Em 2011 a Benetton, famosa por suas campanhas polêmicas, lançou mais uma delas: a de líderes mundiais beijando-se na boca. As imagens chocaram. E correram o mundo. Tanto por serem líderes mundiais, e não reles e anônimos amantes. Tanto por não haver motivo real para beijos entre cada um dos casais, muito pelo contrário, provavelmente seriam farpas ou tapas as ações mais prováveis. E também por serem, na maioria das vezes, beijos entre homens.
O título da campanha? “Unhate”. Bonito. Nobre. Sublime. Pois bem. Isso já faz tempo, é verdade, mas só agora me veio o insight. A percepção da discrepância entre a teoria, racional e socialmente defendida, e a prática crua, seca e cruel.
Todos nós, aglutinados em forma de sociedade, caminhamos – ao menos na teoria – contra a homofobia, contra as guerras, contra as discórdias políticas internacionais, contra o ódio, enfim. Sonhamos com um mundo sem preconceito, sem discriminação, sem violência, sem guerras e sem xenofobia. E na teoria, todos pregam exatamente isto. Na teoria, na intenção, o mundo é lindo.
Mas, e na prática? Na prática, vemos todas estas mazelas e “deslizes humanitários” não apenas acontecendo como sendo estimulados e apoiados, por diversos setores, organizados ou não, oficiais ou não. Não fosse assim, não veríamos os EUA considerando atacar a Síria, não veríamos a Síria atacando a Síria, não veríamos crianças agonizando e morrendo, por conta da estupidez humana. Também não veríamos preconceito no dia-a-dia, nem integrantes do próprio governo, da comissão de Direitos Humanos, defendendo a “cura gay”, nem casos diários de discriminação por raça, cor, credo, religião ou até mesmo por opção clubística.
E aqui, chego na discussão entre o “on” e o “off”. Entre o Tradicional e o Digital. Assim como o beijo dos líderes (do anúncio), no campo teórico a integração entre estes dois mundos é dada como natural, espontânea, verdadeira, obrigatória. E está tão consolidada como “comunicação única”, que ninguém mais distingue o que é digital ou físico. Na teoria. No discurso. “É tudo comunicação”, dizem. “O consumidor é um só”, defendem. Atrasado, aquele que discordar. Cego, aquele que não aceitar.
E nessa toada, esse mantra, esse novo dogma, já virou bordão. E, amplamente repetido, virou verdade. A discussão “on” versus “off” é assunto encerrado, vencido, mofado, soterrado pela nova ordem das coisas. Mas será, mesmo?
É certo que o consumidor final é impactado e influenciado por todos os tipos de comunicação, durante o decorrer do seu dia e das suas experiências. A OFF, a ON, a NO MEDIA, a informal, a tradicional, a inovadora, a boca a boca… Para ele, consumidor, não existe mais ON ou OFF. Também é certo que esta mesma comunicação deveria – veja… “deveria”ser pensada, concebida, planejada, de maneira uniforme, homogênea e sem distinções. Mas será mesmo que isto é uma verdade absoluta? Uma realidade? Uma prática corriqueira e consolidada?
Quantas pessoas hoje praticamente só compram ON, via e-commerce? Quantas são fortemente e quase só influenciadas pelas redes sociais e pelos reviews? E quantas seguem caminhando pelas lojas físicas? E quantas são impactadas e influenciadas por pesquisas no Google, ou no YouTube, ou no logoff do Facebook? Assim como tantas outras, ainda só compram a escova de dentes que passou no intervalo da novela?
O fato é: na teoria, a sociedade é contra a homofobia, contra a xenofobia, contra a discriminação entre pobres e ricos, contra a violência. Mas na prática, os noticiários nos trazem a verdade das ruas: a realidade, nua, crua e implacável. E, às vezes, até mesmo intragável. São a esperança e a crença na humanidade, sendo desmentidas pelos próprios humanos.
Na teoria, enxergamos o fim do “On” versus o “Off”. No conceito, pleno e perfeito, distante da interferência inconveniente da realidade, existe o Nirvana já batizado de “ON/OFF”. Nas sedes bacanas das agências, entretanto, assim como nos sofisticados setores de marketing das empresas, eles estão longe de serem homogêneos. Seguem sendo água e azeite.
