O seriado Dark Matter: matéria escura ou matéria obscura?

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No seriado Dark Matter, dentro de uma caixa aparece um corredor infinito, com portas que se abrem para universos diferentes.

Dark Matter é um seriado de ficção científica e mistérios, onde, dentro de uma caixa construída por um cientista, aparece um corredor infinito, com portas que se abrem para universos diferentes. O script não é de fácil compreensão e a narrativa às vezes morosa e enigmática.

 

O seriado Dark Matter (literalmente “Matéria Escura”), produzido pela Apple, para o Apple TV+, está prestes a terminar. Trata-se da primeira temporada, se vai haver outras, eu não sei dizer. Eis o trailer:

Nos primeiros episódios, o ritmo é inacreditavelmente lento e monótono, e eu cheguei a pensar em deixa-lo de lado. Eu, como acredito estar na situação da maioria dos brasileiros, não li o livro no qual ele se baseia. De qualquer forma, a estória é uma ficção científica, motivo pelo qual eu fui atraído, mas com enredo recheado de mistérios.

O problema central que me confundiu, desde o início, e aí eu me arrisco a dizer que o seriado vai ou já confundiu quem não está familiarizado com o assunto, é a tradução dos termos no qual o seriado se baseia. E, antes de mais nada, eu quero afirmar que ninguém que assiste uma obra dessas, não importa se filme ou seriado, é obrigado a conhecer o assunto em pauta.

Eu imagino que muitos dos conceitos expostos neste seriado não são do conhecimento da vasta maioria do público, e eu cito, como exemplo, as opiniões e comentários postados no IMDb, onde quase todos deixaram de falar sobre os princípios teóricos de física quântica arrolados pelo autor do livro.

Como esta não é a minha área também, eu me senti compelido a procurar uma luz sobre o que estava sendo mostrado na tela, e assim foi:

A tal Matéria Escura é uma teoria derivada da astronomia, a qual se refere a um tipo de matéria que não interage ou se assemelha com outros tipos de matéria, portanto de natureza indefinida.

Outro termo usado no seriado é o da “superposição”, princípio da física que diz que quando duas ou mais ondas (senoidais) chegam a um mesmo ponto, ao mesmo tempo, elas interagem entre si, produzindo uma onda resultante. Este princípio, diga-se de passagem, é conhecido pelos audiófilos, no tratamento acústico da sala de audição, em cujo ambiente não podem existir ondas estacionárias.

Logo no início, o professor e cientista personagem do seriado explica a teoria conhecida como “O Gato de Schrödinger”, proposta pelo físico austríaco Erwin Schrödinger, que diz que se alguém colocar um gato em um cubículo fechado, onde estão contidas substâncias capazes de matar o gato, o experimentador não poderá saber se as substâncias tiveram efeito letal ou não, antes de abrir a caixa. Assim, pode-se presumir que o gato estaria morto e vivo ao mesmo tempo!

O corredor infinito

O cientista do seriado inventou uma caixa também fechada, onde a pessoa que entra lá dentro pode ver ela assumir mais de um estado físico, logo que a porta de entrada é fechada. Quando a caixa se fecha, ela se transforma em um corredor escuro, que não tem fim. Ao longo do corredor, existem portas que se abrem para um mundo diferente do qual o personagem existia previamente, o chamado “multiverso” ou múltiplos universos.

Na trama, o cientista Jason Dessen é raptado por uma versão de si mesmo, vinda de outro universo, e a sua luta será impedir que esta outra versão atinja o seu objetivo de ocupar o seu lugar e destrua a sua vida.

Metáforas do multiverso

Existe, pelo menos, uma coisa óbvia neste seriado, que independe do conhecimento de física quântica: tudo o que ocorre na vida de qualquer pessoa depende fundamentalmente das escolhas ou opções feitas durante a trajetória de vida. Assim, a vida de qualquer um pode mudar radicalmente, diante de escolhas feitas, que levam a pessoa a um determinado caminho.

As portas do corredor infinito fazem a pessoa dentro da caixa entrar em um universo onde aquela pessoa vê uma atmosfera ou vida diferente da sua!

