Equipes de comunicação de candidatos à eleição publicam conteúdo o tempo todo e quase nada chega às telas dos eleitores.
Você já percebeu que quase não tem aparecido conteúdo político no seu WhatsApp e nas suas redes sociais?
Fotografias, cards, vídeos, colagens e montagens das campanhas eleitorais, publicadas diariamente e várias vezes ao dia, não estão chegando a quase ninguém.
E mesmo que você siga o candidato e demonstre interesse, só uma pequena fração desse conteúdo inutilmente frenético vai chegar, de fato, na sua tela.
Esse comportamento binário teve uma fase embrionária nas eleições de 2020, depois um teste real em produção nas eleições de 2022, mas agora em 2024 chega ao auge. Se antes tínhamos pequenas bolhas, hoje são microbolhas que, eventualmente, se encontram (seletivamente direcionadas pelos tinhosos algoritmos) para promover tempestades de engajamento em retroalimentação.
Estamos a poucos dias da votação, mas tem gente me perguntando hoje quando é que começa o período eleitoral.
Tenha calma, não se apresse em suas velhas conclusões sobre as nossas velhas alienações. A ignorância política há muito deixou de ser uma particularidade do povo guerreiro de Pindorama. Ainda agora, encontro equipes de candidatos tentando descobrir como é que se faz um impulsionamento ou tráfego pago no Instagram. Em 2016, era a mesma coisa e me davam a desculpa que tudo era “novidade”.
Também agora, converso (a contragosto) com candidatos em dúvidas existenciais sobre fazer uma vaquinha virtual para arrecadar dinheiro para campanha. Dois assuntos defasados há, no mínimo, uma década. Estou sendo educado.
Enquanto isso, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) segue mudando as regras eleitorais no meio do jogo, sempre nas questões mais minúsculas possíveis: do tamanho do adesivo à centimetragem do banner no comitê. A cada dois anos é essa obsessão jurídica com o tamanho das coisas. Que coisa, viu.
Para fiscalizar as notas frias entregues na prestação de contas em toda eleição, ninguém quer. Para cruzar os dados da declaração de bens dos candidatos, tão pobres, ninguém quer também. Dois assuntos igualmente defasados. Para resolver, a gente precisaria de apenas dois remédios: o Excel e o semancol.
O primeiro existe desde 30 de setembro de 1985 e tem 39 anos de bons serviços prestados à nação. O segundo, bem, acho que ainda estamos aguardando o lançamento desse app revolucionário.
Alvíssaras, ao menos a Justiça Eleitoral deixou de balbuciar sobre Inteligência Artificial (IA), depois de um ano inteiro querendo reinventar a roda e estipular “regras claras” para o uso nas eleições. Agora, só quem ainda perde saliva com IA nas eleições é a imprensa, a ponto de repercutir – sabe-se lá de onde tiram isso – teorias tresloucadas de que ChatGPT e similares iriam promover uma “ruptura no jogo democrático”.
De que eleição esse povo está falando, ninguém sabe. Porque a de 2024 acabou antes mesmo de começar, ao menos para o brasileiro que trabalha e paga boleto. E a de 2026 está sendo definida agora no dia 6 de outubro e eu tenho fé em Jesus que, daqui a dois anos, em setembro de 2026, os grandes marqueteiros de campanha e produtores de conteúdo já tenham descoberto a existência da publicidade em redes sociais.
Se a gente quiser esticar a corda da fé, podemos esperar que entendam parcialmente como funciona um algoritmo. Antes tarde do que mais tarde. Oremos.
Pablo Marçal, o fenômeno eleitoral deste ano, não sabe o que é Inteligência Artificial e muito menos natural, simplesmente porque não precisa de nenhuma das duas. Veja só. Até pouco tempo atrás, ele comparava as igrejas com gangues de rua e facções criminosas. Logo quem? E assim, as pesquisas de opinião em São Paulo mostram que a segunda maior parcela de eleitores dessa criatura são os cristãos evangélicos. Essas ovelhas divinas enxergam esperança e futuro próspero em Pablo Marçal.
Em 2018, Jair Bolsonaro já tinha uma imensa ficha corrida – quase três décadas na Câmara dos Deputados – de verborragias impublicáveis sobre mulheres, negros e LGBT. A misoginia do dito cujo nunca precisou de investigações, reportagem no Fantástico ou operações com nomes estrangeiros da Polícia Federal. Sempre foi de conhecimento público, jogo aberto. No primeiro turno, 29% das mulheres votaram nele. No segundo turno, foi 44%, segundo Datafolha.
Na época, os espanhóis do El País devem ter achado inverossímil o apoio feminino ao candidato e, em setembro daquele ano, a poucos dias da votação, enviaram uma repórter para Salgueiro (PE), onde ela conversou com integrantes do PSL Mulher.
“Não acho que há rejeição maior entre as mulheres e nem acredito em pesquisa”, disse uma Oficial de Justiça, 36 anos, curso superior.
No público masculino de eleitores letrados, o pensamento é ainda mais ignóbil. Vai de revolução comunista, passa por conspiração cubana e chega à invasão alienígena.
E a resposta para tudo isso, na visão heteromacho diplomado, é sempre a mesma: mete bala neles.
Meu rei, agora me diga, pra quê a gente vai usar IA nas eleições? Qual é a ruptura que ainda falta fazer?
Mas se você quer saber de IA, vamos lá. Quem explicou didaticamente o uso eleitoral da IA foram os documentos da Meta (Facebook / Instagram / WhatsApp) publicados aos investidores logo no início deste ano:
“Vamos vincular as novas gerações de IA generativa para bloquear com ainda mais eficiência os assuntos que não interessam aos usuários”.
Você ganha um bilhete de voto impresso se matar a charada: quem precisa de Inteligência Artificial se a burrice natural já é tão eficiente? [Webinsider]
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Em 2016:
Paulo Rebêlo
Paulo Rebêlo é diretor da Paradox Zero e editor na Editora Paradoxum. Consultor em tecnologia, estratégias digitais, gestão e políticas públicas.
Uma resposta
Não me lembro de ter lido algo tão ruim. Não por acaso eu falo que o esquerdismo é uma desordem mental.