VoIP, regulação e operadoras de telefonia

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A comunicação na internet se estabelece a partir de um protocolo. O termo deriva do grego protocollon (uma folha de papel colada a um manuscrito que descrevia seu conteúdo) e em tecnologia da informação descreve um conjunto de regras que permite o intercâmbio de informações entre pontos conectados de redes de comunicações.

Os protocolos recebem padronização internacional de acordo com o seu uso industrial. O conjunto de padrões que permite a entrega de dados entre dois sistemas conectados à internet recebe o nome de Internet Protocol – IP, que juntamente com outro protocolo, o Transmission Control Protocol – TCP/IP, possibilita a “conversa” entre estes mesmos sistemas.

Em razão do fato da internet e suas tecnologias sofrerem indiscutível avanço e evolução nos últimos anos, presenciamos a formulação de inúmeros usos e possibilidades de usos destes recursos. Uma das possibilidades mais evidentes abrange as comunicações, fator crucial e estratégico para o desenvolvimento econômico e humano de qualquer nação.

Neste particular, a convergência de tecnologias de comunicações e internet deu–se de maneira inequívoca e inevitável. Temos hoje atenção voltada à chamada Telefonia IP, que se traduz na utilização da internet, por meio de seus protocolos de comunicação, para estabelecimento de chamadas telefônicas.

O assunto é de novidade absoluta, o potencial é imenso e ainda desconhecido. Conectar escritórios remotos da mesma corporação ao redor do planeta, reduzir significativamente o custo com telefonia, efetuar chamadas de longa distância a custo local, integrar dispositivos móveis com telefonia fixa são apenas algumas das vantagens viabilizadas pela Telefonia IP.

Algumas discussões já tiveram lugar na International Telecommunications Union, sediada em Genebra, com ausência, entretanto, de consenso regulatório sobre a matéria.

A Federal Communications Commission – FCC determinou, no início de novembro de 2004, que os Estados norte–americanos estão proibidos de impor normas regulatórias sobre serviços de VoIP, sendo competência exclusiva do órgão legislar sobre o tema.

Tal decisão fez o Estado da Califórnia ingressar com apelação da decisão em uma corte Federal, em dezembro passado, passo que foi seguido pela Minnesota Public Utilities Commission, órgão estadual responsável pela regulação de serviços públicos deste Estado, que foi o pioneiro em movimentações sobre regulação das tecnologias de telefonia IP nos Estados Unidos.

Na mesma sorte, a Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel ainda não se pronunciou especificamente a respeito da oferta de serviços similares no Brasil. Como vimos repetidamente em questões envolvendo uso da internet, a adoção dos serviços antecedeu sua estruturação administrativa e regulatória em muitas jurisdições.

Trata–se de prestação de serviço conhecido como VoIP, acrônimo de Voice over Internet Protocol, que significa literalmente a entrega de voz sobre o Protocolo Internet, originalmente formatado para entrega de dados.

Este termo é utilizado para definir o conjunto de configurações que permitem o gerenciamento da entrega de comunicação de voz com uso do Protocolo Internet. Tecnicamente, VoIP vem a ser a entrega da voz digitalmente em pequenos pacotes de comunicação ao invés dos tradicionais protocolos de circuitos comutados presentes em sistemas de Public Switched Telephone Network – PSTN, redes públicas das operadoras de telefonia outorgadas por órgão competente.

Temos, portanto, três cenários possíveis para a utilização de serviços VoIP:

1. VoIP puro: a comunicação se estabelece entre dois sistemas informáticos conectados à internet, sem intermédio do PSTN;

2. POTS: a comunicação se estabelece entre um sistema PSTN e outro sistema de VoIP;

3. VoIP para POTS: o VoIP é utilizado para transportar “segmentos” da chamada telefônica com uso de PSTN, porém este não finaliza a ligação (interconexão).

Neste panorama, concluímos que esta convergência entre comunicação e computadores influencia sistemas regulatórios de maneira única, pois há diferenças intrínsecas no conjunto de regras de telecomunicações e sistemas de informação. Muitas dúvidas e controversas têm surgido a partir deste panorama vislumbrado com o surgimento de prestadores de VoIP.

Nos Estados Unidos, a questão fundamental que se coloca perante a FCC é a chamada Intercarrier Compensation, vale dizer, a obrigatoriedade de pagamento de taxas por parte das empresas de telefonia IP em favor das operadoras de telefonia licenciadas de PSTN.

Já no Brasil, não chegamos ainda especificamente a um estágio de discussão sobre VoIP, porém temos como herança uma intensa ingerência estatal (agora regulatória) em matéria de telecomunicações, o que nos leva a pensar que em breve teremos movimentos neste sentido.

Seria o VoIP passível de taxação equiparada perante operadoras de telefonia fixa?

Diante do quadro de controvérsia que se instala com o incremento do VoIP no Brasil, é necessário o exame sobre a Lei Geral de Telecomunicações – LGT, no que tange a definição do escopo de serviços de telecomunicações:

“Art. 60. Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação.

§ 1° Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza”.

Assim, a transmissão, emissão e recepção de sinais e sons de qualquer natureza implica em serviço de telecomunicações.

Interessante também verificar o que diz a legislação norte–americana pertinente à matéria:

Telecommunications

§ The transmission, between or among points specified by the user, of information of the user´s choosing, without change in the form or content of the information as sent and received.

