Decidir entre alimentos mais saudáveis ou opções mais hedonísticas tem sido um dilema diário para boa parte das pessoas. A luta entre o prazeroso e o funcional acontece a cada rolagem na tela de um app, prateleira de supermercado ou passada de olhos em um cardápio.
Com os dispositivos digitais, não só a escolha, mas também o pedido do alimento passou a contar com uma interface digital, visual, interativa e que, conforme pesquisadores da Universidade Chinesa de Hong Kong, também pode influenciar naquilo que desejamos comer.
Os doutores Hao Shen, Meng Zhang e Aradhna Krishna comprovaram, através do estudo Computer Interfaces and the Direct-touch effect: Can iPads increase the choice of hedonic food?, que dispositivos cuja seleção de alimentos conta com interfaces de toque (como iPads, por exemplo) fazem com que os consumidores prefiram alimentos mais prazerosos em detrimento de alimentos funcionais (saudáveis).
Eles pesquisaram o uso de dispositivos de toque direto (“direct-touch”) como tablets, smartphones e menus interativos de restaurantes (totens e dispositivos de mesa), onde o consumidor pode tocar diretamente na imagem do produto que quer consumir e os compararam com dispositivos onde a seleção é feita com representações gráficas (desktops e laptops, com uso do mouse ou mousepad).
Como as interfaces de toque influenciam a escolha
Seu questionamento estava baseado na previsão de que interfaces de toque estimulam maior relação afetiva em detrimento da racionalização cognitiva e, portanto, afeta as decisões favorecendo opções que tragam prazer ao invés do que seria racionalmente mais adequado. Deram a isso o nome de Direct-touch effect (Efeito de Toque Direto, em tradução livre).
Em um de seus testes, com 85 alunos da Universidade de Hong Kong, ofereceram a estes estudantes a possibilidade de escolher entre um bolo de chocolate e uma sala de frutas como recompensa de uma atividade. Em interfaces de toque direto, 95% deles optaram pelo bolo de chocolate contra 73% na interface indireta. A experiência foi replicada diversas vezes, alterando-se o posicionamento dos itens na tela e as opções disponíveis (como um cheesecake versus sala de frutas); os resultados seguiram similares.
A pesquisa também testou a influência da proximidade do botão de seleção e da imagem do alimento e chegaram à conclusão de que quanto mais próximo o clique para seleção do alimento, mais presente é o direct-touch effect. No teste entre o cheesecake e a sala de frutas, a sobremesa hedonística foi selecionada por 83% dos estudantes nos casos onde o botão de seleção estava mais próximo do alimento (contra 66%).
Um dos argumentos considera que as pessoas levam mais ou menos tempo para decidir em cada tipo de dispositivo – usar o mouse é menos natural, logo, precisam gastar mais tempo para processar a atividade e, com isso, acabam ativando mecanismos de decisão cognitiva que lhes dá o tempo necessário para refletir sobre o alimento mais funcional.
Outra hipótese é o mecanismo de recompensa ativado no cérebro com a proximidade entre o corpo (dedo) e a representação visual de uma recompensa prazerosa.
Tocar a imagem de um bolo de chocolate ou cheesecake automaticamente projeta as percepções (textura, sabor, odor) do alimento, antecipando estas sensações e, portanto, tornando esta decisão uma ação “impensada”, ou melhor, não racionalizada.
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JC Rodrigues
JC Rodrigues (@jcrodrigues) é publicitário pela ESPM, pós-graduado pela UFRJ, MBA pela ESPM. Foi professor da ESPM, da Miami Ad School e diretor da Disney Interactive, na The Walt Disney Company.