Depois do advento do som 6.1 e 7.1 surround nos cinemas e no áudio doméstico ninguém poderia imaginar que a indústria de codecs iria se mexer para acrescentar uma outra novidade: o som por imersão!
Eu procurei uma tradução decente para a palavra “immersive” e não achei nenhuma. É um daqueles termos que quem conhece um pouco de inglês sabe o que é, mas não encontra uma palavra correspondente que explique corretamente o significado. No passado, a gente viu isso várias vezes na informática, como “deletar”, por exemplo, adaptação de “delete”.
Não importa, o fato é que a expressão do momento na indústria de áudio do cinema é “Immersive Sound”, e ela traduz fisicamente o ouvinte ficar totalmente envolvido (ou mergulhado, se quiserem) em uma atmosfera sonora. Alguns diriam que isso já acontece desde o advento do surround. Sim, mas agora é diferente: uma grande parte da reprodução do som por imersão está acima das nossas cabeças. É como se estivéssemos fisicamente dentro na onda sonora, e com a cabeça totalmente encoberta por ela!
Os dois primeiros codecs que produzem este efeito, respectivamente o Auro3D e o Dolby Atmos começaram nos cinemas e só recentemente adentraram pela sala doméstica do consumidor. O terceiro deles, o DTX:X fez o caminho inverso, primeiro na sala doméstica, e depois nos cinemas, talvez procurando segurar a predominância do DTS HD MA na mídia Blu-Ray.
Auro3D e Dolby Atmos pedem a instalação de novas caixas acústicas para a sua melhor performance, mas o DTS:X promete funcionar corretamente com as caixas pré-existentes. Só o tempo dirá se esta promessa será cumprida.
A mudança de conceitos
O espalhamento do som ambiente sempre se deu em um único plano, mesmo quando o surround evoluiu para adicionar mais canais, chegando a 7.1 discretos.
Com o som imerso foi preciso criar camadas em níveis diferentes, três ao total. Na criação do Auro3D foram impostas todas as três, para a otimização do sistema, e como mostra a figura abaixo:
O surround convencional está destacado nas caixas de cor laranja, e ele pode ir até 7.1, embora o Auro3D não exija isso (o padrão nos cinemas continua sendo 5.1). Acima desta camada ficam as caixas superiores (“Height”) e acima destas ficam as caixas do teto (“Overhead” ou “Top”, ou ainda “Voice of God”). No esquema em branco incluso se pode ver o arranjo correspondente no ambiente doméstico, com apenas uma caixa “Top” e quatro na camada superior “Height”), instaladas nos quatro cantos da sala. A caixa do teto (“Top”) não é obrigatória!
No Dolby Atmos, caixas nas camadas superiores (“Height” e “Top”) são previstas, porém com uma diferença fundamental no layout: embora as três camadas possam ser instaladas, o codec prevê um processo de adaptabilidade que pode excluir uma ou outra, exceto nos cinemas, onde por motivos de ordem prática, as caixas da camada “Top” (caixas no teto) são obrigatoriamente instaladas. Para o ambiente doméstico, o Dolby Atmos é mais flexível: podem ser instaladas caixas no teto ou caixas com reflexão do som de cima para baixo, práticas para quem não quer ou tem meios de usar o teto para esta finalidade.
Por serem semelhantes, poder-se-ia esperar uma total compatibilidade de instalação de caixas entre o Auro3D e o Dolby Atmos. Testes feitos pela Auro mostraram, entretanto, que a instalação de caixas para Atmos trabalham corretamente para reproduzir o Auro3D, mas a recíproca não é verdadeira. Esta afirmação foi feita pelo próprio criador do Auro3D, Wilfried Van Baelen, em mais de uma oportunidade. A parte inferior do Auro3D (5.1 ou 7.1) reproduz sem problemas em qualquer sistema convencional ou Atmos.
O DTS:X é anunciado como um codec interoperacional, o que significa poder trabalhar sem conflito em outros ambientes. Para tal, a DTS desenvolveu uma plataforma com o nome de Multi Dimensional Audio (ou MDA). Trata-se na verdade da mesma mixagem orientada por “objetos”, inicialmente proposta no Dolby Atmos. Ambas diferem do Auro3D neste aspecto, visto que neste último a mixagem ainda é orientada “por canais”.
Segundo seus proponentes, o DTS:X pode trabalhar com o número de caixas existentes e de forma independente do layout. Isto em tese traria ao usuário 5.1/6.1/7.1 convencional a chance de não instalar caixas novas e de não modificar a amplificação para acompanha-las. Como o codec só chegou agora e está sendo oferecido como atualização de firmware em alguns modelos de receiver já comercializados, algum tempo irá decorrer até que o usuário final que ainda não adotou Atmos ou Auro possa se convencer disso!
Obstáculos a serem vencidos
Não é só dentro de casa que obstáculos de instalação precisam ser vencidos: um estúdio de mixagem, por exemplo, terá que fazer obras para conseguir mixar Auro ou Atmos corretamente. Na parte de software existem plug-ins para plataformas ProTools que precisam ser instalados. Para o DTS:X o MDA é oferecido em plataforma aberta sem custo aos estúdios.
