Tudo bem… Quem me conhece sabe que prefiro bater cabeça e ouvir uns atabaques a freqüentar igrejas – à exceção de uma delas. Mas nada realmente contra isso. É tão–somente preferência e, como se sabe, religião não se discute (muito menos se esconde). No entanto, não resisti à curiosidade e resolvi conhecer a primeira igreja feita para a internet, totalmente em 3D e com um visual de games para computadores. O santo local digital se chama, sugestivamente, Church of Fools e é uma iniciativa da The Methodist Church of Great Britain. Será que há realmente salvação para nossas almas no local?
De acordo com a descrição no site, esse lugar online é em parte dedicado às pessoas à beira da fé, possivelmente sem esperanças e sem acreditar em coisa alguma mesmo. Mas pelo jeito, essa boa intenção da igreja virtual vai precisar de muita oração para conseguir se firmar como hábito e sensibilizar os visitantes para um momento verdadeiramente sagrado diante do computador, pois da forma como tudo é (muito bem) feito no site, a impressão que se tem é que se trata de mais uma besteira sem valor qualquer, uma jogada de marketing para chamar a atenção. (E olha que o próprio site promete criar soluções para acabar com “freqüentadores” mal–intencionados do ambiente). O fato é que me empolguei tanto com o passeio pela igreja online que nem me dei conta de que precisava rezar. Parece mesmo um jogo ao vivo e em terceira dimensão, embora se diga que não é adequado para crianças! Só que o espírito, dali, passou longe, bem longe…
Antes de carregar a página, feita em Shockwave, somos convidados a ler as regras da casa, que são seis e incluem tratar os demais com respeito, não ficar perambulando à toa pelo altar nem subir no púlpito e jamais discutir a respeito das diferentes crenças religiosas no local. Ademais, os que desrespeitam as regras podem ser expulsos do ambiente virtual.
Então, consegui entrar na tal “igreja dos tolos”. O detalhe é que eu não pude ser alguém, já que, caso não seja possível entrar com um nickname, estando cheia a igreja, só se consegue passear pelos ambientes sagrados como um anônimo qualquer, com um simples personagem transparente, tal como uma alma, sem nome específico. Fui em frente assim mesmo, sabendo que a interação com os outros usuários online se perde dessa maneira (como se você estivesse invisível no salão). Outro detalhe que chama a atenção é que podemos fazer doações com cartão de crédito (no mínimo, 3 libras) que, segundo um aviso no próprio ambiente virtual, poderá ajudá–los a fornecer os serviços (religiosos?) e consertar o teto de pixels velho e inacabado da igrejinha!
Como a igreja estava apenas aberta à visitação, informando quando seria a próxima missa e quem seria o próximo padre, comecei, pois, a caminhar pelo templo. Tal como uma igreja de verdade, é possível fazer uma visita como se faz no mundo real, para orar e pedir as graças em silêncio, quando não há culto. Com meu boneco invisível, fui saber do que era capaz e até que achei bem interessante, ainda que um pouco cômico: virar para a direita e para a esquerda, fazer alguns gestos, como o sinal da cruz; pedir a bênção (com a mão direita levemente suspensa) e aleluia (com os dois braços ao alto!). Pode–se também pôr o boneco pra sentar e se ajoelhar, deixando–o pronto a orar e praticar a fé digital.
No interior da igreja, que tem dois ambientes (sanctuary e crypt), dá para fazer praticamente o mesmo que se faz em qualquer lugar público aberto à visitação, dando ao site um tom ao mesmo tempo real e ficcional. Clicando em “view details” em algumas figuras no cenário principal (o “sanctuary”), é possível visualizar em outra janela as imagens sagradas que, ao que parecem, são reproduções de imagens reais, cujos autores não são divulgados, como “Jesus meets his mother”, “Blue Christ” (essa, uma bela escultura no que parece ser um tipo de pedra azul, com uma coroa de espinhos real) e “Jesus falls under the cross”, entre algumas outras. Servem para rezar e meditar, mirando–as, de acordo com as regras exibidas. Confesso que, na frente de um computador, é difícil fazê–lo. Quase absurdo, para ser sincero, na minha opinião.
Só que isso não chega a incomodar. Caminhei com meu personagem um pouco mais e descobri que quem quiser interagir com outros religiosos deve se dirigir ao local que fica abaixo do santuário, chamado “crypt”. Lá, a comunicação com os amigos de fé virtuais acontece (em várias línguas, mas o inglês é maioria) num tipo de “chat live–action”, com personagens coloridos e descontraídos em um local que dificilmente existiria em uma igreja, tal como um lounge room, com poltronas vermelhas e máquinas dessas que existem em shoppings, para vender refrigerante, castanhas e… camisas! E, claro, tem lá a água–benta, que também é oferecida em uma dessas máquinas. Era só o que estava faltando. Depois dessa, compreendi o nome do lugar. Sem mais comentários, pois.
E assim foi. Resolvi me desconectar, me benzendo. Como me senti? Um completo fool, um bobo que perde seu tempo conhecendo algo tão banal e que é apenas bonitinho, moderninho e um primor de animação em 3D. Nada mais. Ao menos serviu para mostrar que minha fé segue firme, mas nunca num site assim e muito menos de um jeito tão superficial e picaresco! Infelizmente acho que nada (nem ninguém) se salva na Church of Fools, metaforicamente falando. Acima de tudo, salve Oxalá! E parafraseando O Rappa, se eu me salvei, foi pela fé – em tempo algum pela web. [Webinsider]
.
Alexandre Bobeda
Alexandre Bobeda (@dezbloqueio) é redator, professor, designer instrucional, autor publicado. Criou o dezbloqueio conteúdo & ideias.