“Telecommunications Service”

(Basic)

§ The offering of telecommunications for a fee directly to the public, or to such classes of users as to be effectively available to the public, regardless of facilities used.

Voltando ao nosso ordenamento jurídico, temos no art. 61 da LGT:

“Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações.

§ 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando–se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição”.

E informação similar no 1996 Act Definitions dos Estados Unidos:

“Information Service”

(“Enhanced”)

§ The offering of a capability for generating, acquiring, storing, transforming, processing, retrieving, utilizing, or making available information via telecommunications.

Analisando paralelamente os dispositivos legais supra citados, verificamos a diferença conferida pelo legislador ao serviço de telecomunicações perante serviço de informação, o que dirime dúvidas sobre a zona cinza na qual se encontra os serviços de VoIP.

Em se tratando de telecomunicações, tanto a lei brasileira como a norte–americana definem a transmissão de informação como seu fim precípuo caracterizador, o que não ocorre com serviços de informação, onde atividades como armazenamento, acesso, apresentação, movimentação e utilização de dados informáticos são intrínsecas da natureza destes serviços, o que não pode ser confundido com telecomunicações tão somente.

Estes serviços acrescentam utilidades à cadeia de comunicação, perfazendo com que dois sistemas remotos possam conectar–se, sem utilização das redes de telefonia públicas.

Com foco nos mandamentos legais brasileiros, o VoIP não pode ser enquadrado como serviço de telecomunicações, e sim como serviço de valor adicionado quando presente em parte de rede pública de telecomunicações.

Sendo um serviço de informação, já que se utiliza de protocolos de internet, o VoIP possui, em primeiro momento, natureza jurídica de serviço de valor adicionado, pois “acrescenta utilidades” à comunicação. Corroborando este entendimento, temos as palavras de Renato Navarro Guerreiro, ex–presidente da Anatel, por ocasião do Terceiro Fórum Político Mundial de Telecomunicações:

“Por fim, concluo reafirmando que não se deve confundir os SERVIÇOS INTERNET, enquanto serviços de INFORMAÇÃO e, portanto, de VALOR ADICIONADO, com o SERVIÇO MULTIMÍDIA, que é um serviço de TELECOMUNICAÇÕES e que precisa na medida certa, sem exageros ou omissões, ter sua REGULAÇÃO formulada pelas Administrações dos países.”

Ainda podemos evidenciar o fato da atividade econômica no Brasil possuir diretrizes baseadas nos princípios da livre concorrência, livre iniciativa e repressão ao abuso de poder econômico, o que obsta qualquer iniciativa de limitação de atividades que possam trazer benefícios e redução de custos ao usuário final. Onerando–se os serviços VoIP em face de operadoras de telefonia abre–se caminho para a caracterização de atividades monopolistas, o que ultrapassa o espectro da regulação das telecomunicações e insere a matéria em campo contrastante com os ditames constitucionais. Renato Navarro Guerreiro, na mesma ocasião, prenota:

“Primeiramente a questão do modelo de prestação de serviços de telecomunicações nos diversos mercados. Falo, principalmente, das diversas situações que vão do MONOPÓLIO até a AMPLA COMPETIÇÃO. É evidente que o uso do Protocolo Internet, nos hoje denominados Serviços Internet, constitui uma nova ameaça aos mercados monopolistas e atenua–se à medida que esses se tornam mais competitivos. Portanto uma consequência dessa nova tecnologia é eliminar, de vez, a crença, o pré–conceito ou ideologia do MONOPÓLIO NATURAL para os serviços de telecomunicações”.

É claro que estamos aqui discorrendo sobre VoIP em estado puro, vale dizer, o estabelecimento de conexão entre dois computadores conectados à internet, com ausência de uma PSTN neste processo. Os modelos POTS e VoIP para POTS podem, em determinadas condições, serem passíveis de taxação pelas operadoras, de acordo com a configuração do Intercarrier e as condições de contratação de suas redes PSTN. Porém, o prestador de serviços VoIP nestes casos recebe o tratamento de usuário de serviços de telecomunicações.

Resta esclarecido, portanto, que serviços VoIP têm sua natureza direcionada pelo teor do art. 61 da LGT. Ressaltamos ainda o parágrafo primeiro do referido artigo, que indica categoricamente não se confundir com serviços de telecomunicações aqueles enquadrados como serviços de valor adicionado.

Necessário se faz, entretanto, o afastamento do excesso de vontade das operadoras de telefonia pública bem como dos governos inclinados a regular a matéria em limites estreitos, o que pode acarretar restrição de uso em serviço com imenso potencial de beneficiar sociedades.

Neste esteio, embasados na lei vigente e em princípios que informam atividades mercantis, afirmamos que não há que se falar em obrigatoriedade de cumprimento de taxas às operadoras outorgadas para explorar redes de telefonia fixa em território brasileiro por parte de prestadores de serviços VoIP.

Ponto pacífico, o VoIP é realidade e a cada dia ganha mais terreno no ambiente corporativo. Outras questões controversas surgirão e deverão ser analisadas e dirimidas com uso de bom senso regulatório pautado pelo fim último de atender a uma das principais necessidades humanas: comunicação.

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Avatar de Rodney de Castro Peixoto

Rodney de Castro Peixoto (rodneycp@gmail.com) é autor do livro “O Comercio Eletrônico e os Contratos”, advogado especialista em tecnologia da informação, professor, consultor jurídico de startups e empresas de tecnologia. Mais no blog Lawmate.

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Uma resposta

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