Sergio Mendes, na sua época pós Bossa Nova, e ainda tentando sobreviver nos Estados Unidos, criou o grupo Brasil ’66, cujo primeiro disco na gravadora A&M Records, vendeu mais de um milhão de cópias.
Quando Sergio Mendes gravou o disco Herb Alpert Presents Sergio Mendes & Brasil ’66, para a gravadora A&M Records, com a aprovação entusiástica de seus donos Herb Alpert e Jerry Moss, o sucesso foi imediato, com mais de um milhão de cópias vendidas. A primeira faixa, “Mais Que Nada” teve seguidores entre vários intérpretes de Jazz, encantados com o arranjo de Sergio Mendes para a música. O disco como um todo soa diferente, é alegre, com muito swing e tons românticos. Não tinha como não dar certo.
No Brasil, o disco foi lançado pelo extinto selo Fermata, em mono, com idêntico sucesso. A gravação está hoje fartamente disponível, mas anos atrás não existia nenhuma cópia remasterizada. A minha cópia, por exemplo, foi adquirida com muito esforço de pesquisa, na versão A&M japonesa, que apresenta um som um pouco agressivo dos vocais, podendo ser um problema da própria master usada.
Sergio Mendes aparentemente deu sorte na sua vida de músico, sendo reconhecido aqui e lá fora. Oriundo de Niterói, ele logo se juntou ao movimento bossanovista. Segundo um antigo colega da universidade, igualmente músico nascido em Niterói e conhecido dele, Sergio começou a aprender piano cedo, mas fugia das aulas para jogar futebol, para desespero da mãe, que, segundo esse meu colega, gritava para ele ir para a aula de piano!
Anos depois, Sergio foi tocar no Beco das Garrafas, reduto do movimento, onde se agregavam muitos músicos, que, como ele, acabaram indo eventualmente para o exterior, muito em razão do absurdo preconceito contra a música que eles tocavam no Beco.
Em 1962, estava ele com o conjunto Bossa Rio, tocando no Carnegie Hall, local onde vários músicos de Jazz se juntaram para conhecer de perto a Bossa Nova. Logo a seguir, Sergio e o seu sexteto gravaram com o grande saxofonista Cannonball Adderley. Tempos depois, outro grande disco, The Swinger From Rio, desta vez o saxofonista Phil Woods, o trompetista Art Farmer e o flautista Hubert Laws. Estas gravações, todas elas imperdíveis para o colecionador, são um atestado claríssimo de que a Bossa Nova tinha chegado lá para ficar. E Sergio também!
Antes disso, na Philips, Sergio e o Bossa Rio gravaram em 1964 um disco hoje antológico, chamado “Você Ainda Não Ouviu Nada”, um título que mais parece uma fala de Al Jolson no O Cantor de Jazz. O disco não passou desapercebido, e foi editado pela Atlantic, com o nome “The Beat Of Brazil”.
A discografia de Sergio Mendes começou no início da década de 1960, dentro do primeiro estúdio da Philips, então Companhia Brasileira de Discos, com uma gravação em dois canais (mixado para mono), chamada Dance Moderno. A formação do Bossa Rio veio depois, nas incursões do Beco das Garrafas.
Um documentário recente sobre toda essa trajetória foi produzido há algum tempo atrás, com o nome “Sergio Mendes in the key of joy” (no Brasil, Sergio Mendes no tom da alegria), feito para a HBO, e ainda pode ser visto on-line.
O documentário nos mostra claramente que o Sergio Mendes que nós conhecíamos na década de 1960 desapareceu, o que é compreensível, e Sergio não foi o único músico que alcançou sucesso com a música de origem e teve que se renovar em outros gêneros, inclusive para poder sobreviver.
O “Brasil ‘66”
A fuga, se podemos assim dizer, de muitos músicos e compositores bossanovistas para a América, fez com que todos eles fossem gravar para vários estúdios de lá.
Sergio, depois de tentativas frustrantes de se estabelecer na América, conheceu Lani Hall, próximo da montagem de uma nova banda, aquela que levou o nome de Brasil ’66, ano em que começaram a gravar.
No disco inicial é possível entender o fascínio de Sergio por Lani Hall, dona de uma voz sensualíssima, que se percebe muito na faixa Slow Hot Wind, na realidade uma bela composição escrita por Henry Mancini, com o nome de Lujon, para a trilha complementar de Mr. Lucky Goes Latin.
A composição do Brasil ’66 mudou várias vezes, e às vezes é difícil sabe-las com exatidão, porque os discos naquela época raramente mostravam a lista dos músicos participantes. É possível que a primeira formação tenha sido:
Sergio Mendes – piano, Bob Matthews – contrabaixo, João Palma – bateria, José Soares – percussão, Lani Hall e Janis Hansen – vocais.
Anos mais tarde, Lani Hall, que havia se casado com Herb Alpert, deixou o grupo, deixando Sergio desolado, e com razão. Mas, ele depois conhece Gracinha Leporace, cantora de muito bom nível, e que iria se tornar a sua segunda esposa.
O som do Brasil ’66 passa longe da Bossa Nova, mas não deixa de ser original, uma espécie de mistura de gêneros, e sempre mantendo o mesmo espírito na maioria dos arranjos.
Nós que ainda sonhamos com o melhor do passado não podemos nos queixar. Mudando ou não de repertório Sergio Mendes continua na nossa lembrança e só nos resta agradecer a ele por sua trajetória nos bons e inovadores tempos que vivemos na adolescência. [Webinsider]
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A influência da Bossa Nova na música popular romântica norte-americana
Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.