Como montar um computador: parece fácil em muitos vídeos do YouTube, mas a escolha dos componentes mais adequados não é simples.
Eu vejo todo dia um enorme número de vídeos inundando o YouTube com orientações, tutoriais e experimentações em montagens de todo tipo de computador. É verdade que alguns desses vídeos são pura propaganda, disfarçada de tutoriais, enquanto outros parecem tentar resgatar uma informática do passado que perdeu o seu lugar. Mas, é aquela estória: assiste quem quer!
Na década de 1990, meu irmão e eu, junto a vários amigos, circulávamos pelos corredores do Edifício Avenida Central (Avenida Rio Branco 156, Centro, Rio de Janeiro), onde lojas de informática vendiam peças (a maioria contrabando mal disfarçado) para montagens de algum tipo de computador. Naquela época, eu conheci um senhor que tinha uma empresa legítima de importação dessas peças, com escritório na Barra da Tijuca. Infelizmente, um belo dia ele me relata que não consegue competir com a inundação de memórias falsas, vendidas a preços vis, vindas do Paraguai. E algum tempo depois, fechou a sua empresa.
A odisseia das montagens
Para se montar um micro não bastava apenas conhecer as peças e onde elas se encaixavam, mas principalmente conhecer o que estava à venda. E na maior parte das vezes a pesquisa de informações era feita através das revistas especializadas.
A propaganda aparecia na publicação chamada de Computer Shopper, onde se podia ler orientações e análise de componentes muito abrangentes. A edição que pairava por aqui era americana, mas quando eu morei fora eu me orientava pela edição britânica.
Em tempos de Internet e YouTube, algo parecido, mas não igual, também pode ser visto ou consultado. Mas, com algumas ressalvas, porque não existe responsabilidade editorial de quem publica. Assim, qualquer um pode dizer o que quiser e fica por isso mesmo!
Recentemente, e já um bocado defasado do que vem sido construído pela indústria, eu comecei a procurar peças para uma montagem, que pudesse ser de boa qualidade, mas sem comprometer o orçamento, coisa muito difícil hoje em dia!
E empaquei na escolha da placa gráfica que atendesse a esses dois pré-requisitos. Isto porque a grossa maioria das análises e comentários se refere a jogos e não à criação de conteúdo. Como são dois tipos de aplicação completamente diferentes, quem assiste e não joga, fica em um mato sem cachorro!
Confiar nas páginas dos fabricantes e/ou no suporte por eles fornecido nem sempre ajuda. Como eu sou, por natureza, muito lento de raciocínio, foi preciso dar tempo ao tempo.
Em um dado momento, a única saída foi começar a ignorar as opiniões e análises, e me inteirar das novas tecnologias, tipo chipset, GPU, etc., depois comparar com que eu já uso e tentar traçar um paralelo de aperfeiçoamento. Claro que, sem testar instalando a placa em um slot PCIe confiável, esta tarefa é muito difícil. Porém, confiar em desempenhos de jogos, coisas como número de quadros (“frames”) por segundo em um dado jogo, também não faz o menor sentido.
No final, depois de meditar muito e cruzar os dedos, eu parti para uma placa MSI Geforce RTX 4060 Ti, mostrada abaixo:
No design da placa, uma novidade: ela é extremamente compacta. Mais ainda, quando comparada à minha antiga EVGA GeForce GTX 1080 SC, que ficou instalada no meu computador por seis anos, sem deixar de atender à carga de trabalho diária.
As dimensões compactas dessa placa não a impedem de uma refrigeração adequada, quando trabalhando em sobrecarga. Em carga mínima, os seus ventiladores nem funcionam, ficam parados!
Além disso, uma vez montada na placa-mãe, ela deixa espaço interno no gabinete para que o ar vindo dos ventiladores frontais circule livremente, arrefecendo todo o ambiente.
As contradições esperadas
Se eu fosse fazer uma escolha de placa gráfica baseada exclusivamente em performance de jogos, esta placa bem que poderia ser a minha última opção. Uma quantidade significativa de vídeos arrasa com a qualidade das placas da série 4060. Em princípio, eu estaria investindo no produto errado.
Depois da 4060 Ti instalada, eu resolvi fazer várias medições. Eis o que eu achei rodando o aplicativo Nero Score:
O resultado não me parece ruim, até mesmo para os jogos, caso eu os usasse.
Para mim, até hoje, qualquer montagem deve ser precedida do maior grau de compatibilidade possível entre os componentes. Por exemplo, no estudo e planejamento dos barramentos, deve-se escolher componentes que possam executar as suas tarefas com o máximo de trânsito de dados. Se a placa-mãe escolhida é Gen 4, as peças preferencialmente devem ser Gen 4 também.
Existem graus de retro compatibilidade entre componentes que permitem que o computador funcione, mas, neste caso, não no seu ótimo. E este é, sem dúvida, o maior empecilho de quem quer trocar componentes mantendo a mesma placa-mãe e o mesmo sistema.
É sempre bom lembrar que os computadores são baseados em microprocessadores programáveis. Por isso, os sistemas operacionais são escritos de maneira a usar comandos e instruções que acompanhem a evolução desses processadores.
Uma das coisas mais absurdas que eu vejo nos vídeos do YouTube é alguém experimentar rodar sistemas operacionais antigos em máquinas atuais ou vice-versa. Pode até rodar, mas faz sentido?
E, estendendo o raciocínio, eu posso confiar nas análises de componentes debaixo de uma notória tendenciosidade?
A RTX 4060 Ti, segundo essas análises de jogadores, é um projeto fracassado. Porém, analisando seus recursos ponto a ponto com calma, não é bem assim. Ainda mais quando as aplicações nunca envolvem jogos.
A Internet é um enorme banco de dados, com recursos nunca antes disponíveis. Mas, como todo banco de dados, quem os preenche precisa ser responsável. O meu irmão foi um que falava muito comigo sobre isso, e ele tinha razão. O problema é que na Internet todo mundo publica ou fala o que quer, em nome da liberdade de expressão, e é sempre assim, não é não? Contestar esta liberdade é imprudente, mas permitir que alguém engane os outros também! Nos vídeos onde ressalvas são feitas por quem analisa, pelo menos se sabe que quem afirma alguma coisa se sente responsável por quem ouve ou assiste.
No final das contas, quem escolhe peças de computador sem nenhum critério vai sofrer com o resultado das escolhas. E nesses casos, se o usuário que faz a montagem não tem experiência, deve, a meu ver, se aconselhar e comprar um computador pronto, montado por uma empresa confiável. Pelo menos, se der errado ou não ficar como desejado, ele ou ela terão com quem reclamar! [Webinsider]
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.