A magia do som nos filmes

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O som nos filmes percorreu um longo caminho, dos primeiros projetores ao som doméstico de qualidade que temos hoje.

O som nos filmes percorreu um longo caminho, dos primeiros projetores ao som doméstico de qualidade que temos hoje.

 

Esta estória eu já contei antes, mas não custa repetir, à guisa de raciocínio: quando eu fiz aniversário, ainda na pré-adolescência, o meu querido pai, sabendo que eu adorava cinema, me levou ao centro da cidade, porque ele soube que tinha um cidadão no Largo de São Francisco, que vendia projetores e rolinhos de filmes mudos, cortados em 16 mm.

Chegando lá, ele não gostou do que viu, o tal projetor parecia uma lata velha. E dali fomos imediatamente para a loja da Optica Lux, ali na Avenida Rio Branco. O vendedor lhe mostrou dois modelos dos projetores alemães E.K.A., caríssimos, mas muito modernos. O meu pai era um profissional que ganhava pouco, mas não resistiu àquela tentação de me dar o melhor presente possível para o meu aniversário.

Aquele projetor era realmente um espetáculo: tinha uma lâmpada de projeção, se não me engano, de 350 Watts de potência, refrigerada com um ventilador, e uma lente grande angular, que aumentava o tamanho da tela sem nenhuma distorção ótica, coisa de alemão mesmo! Recentemente, eu achei a imagem de um projetor E.K.A. mudo, parecido com o que eu ganhei, e aproveito para ilustrar a minha exposição:

 

No dia daquele meu aniversário, o meu pai foi na Mesbla da Rua do Passeio e alugou umas dez latas de filmes, com rolos de 400 pés, e aí aquela foi uma das festas mais felizes que eu já tive. Infelizmente, o aluguel de filmes era muito caro, e o meu pai não tinha orçamento para alugar filmes a todo momento.

A avó de um vizinho abastado, me viu passando filmes na casa do afilhado do meu pai, e foi atrás dele querendo comprar o projetor, e aí o meu pai pediu desculpas para mim, e vendeu. Com disse John Lennon, o sonho acabou, mas eu nunca iria me ressentir do pai, principalmente quando ele gastava o que não podia!

Aquele EKA foi desenhado para filmes 16 mm mudos. Por isso, as duas bordas da película eram perfuradas e assim os debitadores eram dentados dos dois lados. 0 16 mm foi uma bitola feita para levar o cinema para casa, e isto foi possível substituindo uma das perfurações com uma banda ótica:

O filme 16 mm mudo com duas perfurações podia ser projetado em qualquer projetor 16 mm, tanto assim que um projetor sonoro tinha uma chave capaz de mudar a cadência de 16 quadros por segundo (filme mudo) para 24 quadros por segundo, com som, ótico ou magnético.

A magia do som nos filmes

Quando a gente quando criança projetava filmes mudos, o jeito era imaginar como a imagem do filme seria vista com som, e nós podendo ouvir o que os atores estavam falando. Anos mais tarde, quando, com cerca de 16 anos de idade, eu comecei a aprender cinema, em um curso da PUC, eu fiquei sabendo que o som nunca foi unanimidade nos estúdios de Hollywood, e até hoje se pode achar uma citação sobre Irving Thalberg, o gênio do cinema, dizendo que o som era uma novidade passageira, e ele foi citado ironicamente no filme da própria MGM Cantando na Chuva, que aborda este período, na pele do diretor Roscoe Dexter, que diz ao chefe do estúdio sobre o cinema falado. Disse ele: “não vai dar em nada”.

Cantando na Chuva cita também o Vitaphone, inventado pela Western Electric, e usado no filme O Cantor de Jazz, considerado até hoje, como o primeiro filme falado apresentado nos cinemas. Na realidade, só parte do filme tem falas, e alguma música, o resto é pura narrativa de cinema mudo.

Mas o processo em disco foi particularmente problemático. Se o filme fosse editado, ou cortado pela censura, as gravações em disco teriam que ser refeitas, atrasando a produção do filme. Se o filme partisse durante a projeção haveria automaticamente uma perda irrecuperável de sincronismo, defeito também citado no filme Cantando na Chuva.