Neste trajeto, à procura da sua vida original, o cientista Dessen é acompanhado pela sua ex-namorada Amanda, com quem ele teve um relacionamento em uma dessas vidas. No final, a procura de ambos se mostra diferente, porque Amanda quer encontrar um mundo (universo) onde ela se sinta feliz e realizada. Mas, não é isso que a maioria de nós quer também?

A metáfora, no sentido de achar o universo ideal, então, fica finalmente muito clara. Mas, só que para conseguir isso, será preciso achar também a melhor versão de si mesmo.

A filosofia de vida de cada um

Deixando Dark Matters de lado por um momento, é fácil entender porque que as trajetórias de luta de cada ser humano dependem muito das escolhas que ele faz na vida. Não só isso, mas da sua capacidade de tentar vencer obstáculos!

Lá em casa, eu dei a sorte de ter o exemplo da minha mãe: foi uma moça pobre, nascida em Cabo Frio, quando aquela cidade era um vilarejo, junto com quatro irmãos, que lutaram todos pela sobrevida, porque o meu avô havia constituído outra família escondido, na cidade vizinha, e abandonado a minha avó ao Deus dará. Eu não conheci nenhum dos dois avós, e nem sei o que se passou. No entanto, a minha mãe nunca perdeu o otimismo. Saindo de lá, indo para o Rio de Janeiro morar com uma tia, ela foi à luta.

Como ela só tinha cursado apenas o primeiro grau, ela incentivou seus filhos a estudar. Ela, mesmo com pouca cultura, sabia que o principal objetivo dos pais é fazer esforço para que os filhos avancem na vida, ou seja, ser melhor do que eles. Além disso, ela teve o bom senso de permitir aos filhos escolher o que fazer da vida. Nestas circunstâncias, cabe aos filhos entender e assumir para si este esforço, caso contrário, o objetivo dos pais terá sido em vão!

Em Dark Matter, as escolhas de vida afetam diretamente o personagem Dessen, uma vez consciente de que é possível escolher caminhos (as portas do corredor) cujo resultado é imprevisível.

Na prática, isto significa, não só para o personagem, mas para cada um de nós, que quando as escolhas são corretas, é possível avançar na vida, e quando não, acontece o contrário, não há avanço algum.

Notem que, na vida real, o mesmo se aplica ao universo onde se vive, e é assim que países avançam e progridem e outros ficam sempre estacionários ou atrasados.

Durante a adolescência, a minha santa mãe me dizia sempre “vai estudar, Paulo Roberto”, sem me obrigar a fazer isso (a liberdade de escolha foi minha), mas eu só queria ir para a rua jogar futebol. Depois da adolescência, já na faculdade, a ficha caiu! E eu aprendi, com o correr do tempo, que o campo de trabalho se soma à toda e qualquer cultura, quer dizer, é preciso e necessário abrir a cabeça para um universo de conhecimento até então desconhecido.

Cada um desses universos de conhecimento é uma porta para um mundo que a gente não conhece ainda. É neste ponto que o seriado da Apple tem a sua razão de ser. Em tese (sem trocadilho) é muito difícil, quase impossível, assimilar todos os mundos de conhecimento, mas é sempre recomendável saber do que estes mundos abrangem e se tratam.

Qualquer um pode conhecer um pouco de tudo, e isto aumenta a capacidade de raciocínio, porque não existe o que alguns chamam erradamente de “cultura inútil”. A erudição que resulta da abrangência de novos conhecimentos permite a qualquer um melhorar o seu padrão intelectual de vida, e rentar entender o que está se passando no universo, não importa qual seja. Difícil, sem dúvida vai ser sempre, mas impossível não!

Na minha trajetória pessoal, eu me defrontei com a informática e com a redação de programas, com enorme dificuldade. Mas, a lógica da programação me trouxe o conhecimento de um universo de escolhas e um mundo de opções. E não é sempre assim com a vida de qualquer um? [Webinsider]

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A física quântica aplicada ao profissional e pessoal

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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