Com LA Costacurta Junqueira*
Ao longo de nossa experiência em consultoria, aprendemos como a maioria dos profissionais encara a questão do ROI em treinamento. Algumas proposições indicam isso:
- Todos aceitam que é preciso mensurar ROI;
- A maioria reconhece que, sem provar esse retorno, fica mais difícil obter verbas para treinamento;
- Há conhecimento suficiente para fazer isso (medir);
- A maioria tem apoio organizacional para realizar essa tarefa;
- Todos já efetuamos várias tentativas;
- A maioria desistiu e optou por avaliar apenas a reação dos participantes.
Mas por que isso acontece? Uma boa pista pode estar na sequência intenção-comportamento-impacto. Podemos dizer que todas as nossas intenções são corretas. Parece ser mais do que óbvio que se pudermos evidenciar a taxa de retorno sobre o investimento em treinamento teremos maior facilidade em convencer nossa organização a investir nessa área. Mas nosso comportamento reforça essa compreensão? Vamos analisar alguns comportamentos que podem nos prejudicar na busca do desejado impacto.
Há muitos anos, deparamo-nos com a seguinte frase, dita por um renomado consultor: “Esse pessoal de T&D não está a fim de medir nada porque já sabe o que vai encontrar”. A colocação parece agressiva? Talvez, dependendo da forma que é encarada.
Acreditamos: nosso colega queria denunciar um comportamento que pode ser classificado como de autossabotagem com relação à mensuração do ROI na educação corporativa. Se nossos acionistas querem saber qual o retorno de cada centavo investido na empresa, por que será que nos sentimos à vontade para pedir que sejamos, como se diz, “incluídos fora dessa medida”? Será difícil compreender que, nos dias atuais, é absolutamente inadmissível investir em algo cujo retorno não se sabe? Uma coisa é certa: não se comprometer a provar esse retorno em treinamento será, cada vez mais, aceitar viver na corda bamba dos cortes de verba.
Um segundo comportamento adotado diz respeito à avaliação do processo de treinamento. Avalia-se a simpatia do instrutor, o coffee break, o hotel etc. Trata-se de comportamento classificado como alienação.
Antes que você se ofenda com isso, queremos refletir se basta avaliar se todos ficaram felizes e se vão falar bem de quem promoveu a atividade para nos permitirmos ter a sensação do dever cumprido. Acreditamos que a opção por essa avaliação decorre muito mais de sua simplicidade de execução do que da crença de que seja, isoladamente, um bom método. Afinal, temos tanta coisa para fazer (e tão pouca gente para nos ajudar) que fica difícil resistir à tentação de usar um método no qual basta um questionário “e não se fala mais nisso”.
Autoengano
A essa altura, você deve estar se perguntando se não está faltando alguma coisa, já que ainda não se falou em avaliação de resultados. Nesse ponto surge outro comportamento: o autoengano. Partimos para a identificação dos resultados, expressos em termos de economias obtidas, geração de novas ideias, etc. Independentemente dos resultados encontrados, surge a pergunta que não quer calar: resultados para quem? Para a empresa? Para os participantes? Para o cliente final?
Aliás, que diabos é isso? Que resultados foram definidos por esse cliente final, antes do treinamento? O que se constata, boa parte das vezes, é que esse cliente ficou fora do processo de definição dos resultados esperados.
O resumo dessa triste ópera é que T&D partiu para avaliação dos resultados adequados, corretos e desejáveis para si mesmo. Algo como um julgamento entre pares, em que, ao fim e ao cabo, T&D avalia T&D.
Será que os acionistas concordarão com nossas conclusões? Ainda na lista dos comportamentos que não geram o impacto desejado, destaca-se a avareza. Na cabeça do avarento, a parte mais importante de um programa de educação corporativa é a que ocorre em sala de aula. A partir dessa “verdade”, não se considera a necessidade de uma customização/expectativa de resultados, bem como uma posterior avaliação dos “produtos” obtidos.
“Para que customizar e/ou avaliar se o que dá mais ‘Ibope’ é o programa em si? O antes e o depois que se danem; o durante é o que conta”, pensa o avarento. E o último comportamento da nossa lista é o antivendedor. Trata-se de pura e simplesmente ignorar o envolvimento de todos os atores integrantes de um processo de avaliação. Agora, a pergunta que não quer calar é: você é do tipo que realmente se preocupa em saber o que seu cliente precisa ou está mais é preocupado em atingir a meta de oferecer “x” horas de treinamento para cada empregado da empresa?
Cada vez predominará mais nas organizações a ideia do treinamento consultivo, aquele concebido para atender a necessidades muito claramente identificadas, em vez de lidar com problemas gerais ou de todos. Sabemos que as organizações cobrarão intensamente da área de T&D um conhecimento tão profundo da realidade do cliente, que verdadeiramente possibilite até a identificação de necessidades não percebidas por ele próprio. Isso é postura consultiva. É fundamental ter em mente que, na vitória ou na derrota, todos nós, consultores, diretores, clientes internos, somos cúmplices de todo o processo. Para dar nossa contribuição, vale apresentar uma alternativa para medir o ROI de treinamento.
Como ir além do quinto nível: o problema
Todas as áreas das organizações estão preocupadas em comprovar sua contribuição para os resultados financeiros do negócio. Conforme dissemos anteriormente, a área de T&D precisa encontrar uma forma de fazer isso sem cair na tentação de assumir um comportamento que soe como pouco verdadeiro. O famoso cálculo do retorno sobre investimento em RH teve seu apogeu há mais de 30 anos. É possível encontrar textos sobre o assunto escritos a partir da década de 60 do século passado (embora nos pareça que o primeiro trabalho sobre o tema tenha sido escrito em 1935). Em outras palavras, já faz muitos anos que se defende a tese de que RH pode, eventualmente, provar ser um centro de lucros.