Na época já existia som em trilha sonora ótica, gravada na película, que impedia este tipo de erro: se editado, a parte da trilha sonora era cortada junto, e se o filme partisse durante a projeção, idem, não havia perda de sincronismo, como no Vitaphone.

A melhoria da qualidade das trilhas sonoras

As trilhas em mídia ótica eram muito limitadas em resposta de frequência e com muito baixa relação sinal/ruído, apesar de todos os esforços em aperfeiçoá-las. Décadas mais tarde, tais problemas foram resolvidos, particularmente no design do som Dolby Stereo.

A fita magnética, que iniciou a reprodução do som em alta fidelidade, inclusive no cinema, só chegou na América depois de surrupiada da Alemanha no período pós segunda guerra mundial. E quando o cinema introduziu a gravação magnética, ele o fez com um rolo de filme magnético de 35 mm, tanto no Cinerama quanto no início do CinemaScope.

Posteriormente, o processo foi aperfeiçoado, no desenvolvimento das bandas magnéticas nas películas de 35 e 70 mm. A banda magnética chegou depois nos filmes de 16 mm, 8 mm e super 8 mm.

O impacto maior da banda magnética, entretanto, se deu na reprodução das películas das salas de cinema, por causa da combinação tamanho da tela com o som estereofônico multicanal, 7 no Cinerama, 4 no CinemaScope e 6 no Todd-AO 70 mm:

O filme em 70 mm foi o que mais se beneficiou da gravação magnética, porque a película tem um fotograma de 5 perfurações, ao invés das 4 do filme 35 mm, e isto faz com que mais filme passe pelo leitor magnético, independente da cadência de 24 ou 30 quadros por segundo. O aumento da área magnética aumenta a fidelidade do áudio proporcionalmente, e com o maior número de canais atrás da tela, 5 ao invés de 3, a reprodução do filme 70 mm sobrepuja tudo o que se havia ouvido antes nos cinemas.

O conceito de imersividade está presente no cinema até hoje

Quando o Dolby Atmos foi lançado, a propaganda falava em “Go inside the story” (Vá para dentro da estória), e por que? O formato se refere à associação do efeito tridimensional do som com a imagem, o primeiro reforçando o segundo, pelo aumento de ambiência, refletida no espalhamento de áudio pela sala.

A primeira tentativa de imergir, isto é, colocar a plateia dentro do filme, se deu com o Cinerama, com o aumento da largura e altura da tela, em curvatura de 146 graus, de modo a abranger o campo de visão de quem assistia o filme.

O que a introdução do som estereofônico fez foi aumentar a imersividade. Por coincidência, o aumento das dimensões da tela compeliu os técnicos a aumentarem também o número de canais atrás da tela e em torno da plateia. Isso já havia sido tentado por Walt Disney, na realização do Fantasound. E este tipo de layout retornou com a projeção em Cinerama.

Desde o início a ideia era basicamente fazer o som se mover na extensão da tela, daí o maior número de canais. Nos filmes em CinemaScope, o diálogo passou a ser reproduzido direcionalmente: se o ator fosse para os cantos, o som da sua voz o seguia. O processo foi, por isso, chamado de som direcional. Ele pode ser ouvido em muitas autorações de filmes em disco, até mesmo de filmes modernos.

O som estereofônico propiciou também a introdução de partituras orquestrais memoráveis, algumas das quais ficaram na cabeça da plateia, depois que o filme terminava.

A MGM chegou bem mais tarde no filme falado, mas inovou na gravação das trilhas com som estereofônico. E isso aconteceu bem antes das produções em CinemaScope, feitas posteriormente. Neste caso, apenas uma gafe foi cometida, com a introdução do som Perspecta, que era um falso estéreo. Em mídias atuais, o som original dessas gravações foi preservado, e assim hoje é fácil ouvir as magníficas orquestrações dos talentos da MGM.

Na passagem da trilha sonora para o vídeo não há, em princípio, qualquer empecilho na transcrição integral do som original, diferente das salas de cinema, que dependem de película e equipamento especializado. Na prática, significa obter o melhor som possível sob controle do usuário. Se este souber o que está fazendo, o som doméstico é potencialmente melhor do que o do cinema! [Webinsider]

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Filmes em 16mm e o movimento cineclubista

 

A fase widescreen com som estereofônico da M-G-M

Fantasound de Walt Disney e o estéreo no cinema

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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