Bancas de jornais foram frequentadas durante décadas. A Internet derrubou a venda de jornais e revistas e as sobreviventes tiveram que vender biscoitos.
Um hábito quase secular, o de ir a uma banca de jornais comprar alguma coisa publicada de interesse, vem desaparecendo já há muito tempo. As bancas que ainda ficaram abertas, passaram a vender outros produtos, pois caso contrário provavelmente já teriam fechado.
A procura de jornais tornou as bancas um ponto importante de visita ou até de reunião com amigos. Na minha infância e adolescência era o meu pai quem trazia o jornal para casa, quando chegava de noite. Depois, eu frequentava a banca mais próxima, cujo dono conhecia toda a minha família. Quando ele morreu, a banca parou de vender jornais. Foi ali, naquela banca, que eu corria para comprar a última edição do semanário O Pasquim, assim que se sabia que o jornal iria ser recolhido pela polícia.
Muitas bancas ficaram mais conhecidas, devido aos tipos de publicação vendidas. Na Praça Saens Peña, localizada na Tijuca, local conhecido como “Cinelândia Tijucana”, havia a chamada “Banca do Mário”, nome do seu dono, que vendia revistas importadas, entre as quais as revistas de áudio que eu lia todo mês: Audio, High Fidelity e Stereo Review. Eu achei uma imagem recente do Google, que mostra onde a banca ainda fica:
Ao passar hoje por lá, nunca me ocorreu perguntar se o Mário ainda está vivo. Aliás, a Praça já não é mais a mesma há décadas! Na imagem, se pode ver a loja C&A, que foi construída depois que o Metro-Tijuca foi demolido. Pode-se também ver a porta de saída do Bruni-Tijuca, caminho entre o auditório do cinema e a Praça, mas só aberto quando o cinema ficava cheio. Nada deste cinema foi preservado.
Na década de 1980 eu e um amigo visitávamos uma banca da zona sul, acho que era em Ipanema ou Leblon, que ficava aberta 24 horas e estava sempre cheia, porque vendia revistas estrangeiras também.
Uma banca do Leblon, que ficou badalada no histórico da Bossa Nova, chamada de “Banca Piauí”, era frequentada por Tom Jobim e parece que ainda está por lá:
A necessidade de sobrevivência fez todas essas bancas que teimaram em ficar abertas, partir para o comércio de diversos tipos de produto, entre eles os comestíveis, que atraem para compra um maior número de pessoas.
A quase falência do jornal impresso
Jornais tradicionais ainda vendem nas bancas, mas parece não despertarem o mesmo interesse de antes, e a culpa óbvia disso chama-se Internet! E quanto mais redes sociais aparecem, mais irrelevante se torna ir às bancas comprar qualquer jornal. As empresas jornalísticas sabem disso, e se voltaram todas para as edições on-line.
Uma ironia, neste particular, é a do desaparecimento nas bancas do Jornal do Brasil, antiga bíblia dos estudantes universitários da minha época. O jornal teve importância histórica, ao inovar com a primeira participação na rede, pela World Wide Web, site que existe até hoje.
O antigo prédio do jornal é hoje sede do Into, Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia:
Foi neste prédio que eu ouvi, pela primeira vez, um Compact Disc, em 1983. A JB importou um Sony CDP-101, para depois usá-lo no seu programa de clássicos da JB-FM. Na época, eu conhecia um técnico da emissora, que me chamou lá para dar uma olhada, e ouvir. Ele instalou o aparelho no estúdio, eu e um colega professor que era audiófilo, que foi comigo, ficamos impressionados. Ele, quando saiu de lá, me disse que esta iria ser a sua última coleção de discos!
Neste mesmo prédio funcionava a Rádio Cidade – FM, que eu também visitei. O pessoal técnico da JB usava fita cassete de cromo, gravada em 3 ¾”, para tocar música na emissora, com resultados surpreendentes. O formato não era padrão, mas foi fabricado na Europa e no Japão assim mesmo. A CCE produzia uma réplica do Dual, que tinha esta capacidade, mas que a montadora havia retirado o circuito que deixava rodar a fita mais rápido. O pessoal da JB reconstruiu a placa lá mesmo, e aproveitou os decks, com fitas de cromo, encomendas à BASF, no tamanho certo requerido para uma só música. Quando a fita parava de tocar, o aparelho a rebobinava automaticamente. Com esta mudança, eles pararam de usar aquelas cartucheiras de fita, que também voltavam em loop a gravação para o início.
Como se vê, aquele prédio tem história. A JB-FM faz parte de uma época diferente do rádio. No programa de clássicos, primeiro se usou Laserdisc e depois CD. A compressão na transmissão era obrigatória pelo famigerado Dentel, e isso prejudicava a qualidade do áudio pretendida pela emissora.
A ausência do papel na divulgação das notícias
A ideia antiga de não se usar mais papel impresso, formulada na informática, proposta devido ao armazenamento de dados em dispositivos de memória, foi rotulada de “paperless office”, já nem me lembro mais quando foi isso. A eliminação de papel em comunicações de todo tipo, até onde eu sei, nunca foi plenamente realizada, porque, em muitas circunstâncias, a cópia do trabalho em papel ainda é muito útil!
Mas, com a propagação de imagens e texto, inauguradas em público na criação da World Wide Web, as notícias passaram a veicular em alta velocidade, como seria de se esperar. Situação parecida ocorreu quando os cinemas pararam de projetar os jornais da tela, que mostravam somente notícias já amplamente defasadas.
Na Internet, imagem e texto nos monitores iriam liquidar os jornais da tela, como liquidaram os jornais impressos, por causa exatamente da velocidade na divulgação das notícias e dos comentários do público leitor, expostos nas redes onde o público pode se manifestar aberta e rapidamente.
Esta situação se ampliou drasticamente com a modernidade da tecnologia dos celulares. A partir daí, qualquer um pode gravar um vídeo e se tornar repórter in loco, coisa que nem sempre é possível para os repórteres das emissoras de TV. Eu acho este hábito compulsivo nefasto para os profissionais do ramo, mas, não havendo outro jeito, as emissoras de TV aproveitam o material gravado assim mesmo.
Sinal dos tempos, até que algum fato novo mude tudo isso, mas, pelo andar da carruagem, ainda vai levar muito tempo! [Webinsider]
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O fenômeno do desaparecimento das lojas de discos e gravadoras
Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.
2 respostas
Visitei Buenos Aires e fiquei encantado ao ver como lá tem muitas bancas de jornal. As pessoas seguem lendo jornais e revistas por lá.
Bom dia, Paulo. Aqui na praça de 93 mil hab, só sobrou uma banca que se localiza no coração da cidade, no Largo de S.João. Creio que sobrevive a duras penas.