Preocupados em poder expressar financeiramente o resultado de suas ações, gestores tiram a poeira de suas prateleiras e releem clássicos como Hamblin, Magger, Kirkpatrick e Jack Philips. É comum muitos voltarem a se entusiasmar com as ideias de Jac Fitz-enz, autor de alguns dos mais conhecidos trabalhos acadêmicos sobre cálculo de ROI em treinamento. Vejamos o que ele propõe.
Para provar a tese de que é possível medir resultados de treinamento em termos estritamente financeiros, Fitz-enz sugere um artifício bastante utilizado nos exercícios de modelagem: criar um sistema fechado, isolado da influência de qualquer outra variável que não seja aquela que se está estudando. Funciona na teoria, mas, na prática, é fruto de uma inferência que dificilmente merecerá crédito. Não queremos, com isso, dizer que seja impossível medir a taxa de retorno financeiro de algumas ações de T&D. Se, por exemplo, somarmos todos os custos de um treinamento de vendas (diretos e indiretos) e os dividirmos pelo resultado adicional obtido em um determinado período após o treinamento, talvez possamos atribuir o efeito gerado ao trabalho feito. Mas como fazer isso com um treinamento sobre ética e responsabilidade social? Somar os custos é fácil, mas como avaliar financeiramente o produto gerado por esse treinamento?
Baseado em Borges-Andrade, afirmamos sem medo que as experiências realizadas para determinar o valor final das ações de T&D são escassas e inconclusivas. Muito se evoluiu na avaliação de processos, mas pouco se fez de concreto para medição de resultados.
Uma alternativa de solução
Temos defendido que sempre será possível medir o resultado de uma ação de treinamento, mas nem sempre esse resultado poderá ser expresso financeiramente. O que fazer então? Desistir de medir? É claro que não. Em primeiro lugar, é preciso pactuar internamente o que se está procurando medir. Para fazer isso é fundamental identificar logo de cara quem é o “dono do processo” que será objeto de nossa intervenção, para com ele pactuar as melhores métricas, que variam caso a caso.
Imaginemos que se está tratando de um treinamento de técnicas de negociação para compradores do varejo. Quem é o dono do processo? Dependendo da estrutura funcional da organização, tanto poderá ser o diretor de compras quanto o diretor de marketing. Feita a correta definição de quem ele é, o próximo passo é garantir o correto entendimento sobre quais são os outputs que ele espera que resultem da ação de treinamento. Vejamos alguns exemplos práticos de outputs para esse treinamento em específico:
- Mudanças no desempenho de cada participante e/ou;
- Mudanças no desempenho do grupo de treinandos.
No primeiro caso, ao proceder à avaliação, deveremos tomar por base o conteúdo do programa. No segundo, deveremos procurar observar o comportamento coletivo. Esse é apenas um exemplo daquilo que T&D deveria se preocupar em discutir antes de pensar em medir resultados.
Em termos práticos, sugerimos que, antes de iniciar um processo de mensuração de resultados das ações de treinamento, você tenha absoluta certeza daquilo que é desejado pelo executivo que, embora distante da ação (e muitas vezes da própria decisão), no fundo é quem validará ou não o investimento feito.
Depois de ter compreendido – e validado – aquilo que realmente se espera do treinamento, é hora de procurar responder às seguintes questões:
Por que medir?
Se a única motivação é tentar salvar seu pescoço de um possível corte, cuidado. Pode ser que o tiro saia pela culatra e você acabe convencendo o dono do processo de que o investimento em treinamento efetivamente não contribuiu com o negócio. Uma constatação desse tipo pode ser uma excelente justificativa para um corte mais profundo nas suas já minguadas verbas. w o que medir? Como já dissemos, em alguns casos é possível associar uma ação de treinamento a indicadores financeiros. Mas nem sempre. Apenas para fazer uma analogia, pense no seguinte: qual o valor financeiro da felicidade? Sendo esse o objetivo maior do ser humano, será que seu atingimento pode ser medido em dólares ou reais?
Como medir?
É importante lembrar que existem dois tipos de medição: de processo e de produto. Como em quase tudo na vida, medir os dois é fundamental para avaliar a eficácia de um treinamento. Mas não esqueçamos a “regra de ouro”: são os resultados desejados que definem as formas de medição. O contrário não funciona.
O que fazer com os resultados?
Nossa sugestão é pragmática: proclamá-los aos sete ventos, mostrando que não somos, necessariamente, um centro de lucros, mas que estamos dando uma efetiva contribuição para que a empresa possa gerar resultados positivos, preferencialmente de maneira eticamente defensável e socialmente responsável. Mas e se os resultados não forem tão positivos quanto imaginamos? Lembremo-nos de que só há uma razão para medirmos as coisas: melhorá-las. Se não estamos performando do jeito que pretendíamos, é importante investigar o que precisa ser feito.
Existem riscos envolvidos?
Sempre existem. Mas o risco de manter a área de T&D sendo vista como uma caixa-preta é muito maior. O mais importante aqui é “vender internamente” a ideia de que as contribuições de T&D não se expressam necessariamente em termos financeiros.
Responder a essas cinco perguntas é essencial para pensar na implementação de um sistema de medição de resultados de ações de T&D.
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*L.A. Costacurta Junqueira é CEO do Instituto MVC.
[Webinsider]
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