Película de cinema versus imagem digital dos filmes

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A película de cinema e a imagem digital se complementam, com o auxílio luxuoso de softwares de limpeza digital de negativos.

A película de cinema e a imagem digital se complementam, com o auxílio luxuoso de softwares de limpeza digital de negativos.

 

Desde a década de 1990 houve um tremendo esforço na conversão da película de cinema, incluindo negativos, para a imagem digital, com o objetivo, naquela época, de lançar videodiscos (Laserdisc, por exemplo) com uma qualidade superior de reprodução.

Os avanços tem sido impressionantes. Já de algum tempo foi possível se lançar mão de um negativo de câmera deteriorado e com ele transferir a imagem para o vídeo de altíssima resolução, algo impensável alguns anos atrás.

Além disso, o tratamento por softwares de limpeza digital competentes deu chance técnica aos restauradores a corrigir falhas na película, antes complicadas de resolver.

Simultaneamente, as telas de televisão e projetores de vídeo também avançaram significativamente. Com os aprimoramentos no tratamento da imagem do front-end (dispositivo de reprodução) usado, e com os recursos de inteligência artificial aplicados nesta reprodução, é possível hoje assistir um filme em vídeo satisfatoriamente!

Eu confesso que sou fã incondicional da película de cinema e lamentei muito, quando anos atrás, o Orion Jardim de Faria (Incol 70/35) me avisou que os projetores de película seriam retirados dos cinemas e substituídos por modelos alimentados por disco rígido contendo o filme a ser exibido, em formato DCP.

Para mim, a película não tem substituto dentro das salas de cinema, mas dentro de casa ela é dispensável, dependendo, é claro, de quem não tem condições de projetar película, como antigamente, hábito que ficou restrito apenas aos colecionadores.

Eu aposto que quem assistiu filmes em cinemas na maior parte de suas vidas, vai sempre racionalizar a projeção em termos de película. Anos atrás, eu estava em uma sala multiplex do shopping local, e a tela era pequena. Na minha frente, sentaram uns garotos, e quando a projeção começou um deles disse aos outros: “parece a televisão lá de casa”. E ele estava certo!

Se este menino tivesse alcançado os antigos palácios de cinema, certamente iria se ressentir mais ainda. Porque, para ver uma imagem de um filme em dimensões reduzidas, nem é preciso sair de casa!

Méritos das películas

Notem que o objetivo das restaurações foi sempre o de recuperar películas de filmes próximas da perda completa, e obviamente preservar o que for possível. As restaurações são muito caras e exigem técnicos especializados neste tipo de trabalho. O que justifica plenamente que toda e qualquer restauração possa, e deva, ser aproveitada para a transcrição para outras mídias. Neste momento, é o Blu-Ray 4K que melhor cumpre esta função.

O Blu-Ray 4K consegue reunir o áudio de alta resolução e em 3D (Atmos e DTS:X), que já estava presente no Blu-Ray 2K, com uma imagem de alta qualidade, tratada com HDR. O lançamento dos discos 4K valoriza ainda mais os esforços de restauração.

A projeção com película, por seu turno, dá ao frequentador de cinema tradicional a sensação de estar assistindo um filme. Existe uma explicação técnica para isso: os projetores de cinema exibem o filme em uma cadência real de 24 quadros por segundo, e isso não pode ser alterado. Já na TV ou no projetor, a imagem pode facilmente ser convertida para 60 quadros por segundo, tirando, muitas vezes, a sensação de percepção de se estar assistindo um filme de cinema.

Os cinemas podiam usar a projeção em películas para construir o tamanho de telas que quisessem, e para resolver o brilho da projeção os projetores eram montados com lanternas (fontes de luz) com amperagem alta. Os antigos cinemas Metro, por exemplo, usavam lanternas com 120 ampères, mostrando uma imagem na tela mais clara do que os outros cinemas. Os projetores de película 70 mm obrigatoriamente usaram lanternas com alta amperagem, por causa das dimensões do fotograma. Com a mudança para lanternas com lâmpadas Xenon, alguns cinemas exibiam uma imagem escura, problema este que foi corrigido depois.

Méritos da imagem digital

Em contrapartida, a reprodução digital tem os seus méritos nas telas atuais, que trabalham com a estrutura física montada por pixels, e não mais por pontos. Cada pixel pode ser controlado, de maneira a ser exibida uma imagem de alta resolução, em qualquer tamanho de tela. E quanto maior for o tamanho da tela, maior será a quantidade de detalhes que podem ser percebidos. O tratamento com HDR, privilégio da imagem digital, aumenta mais ainda o mapeamento de cores, o brilho da imagem, e os detalhes das zonas de penumbra, antes imperceptíveis.

