Editores e diretores de jornais e revistas agora só querem saber desse tal de paywall.
Parecem esquecer que foram eles mesmos que cancelaram, uma a uma, todas as tentativas e experimentações de usar um sistema adaptado de cobrança por conteúdo no Brasil. Escolheram o caminho mais fácil — e menos inteligente — de fechar tudo para assinantes.
Em geral, foram decisões cuja fundamentação podemos resumir em apenas duas razões: pressão do departamento comercial e total falta de qualificação e conhecimento em termos de internet.
Agora, com as incessantes e insistentes autopromoções de jornais como o The New York Times e The Washington Post, que evidentemente têm total interesse de que a ideia pegue e vire moda, muita gente acha que o paywall é a solução do velho dilema de cobrar ou não cobrar por conteúdo na internet.
Limitações
Promovido sobretudo por jornais americanos e ingleses, o paywall é um método para cobrar pelo conteúdo do jornal impresso oferecido na internet. O recurso permite a leitura de uma quantidade limitada de matérias por dia. Ultrapassado o limite, o usuário é convidado a fazer uma assinatura digital ou híbrida, que pode incluir até mesmo o recebimento do jornal impresso aos domingos ou em dias alternados.
Cabe ao jornal decidir como proceder com o recurso. O paywall trabalha com a noção de permissões por página. Pode ser personalizado a gosto do freguês, abrindo um leque de oportunidades para promoções e direcionamento de conteúdo e reportagens – do ponto de vista comercial ou de interesse público.
Por ser tecnicamente muito simples, é facilmente implementado nos sites e também pode ser facilmente burlado se você tiver paciência de tentar enganar o sistema usando IPs falsos ou até mesmo utilitários (apps) para navegadores como Chrome e Firefox. É uma preocupação, contudo, sem muita relevância no momento.
Como usar e oferecer o paywall é justamente o que diferencia os jornais que o adotam. Não faz milagres em termos de receita, mas tem mostrado resultados interessantes. Além de ser uma alternativa viável aos veículos de comunicação que ainda insistem no clichê meio burrinho de fechar totalmente o conteúdo do jornal impresso.
Vale lembrar que foi ainda em 1997 que o Wall Street Journal testou, pela primeira vez, um sistema de paywall. Adotado até hoje. Só não havia o nome pomposo de agora.
Contra as ideias defuntas
Durante um bom tempo no Brasil, os jornais O Globo e Estadão foram os dois veículos de circulação nacional com o melhor sistema de paywall adaptado à realidade brasileira.
Hoje, infelizmente, seguem o mesmo modelo de empurrar goela abaixo uma assinatura obrigatória para ler um jornal em versão “digital” que tenta simular o papel na tela do computador e faz da leitura uma tarefa hercúlea, lenta e cansativa.
Mas tem coisa bem pior.
Há jornais regionais que cobram pela assinatura digital o mesmo valor ou até mais caro do que uma assinatura do UOL, que lhe permite ler a Folha de S.Paulo todos os dias e uma série de reportagens traduzidas de dezenas de revistas e jornais estrangeiros da mais alta qualidade. O que será que vale mais?
A Folha e as revistas estrangeiras não vão cobrir, evidentemente, o que está ocorrendo na sua cidade e nem a política local. Mas os fatos e acontecimentos diários, isso você encontra na internet… de graça. Nas dezenas de sites de notícias em tempo real.
Resta ao jornal impresso o que há de melhor nesse produto: análises e grandes reportagens. Justamente o que os jornais brasileiros menos aproveitam na internet, com as raras exceções de reportagens feitas sob encomenda para ganhar prêmio.
Só os iluminados parecem saber explicar como uma empresa investe tanto dinheiro em reportagem (e todos os fatores e variáveis de custo envolvidos) para que quase ninguém leia o resultado de tanto esforço.
E o anunciante ainda compra (literalmente) essa ideia defunta achando que vale a pena.
Sem rumo
O paywall adotado pelo New York Times, talvez o mais badalado e popular atualmente, difere muito pouco do sistema adotado pelo Estadão anos atrás.
Ao navegar pelo índice do Estadão, várias matérias podiam ser lidas gratuitamente. Os textos sem link eram exclusivos para assinantes. Funcionava muito bem, embora o Estadão fosse muito conservador na escolha das reportagens liberadas. As melhores e mais importantes costumavam ser exclusivas para assinantes.
O Globo, por sua vez, tinha um modelo mais interessante. Ao fazer um cadastro simples com e-mail e senha, você podia ler gratuitamente a edição do dia. Para ter acesso às edições anteriores ou fazer pesquisas, só com assinatura.
Hoje, quase todos os jornais e revistas de grande circulação seguem o mesmo modelo de fechar todo o conteúdo do impresso. Como resposta às críticas sobre a cobrança, também adotam um discurso homogêneo: dizem que boa parte das matérias podem ser lidas no site do jornal, na seção de notícias de cada editoria.
O problema é que a usabilidade dos sites de jornais costuma ser tão ruim que, em geral, você nunca sabe quando está lendo uma matéria que saiu no jornal impresso do dia ou apenas no online. É um verdadeiro samba.
Com as últimas “inovações” em curso nos sites de jornais brasileiros, chegamos a uma situação no mínimo curiosa: você roda, roda e roda, mas não consegue encontrar onde está o jornal impresso. Mesmo quando é assinante. [Webinsider]
* Nota do editor: uma versão alternativa desta coluna foi publicada originalmente na edição 686 do Observatório da Imprensa.
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Paulo Rebêlo
Paulo Rebêlo é diretor da Paradox Zero e editor na Editora Paradoxum. Consultor em tecnologia, estratégias digitais, gestão e políticas públicas.
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