E essa malha de relacionamento poderia ser aproveitada para ações comerciais de varejistas, empresas ponto–com e construtoras. Recebi mensagens de leitores da Webinsider com informações que complementam e aprofundam as sugestões apresentadas, e fiquei sabendo que já existem empresas desenvolvendo projetos nesse campo.
O que já existe
Gustavo Erlichman, sócio da Pletz Consultoria Web, desenvolveu em 2002–2003 um business plan para a construção de um site voltado para condominios e administradoras. Mas depois de pesquisar a viabilidade do negócio, ele decidiu não levar a idéia adiante.
Para os responsáveis pelas imobiliárias, administradora e condôminos com quem ele conversou, poucos moradores utilizariam a ferramenta para debater ou resolver assuntos condominiais, apesar de a maioria possuir conexão à internet em suas residências. O uso, segundo eles, ficaria restrita ao envio de reclamações, à solicitação de segunda via de boleto e, no máximo, para a reserva de salão de festas.
Essa mensagem me fez pensar em três questões:
1. Uma empresa não se interessa em abrir voluntariamente o canal de comunicação entre seus clientes. Essa questão é abordada no artigo sobre comunidades comerciais, de Derek Powazek (Comunidades comerciais, o pulso do consumidor, ao lado), e pode ser vista como problema ou como oportunidade. Agora que as ferramentas existem, os clientes vão falar sobre os produtos ou serviços que consomem; a decisão é da empresa, se ela quer participar desse diálogo ou não.
2. A ferramenta, segundo a pesquisa feita pelo Gustavo, serviria apenas para resolver questões pontuais. Isso me lembrou do caso de uma corporação brasileira que, para estimular a colaboração entre os seus executivos, instalou um sistema de fóruns de mensagem. Mas ninguém quis participar. Além das questões técnicas, relativas ao desenvolvimento do software apropriado para a finalidade do projeto, a colaboração depende de fatores como o levantamento dos problemas comuns dentro da comunidade e a mediação dos relacionamentos. O programador americano chromatic escreveu um texto curto e objetivo a esse respeito, publicado em português em duas partes (Construindo comunidades virtuais (parte 1) e Construindo comunidades virtuais: conduta, veja ao lado).
3. A viabilização desta idéia parece estar partindo de empresas que montaram sites para oferecer à comunidade de síndicos e administradores um ambiente para a a publicação de notícias selecionadas, troca de informação, e reunindo prestadores de serviços e fornecedores. Recebi os endereços de três em atividade: Icondo, Síndico Net e
Portal de Condomínio. Os três agora se movimentam para estender o uso da ferramenta para condôminos.
O que pode ser melhorado
O Luli Radfaher, Ph.D em comunicação digital e professor da USP, sugeriu que para a idéia de conectar os moradores de um condomínio ficar exequível, a empresa deveria usar ferramentas existentes (como blogs) para minimizar custos de produção e facilitar a operação. Para a proposta não morrer, ele propôs a formação de uma assembléia de representantes adolescentes do condomínio, que seriam eleitos todo ano e remunerados com uma fatia do orçamento do prédio. Considerando que para essa faixa R$ 200 é dinheiro e se você usar blogs a ferramenta é de graça, o investimento praticamente sairia a custo zero.
São duas propostas: a utilização de blogs e a incorporação dos adolescentes no trabalho de manutenção da comunidade. Em relação à ferramenta, o blog funciona porque permite a distribuição de direitos de publicação entre os moradores para manter o ambiente protegido de ruído externo. Eu costumo usar em meus projetos uma variante dessa solução, que é um software que funciona como os diários online, mas permite a priorização de informações na capa; o custo da instalação do programa no servidor é de aproximadamente R$ 2 mil.
A incorporação dos teens traz duas vantagens: coloca no volante da operação pessoas acostumadas a usar plataformas de relacionamento e que também podem se tornar catequizadores do projeto, ensinando aos pais as vantagens da aplicação da ferramenta.
O pagamento será uma forma de exigir a produtividade desses editores, mas tendo em vista que a maior parte do conteúdo das discussões não interessa a eles, vale a pena contratar também um editor profissional. Esse empregado pode ser aproveitado para acompanhar a hierarquização de conteúdo em diversos condomínios ao mesmo tempo.
Além de conferir se as tarefas estão em dia, resolver problemas e solucionar dúvidas dos líderes, ele faria correções para tornar os textos mais claros e aplicaria critérios jornalísticos para destacar os temas principais para a comunidade.
O que ainda falta fazer
O Luli também cobrou uma conclusão que indicaria o caminho a se tomar a partir daqui. O primeiro ponto é definir o plano de negócios para saber de onde virá o sustento para a comunidade. Uma solução é que as construtoras comprem o serviço para que ele seja um benefício extra oferecido aos moradores. Também é viável pensar numa empresa que desenvolva uma solução inteligente de ferramenta, levando em consideração as limitações do público e suas necessidades cotidianas, para vender o software pronto para as administradoras de condomínios.
Outra alternativa é desenvolver esta solução de modo a que ela possa ser incorporada aos serviços ofertados pelos grandes portais, como se oferece hoje blogs gratuitos e listas de discussão. Além de render tráfego e conteúdo, a solução poderia atrair anunciantes e parceiros do varejo, como cadeias de entrega de comida, filmes e serviços básicos como táxi, chaveiro e encanador. [Webinsider]
Juliano Spyer
Juliano Spyer (www.julianospyer.com.br) é mestre pelo programa de antropologia digital da University College London e atua como consultor, pesquisador e palestrante. É autor de Conectado (Zahar, 2007), primeiro livro brasileiro sobre mídia social.