No documentário sobre a restauração física e digital de Tubarão (“Jaws”), Steven Spielberg comenta que uma tela de televisão de alta resolução é capaz de mostrar uma imagem superior àquela projetada na época do lançamento daquele filme.

Se ele ousou fazer tal afirmação é porque ele sabe que a imagem digital tratada corretamente não tem oscilação de movimentos e nem incorreções de cor. Ambos os problemas podem agora serem corrigidos digitalmente!

Existe pendente uma limitação na imagem digital, que é a da resolução nativa da imagem transcrita. Um fotograma de 70 mm exigiria, em tese, um telecine com 12K de resolução. Muitos filmes transcritos com este tipo de negativo vão até 8K, mas são reduzidos para 2K ou 4K, para mídias digitais.

Esta limitação não é, na prática, percebida, porque o tamanho das telas de TV não é grande o suficiente para que a discriminação de resolução seja percebida. Assim, um filme em vídeo com 4K pode ser visto confortavelmente em telas de mais de 80 polegadas. Com os recursos atuais de upscaling, o mesmo pode ser dito, com imagens a partir de 2k de resolução.

A preservação digital e em película

Os técnicos de restauração afirmam com segurança que um novo negativo, derivado do processo de restauração, pode durar mais de 10 anos. Mesmo assim, uma cópia digital do original é sempre feita e arquivada.

Em alguns casos, como foi na restauração do filme de Alfred Hitchcock “Vertigo” (Um Corpo Que Cai), rodado em VistaVision, foi feita uma cópia em 70 mm também. A telecinagem pós restauração revelou uma qualidade de imagem surpreendente, como seria de se esperar, tanto em 2K quanto em 4K.

São nessas circunstâncias que as mídias analógica e digital encontram as suas reais aplicações. Entretanto, eu entendo que não se pode descartar o valor histórico e técnico alcançado pelo cinema do passado. O processo de vídeo Smilebox, por exemplo, simula uma tela curva, mas quem assistiu os filmes em Cinerama nos cinemas vai perceber que a diferença está lá para quem quiser ver!

O ideal seria que os cinemas preservassem os dois formatos, analógico e digital. Alguns cinemas no exterior já fazem isso, inclusive em salas com IMAX. Infelizmente, por aqui eu ainda não vi nenhum exibidor se aventurando novamente no aluguel de películas para projeção. [Webinsider]

 

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Os Aventureiros do Ouro, em 4K e Dolby Vision

Os Canhões de Navarone: um clássico filme de guerra, com excelente restauração

Cinemas de rua: não há nada que se compare a eles!

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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4 respostas

  1. Bom dia, Paulo. Saudade daquela época das cópias analógicas em 35m/mm . Nós aqui do interior de SP, recebíamos os filmes de uma distribuidora da capital e, quando chegavam as latas logo verificávamos as cópias para montagem na torre. Algumas vinham “estalando” de novas. Bons tempos de projecionista .

    1. Oi, Celso,

      Quando eu passava as férias em Cajuru, o meu xará Paulo, operador principal do cinema do meu tio, me convidava às vezes para ir na estação de trem para pegar as latas dos filmes. E também, volta e meia, quando vinha um curta (desenho da Warner, por exemplo), ele ligava um dos projetores só para a gente ver. Cópias, aliás, novinhas em folha. Às vezes, o meu tio conseguia alugar filmes que nem haviam estreado em São Paulo, capital. Coisas que eu guardo na memória com muito carinho. O Paulo me ensinou a montar as películas e a projetar, e eu sou muito grato a ele.

  2. Pois é Paulo…
    Para uma seleta parcela de Cinéfilos, que raramente frequenta uma das poucas salas de cinema ainda em funcionamento, o home theater das suas casas são a sua referência para apreciar as grandes obras cinematográficas, e aí que a coisa pega…
    Na atual conjuntura (com as excelentes Câmeras digitais em 4k da ARRI), ficou difícil para as antigas Panavision competirem em pé de igualdade.
    Ainda mais quando um filme antigo tem que passar pelo processo de telecinagem para exibição na tv ou prensagem em mídia óptica.
    O Cinema moderno está aposentando as antigas câmeras de filmagem em formato de películas, e esse processo não tem volta.

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