar há algum tempo, sabe do que estou falando. É importante se preparar para isso, definindo um modelo de atendimento às demandas – sejam elas internas (do próprio time ou de outras áreas) ou mesmo dos clientes/usuários.
A primeira coisa é definir a urgência das solicitações – e o que configura cada tipo de urgência. Um pedido urgente não deve ser considerado assim só porque essa palavra veio escrita em caixa alta no e-mail de quem o enviou. Por exemplo, um item urgente deve ser algo que configura parada iminente no fornecimento do serviço ou que impeça a execução de alguma tarefa chave dentro do produto.
Depois disso, é preciso definir um prazo estimado para o atendimento de cada tipo de demanda – o famoso acordo de nível de serviço (ou SLA). É importante que esses prazos sejam amplamente comunicados para que não haja desalinhamento de expectativas.
Além das demandas mais corriqueiras, que configuram manutenção, também é importante pensar nos ciclos de evolução do produto – melhorias mais significativas, que devem ser implementadas em lotes. A governança deve estimar já no lançamento do produto qual a será a periodicidade para planejamento e implementação destes ciclos.
7. Quando e como a governança será revista?
Além de planejar a evolução do próprio produto, a governança é responsável por se autoavaliar e pensar em sua própria evolução. Uma estrutura de governança implementada no início do ciclo de vida de um produto não é a mesma de um produto maduro, por exemplo.
Por isso, é importante definir em que momentos a governança irá se autoavaliar e propor alterações e melhorias em seu modelo. Alterações incrementais podem ocorrer com mais freqüência – como por exemplo a mudança de um fluxo ou a melhoria de um relatório específico, mas é importante definir em que momentos questões maiores serão revistas – como estrutura, pessoas e orçamento, por exemplo. [Webinsider]
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Paulo Roberto Floriano
Paulo Roberto Floriano (paulo@neuestudio.com.br) é consultor em experiência do usuário, arquitetura de informação e design de interação. É proprietário da Neue Studio, co-autor de dois livros e palestrante.
2 respostas
Gostei muito da sua matéria, parabens, és um vencedor.
Parabéns pela objetividade das colocações e pela abrangência da abordagem. É notória importância do tema para as empresas cujo planejamento esteja em transição/atualização.