Toda vez que eu escuto Laurindo Almeida tocar eu me pergunto por que cargas d’água ele é tão pouco conhecido no Brasil, ou reconhecido como um dos precursores da bossa nova. Pois que, quando o músico faleceu em 1995, nos arredores de Los Angeles, quase ninguém por aqui soube.
Ainda por volta de 1999, o canal de TV GNT apresentou uma série/documentário com o título “Laurindo Almeita, Muito Prazer”, feito pelo diretor Leonardo Dourado. Diz ele o seguinte: “Nossa maior dificuldade foi encontrar registros de Laurindo no Brasil”. No documentário, se a memória não me trai, a viúva se diz surpresa ao perceber que Laurindo era pouco reconhecido no Brasil. Ela parece não acreditar que o músico não tenha sido visto como precursor de um dos maiores e mais importantes movimentos de música no Brasil. Nem ela, nem eu!
A biografia de Laurindo Almeida é vastíssima, e possivelmente proporcional ao seu talento. Nascido na faixa litorânea de Santos, veio posteriormente ao Rio de Janeiro, onde teve presença no rádio e no antigo Cassino da Urca (ex-TV Tupi), e depois viajou pelo mundo todo. Fixou residência nos Estados Unidos, de onde nunca saiu, a não ser para concertos e apresentações em outros países.
Logo cedo, uma das suas melhores participações foi como músico da orquestra de Stan Kenton. E talvez não seja por mera coincidência que a sua última aparição em trilhas sonoras de filmes tenha sido exatamente na introdução de violão do filme “Unforgiven” (no Brasil, “Os Imperdoáveis”), dirigido por Clint Eastwood, cujo principal colaborador era Lennie Niehaus, ex-arranjador da orquestra de Stan Kenton.
A discografia de Laurindo Almeida é precoce e extensa, e eu não acredito que ela esteja completamente catalogada. Almeida estrela a lendária gravação em corte direto para Lp intitulada “Virtuoso Guitar”, feita pela Crystal Clear, e conhecida como “o disco branco”, por causa da cor do vinil de uma das prensagens. Gravado em 45 rpm, para o máximo de fidelidade possível, o disco tem apenas cerca de 15 minutos de cada lado, se tanto. No Lado A, são tocadas três peças populares com arranjo jazzístico, e no Lado B uma peça de Radamés Gnatalli “Sonata para guitarra e cello, em três movimentos”.
Outro disco em corte direto imperdível é “Just Friends”, desta vez recuperado pela Hi-Res Music para DVD-Audio estéreo em transcrição de 192 kHz e 24 bits de um lado e 96 kHz e 24 bits do outro (DAD). O som da remasterização é excelente, com praticamente nenhuma diferença dos dois formatos:
A associação de Laurindo Almeida com Bud Shank é antiga. Dois dos seus mais notáveis discos são os volumes 1 e 2 do título “Braziliance”, disponíveis ainda em CD.
Laurindo Almeida fez de tudo: tocou música popular, jazz, música erudita, compôs e fez arranjos, inclusive para diversos filmes e seriados de TV. Criou o que ele mesmo chamou de “Jazz de Samba”, ou “Jazz-Samba”, como preferem alguns. Para tal, dividiu créditos com seu parceiro Bud Shank, classificando o gênero como “música de fusão”. O jazz-samba é tocado até hoje por músicos brasileiros e do exterior, e se confunde muitas vezes com as inúmeras variações da bossa nova.
O esquecimento de Laurindo Almeida continua sendo peculiar apenas no Brasil. Na América e no resto do mundo o seu nome continua associado, e com justa razão, à modernização da música popular brasileira, independente de ser bossa nova, jazz-samba ou qualquer outra coisa parecida.
Graças à preservação da maior parte do seu material fonográfico recente, nós que não compartilhamos deste esquecimento, podemos ouvir, estudar e aquilatar a sua importância, e nos posicionarmos de maneira positiva, de forma a lembrar aos nossos compatriotas que muito do valor cultural verdadeiro que este país produziu nunca foi alvo de uma justa homenagem. [Webinsider]
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.
2 respostas
Olá, Tresse,
Falando em parar, a tua ausência será sentida. Você foi, das pessoas que eu conheci deste métier, o que mais incentivou a televisão digital neste país. Um trabalho árduo e desinteressado, que somente idealistas são capazes de fazer. Meus sinceros parabéns.
Sobre palestras, eu as faria com todo o prazer. Infelizmente, seria difícil receber algum convite sem estar ligado a algum tipo de projeto.
E sinceramente, eu já ando com um pé para trás em solicitações a mim dirigidas. Dei entrevista filmada a dois estudantes, e nunca soube se de fato foi aproveitada no trabalho deles. No ano passado, dei entrevista a um jornalista estagiário do site PUC Digital, entrevista esta que havia sido recusada por uma pessoa da área de cinema, e que então, não sei porque, indicou o meu nome. Você viu? Nem eu! E nem satisfação eu recebi do rapaz e da moça que fez a gravação.
Paulo, qualquer informação para chegar no grande público tem que ser incentivada pelas Escolas Públicas. Algumas Escolas Particulares já fazem alguma coisa. Se você fizer uma Palestra sobre Música/Áudio/Cinema em qq Escola Pública/Privada sou capaz de garantir que dali surgirá uma meia dúzia interessada. Não pare de escrever. Bom 2014 para você e seus Leitores.