Todo o resto é distração

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propaganda é uma ideia

Uma propaganda só precisa de ideia.

 

Parecia tudo natural: ir até uma locadora de carros, pegar um táxi na rua, pagar com dinheiro, ter uma discoteca, uma biblioteca, revelar fotos, ir a um hotel, comprar uma casa. Até que um dia, criaram-se jeitos diferentes. E, num estalo de dedos, tudo aquilo que era normal pareceu ultrapassado, velho, complexo, burocrático.

Não há debate sem polêmica: tudo ficou difuso na propaganda.

Era normal estudarmos o consumidor antes de um lançamento. Precisávamos saber com quem iríamos falar, o que essas pessoas pensavam, como agiam, o que as excitava e decepcionava. Tínhamos que imaginar quem eram esses seres que eventualmente iriam ver nossas mensagens e ter um desejo incontinente de comprar o que queríamos vender.

Até que um dia, nos demos conta de que esses seres padronizados eram fluidos, insustentáveis, incoerentes e que estavam distraídos, desfocados e vulneráveis a desejos irracionais e imprevisíveis. Como nós, pobres criaturas.

Também era normal perguntar para as pessoas o que elas pensavam e sentiam; era bom coletar informações, comportamentos, manifestações voluntárias ou não desses mesmos consumidores. Até que percebemos, um dia, que as pessoas mentiam, que não tinham livre arbítrio, que mudavam de opinião, sensação ou religião ao sabor das brisas do inconsciente.

Era também praxe confortável se reunir para brainstormar ou sprintar sobre algumas hipóteses e intuições, para parir ideias, conceitos, narrativas. Até que, aos poucos, nos vimos scrollando referências pela internet, referências essas que eram precisamente criadas e produzidas por esses mesmos consumidores que estávamos tentando entender.

Então percebemos que, de observadores, também nos tornávamos observados; de caçadores, também presas de um safari de mão dupla, bagunçado, desestruturado, incidental.

Finalmente, para arrematar o ofício, era de bom tom estudar onde e quando iríamos interromper, cativar, seduzir as caças. Quanto isso iria custar, com que nível de insistência e perseguição.

Até que sacamos que quem consome, cria, e quem cria, veicula. Vimos nascer milhões e bilhões de seres híbridos, ao mesmo tempo consumidores, criadores e mídia.

Foi então que percebemos que tudo aquilo que era normal pareceu ultrapassado, velho, complexo, burocrático.

Então, por que existe mídia, criação e planejamento? Por que diabos ainda existe briefing, estratégia, big idea, plano de mídia e mensuração? Por que raios não estaria na hora de largar essas velhas formas que, ao mesmo tempo que justificam as agências de comunicação, espelham as estruturas dos clientes?

Por que não podemos experimentar quebrar as paredes, as estruturas, os gessos, as hierarquias e, principalmente, acima de tudo, os processos, os cerimoniais, os salamaleques, os medos, os ass-shields?

Numa exposição de arte, ninguém precisa saber sobre o ateliê do pintor, nem que cara ele tem, nem se ele usou tinta acrílica ou óleo. Não precisa também saber quanto custa, quanto custaria ou quanto custará. Também são pouco relevantes a fase, a vida, a dificuldade, as inspirações. Para elevar, pouco importa a tagarelice, o schmooze, o bavardage. Para arrebatar, só basta a obra, única, nua, liberta dos ruídos e dos humores do mundo.

Uma propaganda só precisa de ideia. O resto é armadilha ou nariz de cera. [Webinsider]

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Fernand Alphen (@Alphen) é publicitário. Mantém o Fernand Alphen's Blog.

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