Sem perspectivas para o futuro (Tamba Trio, lembra?)

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Eu tenho cotidianamente a sensação de estar vivendo em país sem memória. E aconteceu que eu só soube agora do falecimento do grande músico Bebeto, ex-Tamba Trio, no ano passado. E a gente bem que poderia não tomar conhecimento abrupto dessas notícias na mídia. Perde-se o homem, perde-se a sua memória, sem a gente poder fazer nada a respeito!

 

Eu comentei recentemente com o nosso editor-chefe Vicente Tardin que, volta e meia, eu me surpreendo com alguma notícia que não estava esperando. E foi o que aconteceu recentemente, quando soube do falecimento do músico Adalberto Castilho, o Bebeto, do Tamba Trio, ocorrido em março do ano passado!

Em março de 2020, eu havia perdido um grande amigo, sem saber o que tinha havido com ele. E, por mera coincidência, o seu vizinho de prédio Durval Ferreira, tinha sido visto pelo porteiro andando cabisbaixo. Logo a seguir, em junho de 2007, o Durval faleceu.

Durval e Bebeto foram figuras icônicas do movimento bossanovista. O envolvimento deles ocorreu mais forte ainda quando o Tamba Trio foi formado, o Durval tendo participado de várias gravações do Tamba, notadamente do disco antológico “Avanço”, de 1963, disco este que marcou o início da minha paixão pela Bossa Nova.

Eu havia encontrado e conhecido o Bebeto e o Durval, no show de uma casa noturna no Flamengo, levado por aquele amigo, que morava lá na Rua São Salvador. Houve muita coisa positiva acontecendo naqueles momentos. O Durval gravou o disco Batida Diferente, e para tal contou com o extinto Quarteto 004, o qual, por acaso, era composto por amigos desse amigo meu.

Naquela oportunidade, eu dei a sorte de conversar com o Bebeto sobre o que eu sentia pelo Tamba Trio, na minha adolescência. Ele sentou-se conosco, no intervalo do show, e a conversa foi longe. Depois, eu e ele trocamos e-mails, um dos últimos quando ele me disse que iria sair o disco “Amendoeira”. Depois disso, nossos contatos foram diminuindo e desapareceram.

Eu nunca tive a chance de propor, seja ao Bebeto seja ao Durval, um depoimento pessoal, que gostaria de ter publicado aqui no Webinsider, e isso se deveu muito à minha timidez com ambos. O Bebeto foi entrevistado pelo jornalista Tarik de Souza, no programa do Canal Brasil, cujo vídeo eu compartilho:

Durante os nossos breves contatos, o Bebeto confirmou que havia gravado com o músico americano Paul Winter, quando este veio aqui ao Rio, no início da década de 1960. Seu nome, que eu me lembre, não aparecia nos créditos, motivo da minha pergunta a ele sobre isso, depois que eu consegui resgatar a gravação.

No nosso primeiro encontro, eu disse ao Bebeto que não tinha conseguido conservar o disco do Tamba de 1968, que ele me disse que ainda tinha em elepê. Então, eu pedi a ele uma cópia, mas ela nunca veio até mim. O CD saiu no Japão e eu imediatamente o importei, junto com A Grande Bossa Dos Cariocas. A partir daí, fui eu quem lhe ofereceu uma cópia do disco do Tamba, mas curiosamente ele declinou, sem maiores explicações. Entretanto, me pediu uma cópia do disco dos Cariocas, que nunca saiu por aqui. Aliás, aquele meu amigo da São Salvador me disse que esteve presente nos ensaios dos Cariocas, antes de eles irem para o estúdio da Philips fazer as gravações. Então, para nós dois, o CD foi um resgate muito importante.

Eu descobri que os japoneses adoram Bossa Nova, e eu aproveitei para mandar trazer o que faltava dos discos do Tamba. Além disso, um amigo meu americano tinha comprado no Japão o disco Avanço, de 1963, e me mandou uma cópia. Na época, eu tinha remasterizado esta gravação em casa, mas o elepê que eu tinha já estava roto de tanto ser tocado. Não fosse assim, nada deste importante material teria sido resgatado.

Eu nunca entendi direito esta ausência de antologias das gravações da Philips. O técnico de gravações Toninho Barbosa havia me assegurado que todas as matrizes estavam em plenas condições de reprodução e, portanto, poderiam ter sido remasterizadas aqui.

Décadas atrás, eu recebi um convite do UMG, detentora do catálogo da Philips, para fazer uma lista dos discos mais importantes da Bossa Nova. Mas, o projeto deles nunca foi adiante!

Eu só sei que o Bebeto estava muito chateado com o lançamento no Japão da discografia da Philips, reclamando que ele não tinha a menor chance de receber direitos autorais pelo seu trabalho.

Em anos recentes, eu soube por um amigo, que o Bebeto frequentava aquele encontro de música que acontecia na extinta loja da Modern Sound, em Copacabana, à procura de algum trabalho. Eu achei, e ainda acho, isso muito triste. Não acho justo um músico da estatura do Bebeto, e que fez parte da história do movimento bossanovista, ser esquecido ou tendo que cavar trabalho.

Mas, infelizmente, faz parte! Durante décadas, que eu ouço pessoas falando em cultura, inclusive musical, e nunca se sabe sobre que tipo de cultura elas estavam falando. Ícones da música do passado que o digam. A desvalorização temporal de músicos ou compositores nunca poderia ser estímulo a jovens talentos, sem falar na dificuldade de, em plena era da Internet, conseguir informações a respeito de gravações ou estúdios, que fizeram parte da história da nossa evolução musical. Claro que, com o desaparecimento de todos esses ícones, nada mais se pode fazer, a não ser lamentar as perdas dessas pessoas e das suas memórias. [Webinsider]

. . .

Durval Ferreira, simplesmente!

Tamba Trio e Tamba Quarteto

Avatar de Paulo Roberto Elias

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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