Me lembro de um professor de matemática, há muito tempo atrás elucubrando em uma aula que seria possível já termos visto alienígenas mas que, por serem completamente distintos de qualquer referência que já tivemos na vida, simplesmente não conseguimos absorver esta visão e, por isso, os ignoramos (e aí a razão pela qual os ETs são quase sempre retratados em filmes como ‘humanóides’).
Quando surpreendido por algo novo, desconhecido, o ser humano tem, como parte de sua natureza, tentar aproximar esta ‘coisa’ nova de algo que já existe. É a melhor maneira do cérebro lidar com este conflito de entendimento. Pode ver, quando você conta sobre uma novidade para alguém, uma das reações mais comuns é “Ah, é tipo xxxxxxx”.
As mais recentes discussões sobre o Whatsapp, Netflix e o catalisador destes questionamentos, o Uber, mostram que muita gente finalmente percebeu que a internet é mais do que o senso comum pregava e MUITO mais do que o mercado publicitário considerou.
Foram necessários 19 anos, um Netflix e um Uber para o Brasil finalmente entender o que é a internet.
O conceito de internet (embora não com este nome) é de 1952; no Brasil, a web tornou-se pública, ou melhor, mais disponível, no finalzinho de 1995 e, desde então, sofreu as mais diversas e injustas comparações: seria uma “revista no monitor”? “Uma televisão interativa”? Sério, as mais insanas comparações foram feitas na época.
Aliás, como curiosidade:
- Conjunto de reportagens sobre a internet (1996)
- Primeira reportagem feita no Brasil sobre o e-mail (1990)
- E o clássico americano “Guia para crianças na internet“
Se olharmos o que se fazia com a web, sempre tínhamos a replicação no online de um modelo de negócios ou comunicação offline. Mesmo uma loja online nada mais é do que uma adaptação do modelo de venda e distribuição do físico para o digital.
A real força e identidade da internet, contudo, começam a ficar mais claros que usamos como sinônimo desta rede termos como “plataforma”, “distribuído” e “conectividade”.
E isto é o que possibilitou o rompimento com modelos de negócios até então existentes e o surgimento de novos, ainda que estes sigam sofrendo o preconceito de serem comparados com modelos atuais.
Quando a sociedade adota novos comportamentos
Tendo como pano de fundo a citação de Clay Shirky – “A revolução não acontece quando a sociedade adota novas ferramentas. Acontece quando a sociedade adota novos comportamentos” -, o que vemos é a aplicação prática da conectividade e da informação distribuída; serviços que entram como uma plataforma intermediária entre o conteúdo e o consumidor, fazendo sua gestão, curadoria e distribuição.
Com a liberdade poética e irônica de buscar uma similaridade, o Uber está mais para uma plataforma de billing e busca (PayPal + Google) do que uma empresa de táxis. Nada impediria o Uber de, futuramente, concorrer com a Ingresso.com, com o Restorando – ou mesmo com o “Marido de aluguel”.
O Netflix concorre com o Telecine Now, e pode concorrer com o canal de rádio das operadoras à cabo, com o Spotify, com o Playstation Now e, se quiser, até com o Wine.com.br. Tudo e todos são concorrentes.
Outro modelo de negócio
Isso demonstra a principal falha nas argumentações daqueles que pensam que o “problema” destes novos serviços é a falta de regulamentação na “categoria”. Eles não são uma “versão digital da categoria X”, são um modelo de negócio distinto, conectado e distribuído.
Mas enquanto “regulamentação” significar “ferramenta de controle”, seguiremos vendo estas cenas lamentáveis de perseguição e coerção.
… como Henry Ford, ao não pagar o tributo sobre as ferraduras;
… como o Google, ao não escrever as notícias que indexava.
… como o Uber, uma empresa de pagamento e curadoria, ao não seguir a regulamentação dos taxis.
Mas o que o Uber tem a ver com táxi? [Webinsider]
…………………………
Leia também:
- “Manhêêê, meu brinquedo não faz nada!”
- Por que a internet das coisas é inevitável
- A era dos preços flexíveis
- 5 razões porque escrever hoje em dia é diferente
- Linear ou não-linear, eis a questão
JC Rodrigues
JC Rodrigues (@jcrodrigues) é publicitário pela ESPM, pós-graduado pela UFRJ, MBA pela ESPM. Foi professor da ESPM, da Miami Ad School e diretor da Disney Interactive, na The Walt Disney Company.
Uma resposta
Meu Deus rsrsrs. Olhando para trás nesta época, era comum cursos e mais cursos de informática espalhados em cada esquina kkkk.
Hoje as crianças já não precisam mais como nós um dia precisamos, são capazes até de ensinar os mais velhos.
O Uber e outras tantas novidades que nem mesmo sabemos precisam também desta transição entre o velho e o novo.