Dentro de casa é de se esperar uma enorme resistência para a instalação de um número maior ainda de caixas, e não me refiro apenas ao conhecido WAF (Wife Acceptance Factor), mas à necessidade de passar mais fios, fazer obra se for o caso, ou de ter meios para instalar caixas acústicas no teto. Neste ponto, somente o Dolby Atmos permite a obtenção de som na camada superior da sala sem caixas no teto.
Haverá ainda a resistência de não haver interesse em mexer em um sistema 5.1 ou 7.1 já existente que, justiça seja feita, vem funcionando bem há algum tempo. É nisso, em última análise, que as fichas da DTS estão depositadas, se provar funcionar com a mesma eficiência dos concorrentes.
E por fim existe ainda a substituição obrigatória do equipamento, desleal em um ambiente econômico conturbado. Muitos receivers com Dolby Atmos não serão atualizados nem para DTS:X nem para Auro3D, obrigando o usuário a esquecer estes dois últimos ou então fazer nova substituição a custo elevado.
E se tudo isso não bastasse, ainda resta a questão do software, Blu-Ray neste caso. Se os sistemas não obtiverem apoio maciço dos produtores de cinema e de mídia todo este esforço irá por água abaixo, e restrito a um nicho, como já ficaram SACD e DVD-Audio.
2D ou 3D?
Nas trilhas sonoras atuais, o som se desloca para os lados ou para cima, porque a mixagem contempla apenas os eixos das dimensões X e Y (largura versus altura). Os efeitos obtidos, se bem realizados, não deixam de ser bastante envolventes, e provavelmente são mais do que suficientes para a grande maioria dos frequentadores de cinema ou interessados em home theater.
A proposta do som imerso inclui uma nova coordenada (Z), tornando o deslocamento tridimensional. Z permite a localização tridimensional de um objeto no espaço, tomando-se um ponto de referência. Os sistemas de som por imersão são obrigatoriamente 3D, por introduzirem a localização de sons no espaço em planos (ou camadas) diferentes.
A escolha do usuário para 2D ou 3D implica na instalação de caixas acústicas que possam renderizar a informação que se deseja. E aí a reprodução 3D convincente fica, até segunda ordem, restrita à instalação de caixas na parte superior da sala e em posição pré-estabelecidas pelo desenvolvedor do codec.
Críticas
Mais uma vez não existe consenso entre formatos, e muito embora os sistemas atuais de projeção digital nas salas exibidoras possam adotar qualquer sistema, o custo para que isto ocorra é demasiado e indesejado. É possível, a meu ver, que muitas salas continuarão apostando no som convencional, que nem a 7.1 chega.
A guerra de formatos não é novidade. E, como sempre, a DTS é a última a entrar em cena, com uma pose criadora que ela nunca teve, e ameaçando destronar as concorrentes de uma tacada só.
A gente já viu isso nos cinemas, aonde o formato DTS 5.1 chegou um ano depois do Dolby Digital e no final acabou abandonado por causa de problemas de manutenção nos drives de CD-ROM instalados nas cabines.
Na área doméstica, o DTS apareceu também no vídeo disco (LD) um ano após o Dolby Digital e com a eliminação completa da trilha digital PCM estéreo daquela mídia.
Na era do DVD, novo atraso, tanto com o decodificador quanto com o codec, cujo bitrate teve que ser abaixado drasticamente por conta das limitações de memória do disco, e com uma sensível redução de qualidade.
Pessoalmente, eu sou contra a guerra de formatos. Houve um momento na Internet onde rolou uma guerra suja de codecs. Hordas de fãs do DTS saíram pelos fóruns achincalhando o Dolby Digital como produto de segunda categoria. E esta guerra no final não levou a nada de útil, para variar. Nenhum consumidor se beneficiou dela.
Agora, eu assisto no Youtube um representante da DTS dizer que a empresa não deseja outra guerra de formatos, talvez por eles terem levado uma lição do mercado nos anos que se seguiram.
A meu ver, todos os desenvolvedores de codecs deveriam, sem exceção, se deterem na resolução dos conflitos entre padrões diferentes. Isto traria uma economia na instalação significativa, não só para os cinemas com também para o home vídeo.
Atualmente, a diferença de qualidade entre Dolby e DTS, no que tange ao áudio de alta resolução, é praticamente nenhuma.
Por outro lado, as limitações de informações são ainda preocupantes, não só para a instalação como também para os custos envolvidos.
Não adianta dizer que se pode usar os layouts de caixas existentes e ainda assim obter o máximo que o codec 3D oferece. É preciso demonstrar parâmetros dentro das salas de cinema, para onde o formato de som é incialmente dirigido.
E neste ponto nós aqui estamos praticamente órfãos. Se algum leitor conhece alguma sala de exibição no país com Atmos ou Auro3D por favor me avise! [Webinsider]
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.
2 respostas
Olá, Anderson,
Sorte a sua. Por aqui as salas com Dolby Atmos são praticamente inexistentes, com exceção de uma da cadeia UCI, que fica localizada na zona rural e, ao que consta, não exibe quase nada neste formato. É difícil entender por quê.
Eu já desisti de correr atrás disso, ainda mais porque a oferta em discos continua razoável, apenas com o agravante de se ter dificuldade para achar informações nas contracapas em relação ao formato de áudio.
Li seu artigo muito util por sinal aqui em floripa existi um sala com dolby atmos 36.000wats de potencia com 7.1 canais na minha opiniao melhor sala de cinema.do pais e ainda roda filmes em 8 k digital