As palestras do Romeo Busarello são sempre memoráveis, e não só porque ele é um professor apaixonado e um showman: Romeo é uma fonte perpétua de grandes tiradas.
Uma delas está embutida no título deste artigo: “na escola te ensinam o que é certo, no trabalho você faz o que dá certo”.
Perfeito, sobretudo para mim, mais afeito ao pragmatismo do que ao purismo acadêmico. Parabéns pro Romeo.
Eu não tenho a propriedade do Romeo para falar de marketing com M maiúsculo, meu histórico profissional, admito, gira em torno do digital, seja como agência, cliente, veículo, plataforma, hospedagem, tecnologia e o que mais inventaram por aí. Eu assumo minhas limitações.
Se eu tentar adaptar essa tirada do Romeo para o mercado digital, eu faria um acréscimo: professores te ensinam o que é certo, clientes deveriam fazer o que dá certo mas as agências propõem o que dá dinheiro.
Meu pequeno adendo à tirada pode parecer provocativo ou acusatório, mas não é, é a história da minha vida. Um dos dramas de quem é apaixonado por digital é justamente como propor o que julga correto quando um plano ideal não se paga, ou melhor, não tem quem pague.
Quem quer pagar por um super site quando um WordPress ou Drupal resolvem, ambos gratuitos? Quem quer pagar direito por uma app robusta quando o retorno concreto não é claro? Que agência pode sustentar uma equipe de planejadores e desenvolvedores e criativos sêniores quando tudo é feito ad hoc sem previsão? Como entregar algo amazing quando a verba do cliente é pífia?
Como convencer um cliente a bancar uma agência quando Googles e Facebooks atendem o cara sem intermediário? E como o budget pra digital só encolhe, o jeito é se especializar nas disciplinas que ainda dão algum lucro, e se preparar para o momento em que isso também ficar inviável.
Quando sites não davam mais dinheiro, as agências descobriram a mina de ouro da mídia. Quando mídia começou a declinar, partiram pra social media. A hora que social media começou a perder o encanto, se aventuraram em apps. Agora que apps perderam o brilho, algumas partem pra branded content, outras para pirotecnias… e la nave va, sempre uma corrida inglória pelas áreas do digital que ainda não foram atropeladas pelo mundo do grátis.
Não admira que todo profissional mais veterano do digital tenha trocado de chapéu tantas vezes: quem anda em gelo fino avança em ziguezague.
Há exceções? Claro que há, sempre há, desde agências que ainda são mínima e milagrosamente completas a um ou outro case de sucesso, mas não se empolgue: o digital é movido a exceções. A cada cinco ou dez anos surge do nada um Google ou um Facebook ou uma Apple, e seus triunfos bilionários dão uma aura milagrosa a esse métier que sempre, sobretudo no Brasil, tem que rebolar muito para sobreviver.
Esse abismo entre o ideal e o viável não é privilégio das agências: do jornalismo até a educação passando pelo porn, toda empresa está lutando como pode para ganhar o que seu trabalho vale ou ao menos o que custa, e a batalha é dura quando seus concorrentes são ziliardários ou são robôs ou são robôs ziliardários.
Se os clientes continuam precisando fazer o que dá certo, como eles lidam com um mercado que só consegue oferecer aquilo que é viável? Fácil: reclamando muito. Abstraindo exceções excepcionalíssimas, todo clientão reclama que o mercado só traz o arroz com feijão ou então cobra preços inaceitáveis.
O que já vi muito cliente fazer é resolver em casa, montando seus próprios núcleos de inovação, social media, SEO, search marketing, business intelligence, etc.
O que sobra pras agências fazerem? Como sempre, torcerem para aparecer mais alguma “tendência” ou modinha, daquelas que o cliente topa pagar uma fortuna para parecer inovador e fazer uma página dupla na Veja anunciando que foi o primeiro a entrar no Second Life, no Pinterest, a usar QRCode, a estar no iPad ou outra “inovação” cosmética que faça o clientão parecer aggiornato.
“Inovações” assim pagam bem mas faz tempo que não tem, e enquanto não surgem novos brinquedinhos, o digital volta pro mundo frio e calculista… do Excel.
Não? [Webinsider]
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René de Paula Jr
René de Paula Jr (rene@usina.com) foi de tudo um pouco em digital mas foi e é sobretudo um publicador compulsivo de ideias, aprendizados e provocações. Mais na Usina e no Roda e avisa.