Top Gun é muito bem feito tecnicamente, mas não acrescenta nada

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A nova versão de Top Gun é tecnologicamente perfeita, mas o enredo e a trama são apenas uma repetição do filme original, feito em outra época, com inimigos diferentes, que não existem mais.

A nova versão de Top Gun é tecnologicamente perfeita, mas o enredo e a trama são apenas uma repetição do filme original, feito em outra época, com inimigos diferentes, que não existem mais.

 

Eu assisti Top Gun (1986) no cinema, e não gostei do que vi. Existe neste filme um lado quase subliminar, invocando o machismo de adolescentes, superioridade étnica, e outras comparações nada lisonjeiras, lembrando os escombros da guerra fria.

36 anos atrás, Tom Cruise era uma espécie de queridinho das adolescentes, e talvez por isso o filme tenha tido sucesso nas telas. Mas, 35 anos depois, como era de se esperar, o Tom Cruise que se vê na tela é completamente diferente, em todos os sentidos. Aliás, com o tempo e a maturidade, ele ganhou a fama de fazer as suas próprias cenas arriscadas e dispensar dublês, e se vê isso em profusão na franquia Missão Impossível.

Mesmo não tendo gostado do filme de 1986 eu resolvi arriscar assistindo Top Gun: Maverick, o título em referência ao personagem controverso Pete “Maverick” Mitchell, herói em um filme, apesar de indisciplinado, e herói no outro filme, ao provar que o seu lado indisciplinado venceu obstáculos considerados intransponíveis em uma missão arriscada.

O filme de 2022 tem tudo o que o outro não tem, em termos de avanços tecnológicos do cinema: IMAX digital (com som Sonics DDP, de 12 canais), Dolby Atmos, Auro 3D 11.1 e outros avanços.

A imagem se desdobra em 1.90:1 (IMAX) e 2.39:1 (Panavision). Somente na edição em Blu-Ray (4K ou 2K) é possível assistir o filme nas suas relações de aspecto originais e som da trilha Dolby Atmos mostradas nos cinemas com IMAX.

Eu não vi a versão IMAX no cinema, mas comprei o Blu-Ray 4K, de modo a poder ver a versão original. Desnecessário dizer que ambos imagem e som são de primeira qualidade.

Eu gostaria de dizer o mesmo sobre o novo filme, mas infelizmente continuo no grupo daqueles que não aceitam este heroísmo idiota, cercado de pseudo lições de moral por todo lado.

Sob o ponto de vista técnico, o novo Top Gun é um primor. O Blu-Ray 4K excede qualidade. Mas, o filme em si deve agradar, imagino eu, ao público norte-americano que aprova sandices bélicas tipo Desert Storm, invasão do Iraque e de outros países, em nome da “democracia” ou da “prevenção do terrorismo”.

Nem sempre filmes de Hollywood endossam estas duas premissas, alguns até criticam as intervenções americanas. Eu já vi até seriados de TV que mostram o lado humano da comunidade árabe muçulmana. Mas isso não é a regra. A visão que costuma ser incluída nos roteiros é a de que todo aquele árabe muçulmano que vê a sua família destruída por bombas ou drones se torna um potencial terrorista, e que deve ser eliminado da face da terra. A complexidade de tais abordagens é constantemente desrespeitada, ao se monopolizar tendenciosamente a visão de terrorista como qualquer indivíduo ou grupo que não se encaixa no ocidente ou até odeia a sociedade bélica americana.

O problema que este tipo de cinema enfrenta é que a guerra fria acabou, e isso notoriamente causou um desbalanço, na vida real, de poder no resto do planeta. Na vida real, o que se pode perceber é que, uma vez finda a motivação da guerra fria como arma de defesa, os políticos americanos procuraram outras razões e motivações para se afirmarem como sociedade democrática. E esta cantilena, infelizmente, foi parar no cinema que apoia ou procura apoio do público que compartilha esta visão de mundo!

Uma coisa que me impressionou negativamente no novo Top Gun é que, como cinema, ele é um repeteco do filme de 36 anos atrás, nada de novo foi mostrado. Para ter certeza de que, como fã assíduo de cinema, eu não estava me enganando, eu revisitei o filme de 1986, disponível no streaming. Depois disso, eu noto agora que muita coisa do filme antigo tinha conteúdo para ser diferente, como, por exemplo, a direção segura de Tony Scott, e mesmo os atores, ainda jovens, com atuação convincente. Mas, nada disso aconteceu nem no novo filme.

Infelizmente, Val Kilmer está hoje muito mal de saúde, e provavelmente por isso faz apenas uma ponta no novo filme. Na versão Maverick, a produção não deixou de respeitar a diferença de tempo ocorrido entre um filme e outro: agora, Maverick é um coroa, que é reconhecido como um profissional que teve a sua época, mas esta época já passou, segundo os pilotos mais jovens. Obviamente, o enredo do filme mostra o contrário, senão não teria graça olhar Maverick como herói novamente.

Em suma, Top Gun: Maverick é tecnicamente exemplar, mas o roteiro é fraco, repete cenas já vistas, e não aproveita a oportunidade de não só acrescentar algo novo ou diferente, como fazer uma auto crítica honesta da guerra fria que já passou. [Webinsider]

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Montagem de filmes, o grande segredo do cinema

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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