Então, esta discussão é atual, sim. Não está vencida, não. Basta ver a forma como Agências de Propaganda seguem tratando o digital de forma limitada, rasa, insuficiente, e, muitas vezes, equivocada. Basta constatar como Agências Digitais seguem focando na tecnologia e nos recursos, em vez de enxergar e mirar nos resultados, nos benefícios, abrindo mão da estratégia e do velho e bom marketing dos 4p’s. Quem trabalha na área vê, todos os dias, campanhas paridas no “Off”e “adaptadas” pro “On”. Quem respira o digital, recebe, toda semana, peças capengas, quadradas e absolutamente inapropriadas para o digital, mas… supostamente prontas e perfeitas para serem publicadas online. Então, o “On” e o “Off” permanecem sim, separados e distantes entre si, salvo raras exceções.
Para quem circula no meio, é comum escutar diálogos como:
– “Fala com a fulana, que atende a rede de lojas Tal…
– “Ah, não adianta. A fulana atente só o OFF… Não o digital”.
Todos sonham com o beijo dos líderes. Com o UNHATE. Por enquanto, eles são meras obras de ficção. E que servem, apenas, para chocar, para chamar a atenção. Para fazer pensar. Fossem atos naturais, corriqueiros, normais, de “unhate” genuíno, não surtiriam o efeito que surtem.
Com o digital versus o tradicional, idem. O que o “On” e o “Off” mais têm em comum, ainda, é um abismo entre si. Quem mais sofre e mais perde, é o cliente, que lucraria muito se tudo fosse efetivamente integrado e pensado harmonicamente, em conjunto, desde o embrião das campanhas, ações e estratégias.
Não é assim, infelizmente. Há um longo caminho a trilhar, despido de egos, preconceitos, crenças pétreas e melindres de parte a parte.
“Money talks”… e este é um problema sério para a evolução do mercado da comunicação, pois o digital não é tão rentável quanto o modelo da propaganda tradicional e há, naturalmente, resistências. Afinal, o Johnnie Walker das crianças tem que ser defendido… Status, também. Falta olhar o resultado. Falta humildade. Falta comprometimento sincero e genuíno com a necessidade do cliente. Falta, falta… Ponto.
Os termos “On” e “Off”, são preconceitos mútuos a serem superados, de parte a parte. Assim como negros e brancos, homos e héteros, gremistas e colorados, religiosos e ateus, rockeiros e sertanejos universitários.
Na teoria, tudo é música, tudo é opção sexual, tudo é ser humano, tudo é futebol. Tudo é comunicação. Na prática, meu amigo, é mimimi e a Legião da Má Vontade atuando além da conta. Além do aceitável. Além do necessário.
Então, não tapemos o sol com a peneira. A teoria bonita não anula a realidade feia. Vamos encarar os fatos, ligar as pontas, fazer funcionar. Negar os fatos, não vai resolver. “Off” e “On”, “Digital” e “Tradicional”, pensados homogeneamente, desde o início, integrados, é que é o futuro. Não, não é o presente, não se engane, não se iluda. A teoria, os teóricos, pregam que sim. E é certo que a a teoria já aponte para o certo. Mas venha para o dia a dia…
Há muito o que fazer. Há muito o que evoluir. Comunicação integrada, de fato, o fim do “On” e do “Off”, só quando os líderes se beijarem, de verdade e com UNHATE genuíno… [Webinsider]
Leia também:
- O sucesso das marcas depende da adaptação a um paradoxo
- Anunciar: agora tem um novo jeito
- O marketing digital deve ser social, móvel e personalizado
…………………………
Conheça os cursos patrocinadores do Webinsider
- TreinaWeb – Cursos de Tecnologia da Informação – treinaweb.com.br/cursos-online
Ricardo Formighieri de Bem
Ricardo Formighieri de Bem (ricardo@divex.com.br) é sócio-diretor da Divex - Internet gerando valor, foi diretor da ABRADi RS - Associação Brasileira dos Agentes Digitais - RS durante dez anos e escreve regularmente sobre Internet. Mais no Google.